Mais uma quarta feira e mais uma coluna “Formaturas, Batizados & Afins”, assinada pelo Professor Adjunto de Biofísica da UFRJ Marcelo Einicker. Hoje o tema, em ritmo de Copa do Mundo, é uma explicação cientpífica do terror dos goleiros: a fmaosa Jabulani.
A Ciência e o mistério da bola Jabulani
Em tempo de Copa do Mundo, vamos trazer para a coluna um pouco de Ciência para a polêmica por conta da nova bola – a famosa JABULANI – desenvolvida especialmente por uma grande marca de artigos esportivos para este evento.

Um pouco de história
Que o futebol é a paixão do brasileiro e de tantas outras nações ninguém duvida, mas como isso tudo começou ainda é uma grande controvérsia. Para alguns, o futebol teria surgido por volta de 3.000 anos antes de Cristo, na China, onde militares ou guerreiros se reuniam para treinamentos em campos onde chutavam as cabeças dos inimigos derrotados, numa espécie de jogo de futebol primitivo e mesmo bizarro. Também existem relatos no Japão de um jogo bastante próximo ao nosso futebol praticado com uma bola feita de fibra de bambu.
E, no decorrer dos anos, seguiu-se o que em biologia poderia se chamar evolução. Seria a evolução do futebol, passando por mais alguns modelos de jogos até que “futebol primitivo” chega à Inglaterra por volta do século XVII; onde ganha as regras básicas que temos hoje em dia e onde a bola começa a ganhar maior atenção, já sendo de couro, costurada e inflada com ar.
Em 1848 também na Inglaterra são estabelecidas de forma oficial as regras, em 1871 criada a figura do goleiro, que seria o único a poder tocar a bola com as mãos. Já em 1885 começa o futebol profissional e no ano seguinte, é criada a International Board, entidade responsável por manter ou alterar as regras do jogo. Finalmente em 1904, surge a Federação Internacional de Football Association (FIFA), que hoje é a maior entidade do futebol mundial, responsável pelos campeonatos inclusive, pela Copa do Mundo.
Portanto desde quando o futebol trocou as cabeças por algum tipo de bola, proporcionou o aprimoramento de técnicas para tocar esta bola, chutar, cabeceá-la, protege-la do adversário…e assim surgiram o drible, a finta, o passe, a magia que envolve o jogo, cada partida de futebol. Sempre com ela, a bola, como estrela maior.
A bola
Quem nunca jogou uma pelada na rua, na quadra do colégio com uma simples bola de meia, ou mesmo com um monte de papel embrulhado em forma de bola? Existem centenas, talvez milhares de tipos de bola, porém, para a prática do esporte, a bola deve seguir regras muito bem estabelecidas. A bola deve ser esférica, recoberta de couro ou outro material aprovado, que não represente perigo à integridade dos atletas. Para o futebol de campo, sua circunferência máxima será de 69,5 cm, e a mínima 68,5 cm; o peso dever estar entre 420 e 445 g no início da partida, e depois de cheia ela deve ter a pressão de 0,8 bar.
Ou seja, existe uma padronização para a bola o que impede que partidas oficiais sejam disputadas com bolas fora destas especificações. Isso nos faz lembrar de inúmeras reclamações por parte dos jogadores acerca da qualidade da bola. Que ela é mais leve, mais pesada, mais dura, mais ligeira. Entretanto, pela regra bola é bola, nas suas especificações regulamentares. Logo, é de se pensar que um jogador profissional que reclame da bola, não tenha lá assim tanta intimidade com seu instrumento de trabalho. Um dos maiores jogadores de todos os tempos, o argentino Di Stefanno, tem no jardim de sua casa uma estátua em bronze de uma bola onde se lê: “Obrigado gorda!”.
Alguns dos maiores jogadores do mundo em todos os tempos costumavam comentar que chamavam a bola de “você”, refletindo a intimidade que tinham com a redonda. Mas afinal, a bola que transformou Pelé em Rei, Ronaldo em Fenômeno, Maradona em Deus e tantos outros homens em ídolos pode ainda evoluir mais e chegar a uma situação de máxima perfeição?
Parece ser exatamente este o ponto que tem provocado tantas reclamações no período que antecedeu o início da Copa do Mundo e mesmo agora já durante os jogos. Jogadores da Seleção Brasileira, como o goleiro Júlio César (considerado por muitos o melhor goleiro do mundo) e de outras seleções vieram a público reclamar da bola do Mundial da África, a já famosa Jabulani – que no idioma Zulu significa “celebrar”. Segundo os jogadores, a bola Jabulani é mais leve… mais rápida… mais teimosa, dura de ser dominada. Mas se a FIFA estabelece regras para a bola, como pode a Jabulani ser mais leve ou mais rápida?
A Ciência desvenda o mistério de Jabulani
Feitas as reclamações, o fabricante da bola partiu em defesa de seu produto, dizendo terem utilizado jogadores de sabida técnica (como nosso Kaká) para testes em campo com a Jabulani [Nota do Editor: jogadores patrocinados pela Adidas, fabricante da bola]. Foi ou teria sido usada uma tecnologia digna dos projetos de desenvolvimento de carros de corrida, inclusive com testes em túneis de vento. A FIFA também se colocou contrária às reclamações, apoiando os argumentos da fornecedora de material esportivo, pois teriam desenvolvido a Jabulani com o que existe de mais moderno.
No entanto, começa a Copa, e logo nos primeiros jogos alguns goleiros sofreram “frangos” incríveis, atribuídos ao mistério da bola Jabulani. O número de gols na primeira fase foi o mais baixo da história das Copas, o número de passes errados foi considerado alto, e só depois de mais de 60 jogos houve um gol de falta. Evidências mais do que suficientes de que realmente a Jabulani é um tanto quanto mais rebelde que suas antecessoras, bolas de menos tecnologia, mas que garantiam mais deslumbramento nas jogadas.
Para acabar com a polêmica, laboratórios de Física pelo mundo afora realizaram testes com a Jabulani. A própria Agência Espacial Americana, a NASA, dedicou esforços para analisar a bola Jabulani. Aqui no Brasil, pesquisadores da USP também analisaram a Jabulani e em comum todos os testes feitos mostram as mesmas conclusões. Realmente a Jabulani é uma bola “teimosa”, difícil de ser dominada e de ser colocada no gol com categoria e mesmo na força. A bola parece estar sujeita a incríveis alterações de sua trajetória em chutes a partir de 45 Km/h (considerados fracos). Estas alterações na trajetória se devem justamente a evolução tecnológica que concebeu a Jabulani. Ao contrário das bolas anteriores, a Jabulani é formada por apenas oito painéis ou placas soldadas industrialmente, ou seja, ela não tem costuras. As bolas tradicionais de até 14 gomos tinham costuras muitas vezes feitas à mão, que formavam pequenas ranhuras entre os gomos por onde o ar circulava durante a trajetória da bola após o chute. Com a Jabulani estes caminhos para o ar circular entre as placas ou gomos é praticamente inexistente, e assim o atrito da Jabulani com o ar é maior. Isso faz com que ela fique sim mais sujeita a alterações da sua trajetória, o que explicaria a onda de reclamações dos atletas.
Outro agravante para a Jabulani seria o material sintético usado para sua fabricação, que seria outro causador de alterações do efeito do atrito com o ar e a trajetória final seguida pela bola. Em poucas palavras, por mais craque que seja o jogador ele tem muito mais dificuldade em um chute preciso com a Jabulani do que com outras bolas.
Portanto o problema da Jabulani não é que ela é mais leve, mas sim que ela é tão mais moderna tecnologicamente que não possui costuras e com isso fica sujeita a golpes de ar e ao atrito com o mesmo.
É interessante vermos que a tecnologia deve sempre estar em favor do desenvolvimento das coisas e mesmo do esporte. Assim é no automobilismo, o desenvolvimento dos motores, combustíveis, pneus; na natação a criação daquele macacão que fez despencarem os recordes, e que acabou sendo abolido, e agora o futebol nos dá um exemplo ao contrário, de que nem sempre a máxima tecnologia vai jogar a favor. No caso da Jabulani, parece mesmo ter sido um tremendo gol contra!”