Sábado de manhã, lua minguante passando para nova e, em dia especial, a coluna “História & Outros Assuntos”, do publicitário e historiador Fabrício Gomes.

O texto de hoje é sobre estórias fantásticas e sobrenaturais envolvendo o Arco do Telles, no Centro do Rio. E como o polvo Paul é o sobrenatural em destaque da semana, ele está aqui nos fazendo companhia. Boa leitura.

“ESTÓRIAS DO ARCO DA VELHA…

Uns vão fazer um Happy Hour após o trabalho. Outros vão tomar chopp/cerveja nos “botecos” espalhados por ali. E há também quem vá nas boates ali existentes. Mas talvez poucos conheçam a história do lugar… Hoje em dia abriga bares, ateliês e galerias de arte. Exclusivo para pedestres, manteve o charme e a delicadeza de outros tempos.

Com a construção da Casa do Governo pelo governador Gomes Freire no Largo do Paço (atual Praça VX), as redondezas se valorizaram e passaram a ser freqüentadas pela sociedade. Vendo isso, o português Antônio Telles Barreto de Menezes (juiz e proprietário de terras em Jacarepaguá e Baixada Fluminense) mandou construir uma carreira de casas de aluguel naquele logradouro, em 1743.

Quando a obra chegou à travessa do Mercado do Peixe, o engenheiro Alpoim (responsável pelo projeto) teve que traçar um amplo arco sobre ela, para que a via dos mercadores não ficasse obstruída pela nova construção. Vem daí o apelido de “Arco do Telles”. Antigo endereço residencial da cantora Carmem Miranda e atualmente reduto da boemia carioca que trabalha no centro da cidade.

Os prédios foram todos alugados, ficando os térreos principalmente para os lojistas de secos e molhados; a casa maior, justamente a que ostentava o arco, foi ocupada pelo Senado da Câmara (equivalente hoje à Câmara dos Vereadores).

Mas o famoso Arco é capaz de abrir estórias tenebrosas e do “ARCO DA VELHA”…

O que pouca gente sabe (e quem sabe não comenta) é que o beco debaixo do arco esconde muitos dramas e alguns mistérios. Há quem o considere um lugar maldito e garanta que é mal assombrado. Dentre os diversos episódios estranhos que envolvem o lugar, existe um dos mais terríveis: a história de uma das primeiras feiticeiras do Rio de Janeiro, certamente a mais cruel. Todos os fatos aqui citados ocorreram e estão registrados em documentos antigos da polícia carioca.

Com a construção da Casa do Governo pelo governador Gomes Freire no Largo do Paço (atual Praça XV), as redondezas se valorizaram e passaram a ser freqüentadas pela alta sociedade. Vendo isso, o português Antônio Telles Barreto de Menezes (juiz e proprietário de terras em Jacarepaguá e Baixada Fluminense) mandou construir uma carreira de casas de aluguel naquele logradouro, em 1743.

Quando a obra chegou à travessa do Mercado do Peixe, o engenheiro Alpoim (responsável pelo projeto) teve que traçar um amplo arco sobre ela, para que a via dos mercadores não ficasse obstruída pela nova construção. Vem daí o apelido de “Arco do Telles”. Os prédios foram todos alugados, ficando os térreos principalmente para os lojistas de secos e molhados; a casa maior, justamente a que ostentava o arco, foi ocupada pelo Senado da Câmara (equivalente hoje à Câmara dos Vereadores).

A má sina daquele local iria se revelar nessa época, mais exatamente em 20 de julho de 1790, na loja térrea próxima à rua Direita, onde existia uma loja de objetos usados denominada curiosamente de “O Caga Negócios”. Um violento incêndio criminoso destruiu o prédio e deixou dezenas de feridos e dois mortos. O fogo atingiu o andar superior e consumiu o arquivo do Senado da Câmara, perdendo-se assim toda a documentação referente aos primórdios da cidade, inclusive os recibos e cobranças de foros (espécie de IPTU) e os registros gerais de imóveis.

A partir desta tragédia, aquela área perdeu o viço e caiu em decadência, transformando-se em abrigo da malandragem e ponto de baixo meretrício. Apesar de haver ali um oratório de Nossa Senhora dos Prazeres, a baixaria era tão grande que moradores das proximidades removeram a santa para a Igreja de Santo Antônio dos Pobres, onde permanece ate hoje.

Foi nesse ambiente nefasto, em meio à escória da cidade, que Bárbara dos Prazeres certa noite apareceu, rompendo a penumbra do beco do Arco dos Telles. Começava ali uma história de pavor.
Após o incêndio do casario da Travessa do Mercado, em 1790, o lugar decaiu e tornou-se reduto de marginais e antro de prostituição do mais baixo nível. Dentre as mais famigeradas figuras do Arco do Telles nessa época, sobressaiu-se a prostituta e depois feiticeira Bárbara dos Prazeres. A maior parte dessas informações foram registradas pela Intendência Geral de Polícia, criada pelo Príncipe  Regente D.João, em 1809.

Nascida em Portugal no ano de 1770, tinha 18 anos de idade quando veio com o marido para o Brasil. No Rio de Janeiro, apaixonou-se por um mulato e assassinou o esposo para viver livremente com o amante. Consta que o homem, porém, passou a viver às custas da jovem e chegou a consumir a maior parte dos seus bens. Durante uma briga do casal, Bárbara o matou também.

Marcada pelos assassinatos e sem meios de subsistência, restou à bela jovem de 20 anos ganhar a vida se prostituindo. Fez seu ponto exatamente ali, debaixo do Arco do Telles, onde angariou vasta clientela. Por quase 20 anos, ela considerou ter encontrado a sua vocação e o seu lugar na sociedade.

Porém, o tempo e a vida desregrada cobraram o seu tributo. Começou a ficar velha e já não atraía tantos homens. Também as dores nos ossos a cada dia ficavam mais insuportáveis (provavelmente havia contraído sífilis). Temendo cair na miséria e na solidão, desesperada, ela procurou um remédio nas muitas casas de feitiçaria e magia negra do Rio de Janeiro, uma poção que aliviasse suas dores e a tornasse bonita e jovem outra vez.

Uns dizem que custou todo o dinheiro que ela tinha juntado, outros, que o preço foi sua alma; de concreto, o que se sabe é que alguém lhe passou uma fórmula que teria o efeito desejado. Os principais componentes eram certas ervas e sangue humano morno, mais precisamente, de crianças ainda vivas.

Foi quando começou a raptar meninos pobres, filhos de escravos e de mendigos, e também a ficar de tocaia na Roda dos Expostos da Santa Casa, onde eram abandonados os bebês para adoção. Não há números exatos, mas foram dezenas as vítimas que ela sacrificou no lúgubre ritual de rejuvenescimento. O pavor tomou conta da população do Rio de Janeiro, cujas crianças passaram a ser trancadas em casa e só saírem na companhia de adultos.

Essa personagem misteriosa, aparece nos registros do Intendente Geral de Polícia, desembargador Paulo Fernandes Vianna, como Bárbara dos Prazeres (por causa do oratório no Arco do Telles) e também como Bárbara “Onça” (referência à sua ferocidade). Parecem vir desse período as expressões: “cuidado que a bruxa está solta!” e “olha que a Onça está solta!”.

Bárbara levava suas pequenas vítimas para a tapera em que morava, na Cidade Nova. Pendurava as crianças pelos pés com uma corda, as esfaqueava e postava-se embaixo delas para banhar-se no sangue que jorrava ainda quente dos corpos já sem vida.

Bárbara dos Prazeres talvez foi a criminosa mais procurada na cidade em todos os tempos. Consta que viveu até 1830, quando simplesmente desapareceu. Nesse ano, surgiu um cadáver de mulher boiando próximo ao Largo do Paço, mas suas feições estavam irreconhecíveis. Alguns afirmaram que era Bárbara, mas outros não a identificaram.

Há quem suspeite que ela continua viva até hoje, graças ao segredo da fórmula de rejuvenescimento. E mais: teria assumido a condição de feiticeira e aplicado a receita em alguns milionários, em troca de parte de suas fortunas.

Diz-se que ainda hoje, em certas madrugadas sem lua, quando já partiram os últimos garçons dos bares da Travessa do Comércio e cessou o movimento da boemia, escuta-se no beco a gargalhada de Bárbara Onça, a feiticeira, ecoando assustadoramente pelos vazios escuros do Arco do Telles.”

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