Fiquei impressionado com o sangue de dona baratinha dos ingleses e mexicanos nas oitavas de final da Copa do Mundo. As duas seleções foram, como até as estalactites da Gruta de Maquiné sabem, garfadas de forma monumental pelos árbitros e bandeirinhas, em desempenhos capazes de fazer o velho Al Capone parecer um simples ladranete de esquina.

A reação dos ingleses foi rigorosamente destituída de caráter. Depois do chute de Lampard – a gorduchinha entrou meio metro e o ladravaz Jorge Larrionda, com inestimavel colaboração do bandeira, não confirmou o gol –  alguns jogadores levantaram as mãos para os céus feito as beatas do Juazeiro, fizeram caras de bebês chorões e ficou por isso mesmo.
O mínimo que se exige de um time numa situação dessas é transformar o gramado numa sucursal do inferno, com direito a dedo na cara do bandeira, palavrões da pior espécie, mão na bunda do juiz no meio do bololô, porrada no gandula, provocações ao adversário para gerar cinco expulsões de cada lado e coisas do gênero.

Quem manja um pouquinho de futebol há de concordar com o seguinte: até numa simples pelada de rua um lance daqueles gera, no mínimo, a suspensão do jogo por meia hora. Quando acontece algo similar na várzea mais muquirana de Nova Iguaçu, a mais chinfrim, o campo se transforma em segundos numa filial do sertão nordestino nos tempos do cangaço. O que passa a valer é  a filosofia do jagunço Riobaldo Tatarana: Se Deus vier, que venha armado.

Que se dane essa babaquice politicamente correta  de fair play, capaz de reduzir uma epopéia digna da Ilíada a uma página de Fernão Capelo Gaivota. Esse jogo limpo é feito arroz sem sal;  é a tentativa de transformar a partida de futebol – o evento que potencialmente melhor ilustra as reflexões sobre a catarse na arte poética de Aristóteles – em algo tão profundo quanto as divagações de Gabriel Chalita e do padre Fábio de Mello sobre o amor, a amizade e a vida nas lições do Pequeno Príncipe. 
O fair play é a mimese de um coito interrompido, é a representação à socapa dessa onda do futebol como evento de mídia, palco do jogador garoto-propaganda de eletrodomésticos, dos sibaritas travestidos de craques, do torcedor que vai ao jogo como se fosse a uma representação de Aída na Ópera de Paris, nos velhos tempos da belle époque.
E o que dizer dos mexicanos? Que diabos aconteceu com a pátria aguerrida do bigodudo Emiliano Zapata? Quando se esperava dos cabras uma reação ao escandaloso gol de Carlitos Tevez – na banheeeeeeeiiiiiira, como diria Mário Vianna –  digna de bandoleiros chefiados por Pancho Villa, aquela reclamação mequetrefe mais parecia  coisa dos amiguinhos de Speedy González, o camundongo Ligeirinho.
Quero crer que os ingleses e mexicanos, em virtude das reações tão amorfas aos assaltos em campo, saem do mundial como elementos potencialmente perigosos, capazes das piores vilanias, já que não extravasaram a raiva no único lugar em que, por direito,  ela deveria ter sido exorcizada: no tapete verde, de preferência com os bandeirinhas gloriosamente empalados, à moda Conde Drácula, em seus próprios instrumentos de trabalho. 
Abraços

7 Replies to “O FUTEBOL PARA PEQUENOS PRÍNCIPES”

  1. Caro Simas,

    Concordo plenamente com você.

    E vou além, no jogo do Brasil contra a Costa do Marfim faltou ao nosso time um Anselmo para acertar um direto no queixo dos Marios Sotos africanos.

    Fair play de cú é rola!

    Abraço do Coelho

  2. salve, professor,

    muito bem dito.
    ingleses e mexicanos foram uns verdadeiros perobões no tapete verde, como se diz aqui no ceará.

    abçs

    carlos anselmo

  3. Meu Camarada,
    voltamos ao nosso assunto recorrente, a pancadaria salutar, que virou até polca.
    Eu fiquei puto e com vergonha pela faita de atitude antidesportiva dos zé manés ingleses e mexicanos.
    Aguardei ansiosamente o fim do jogo pra ver o pau cantar, e nada…
    Saudade de Almir Pernambuquinho, Anselmo, Ramirez…
    Abração,
    Mauricio Carrilho

  4. Genial.

    “Que se dane essa babaquice politicamente correta de fair play, capaz de reduzir uma epopéia digna da Ilíada a uma página de Fernão Capelo Gaivota.”
    Esse parágrafo todo é magistral!

  5. Simas,
    Fico pensando o que teria ocorrido se a surrupiada fosse a Argentina…
    Gostaria de ter citado o Brasil como exemplo, mas temo que nesta seleção ecumênica,tenhamos passado de Bravos Tamoios a complacentes pastores. Oxalá eu esteja errado.
    Um abraço.
    Marcos Alli.

  6. Grande COELHO,faltou mesmo o Anselmo da vez. O problema apenas é saber quem, nessa turba de meninos bem comportados, teria a dignidade de meter um direto num carrasco daqueles.Abração.

    Salve, CARLOS. Temo que essa copa só tenha os tais de perobões. Abraço.

    MAURÍCIO, meu mestre, tive rigorosamente a mesma sensação. Achei que no final do jogo aconteceria algum furdunço…e nada. E tome polca!!!! Abração.

    Valeu, PEDRO. Abraço.

    MARCOS, acho que você, infelizmente, não está errado. Foram-se os tamoios… Abraço

  7. os melhores momentos da copa estão aqui!
    e um berro do fundo da alma no escutador de bolero dobandeirinha, umidificado de saliva do canto da boca? nao houve!
    estou às gargalhadas aqui
    dyocil

Comments are closed.