Começamos o dia com um texto do jornalista e amigo Marco Aurélio Mello, do excelente e revelador “Doladodelá”:

“A palestra motivacional foi num domingo ensolarado. O dia todo! Que tal? Já começamos bem motivados, não acham? Você espera a folga, a família se planeja e, de repente: workshop. Imaginem só a motivação dessa turma às nove da manhã. O primeiro convidado é um engenheiro, que explica como serão as mudanças, depois da construção da nova torre, com vista para a ponte estaiada, o novo cartão postal da cidade que, ‘coincidentemente’, fica ao lado do Shopping Center de Notícias. Durante a explanação, uma novidade: os funcionários perderão parte das vagas do estacionamento. Seguem-se os protestos. Inclusive o meu. Argumentei que virou direito adquirido. Aliás, para fazer a mudança do centro da cidade para a zona sul, um dos atrativos da empresa tinha sido esse: estacionamento grátis. Detalhe, naquela região é praticamente impossível encontrar local pra parar. Portanto, quem tem vagas disponíveis cobra o que quer. Em seguida, várias outras explanações, ‘power points’ que demoram a funcionar, microfones com volumes diferentes, aquelas coisas de sempre… Ah, intervalos para o café, com suco de laranja, mini croissants, petit four, os clássicos de sempre. Mas a cereja veio no final, com o palestrante convidado: Bernardinho. Ninguém tem dúvidas da competência do técnico supercampeão, certo? Mas, convenhamos, seu método não é muito bacana para ser transposto do esporte para o trabalho. Só para dar um exemplo: a equipe de volei chega no hotel do outro lado do mundo, depois de horas e horas de viagem, várias escalas, etc. Qual é a primeira coisa que Bernardinho pede? Treino. Mas o hotel não tem quadra? Não tem problema, treina no estacionamento. Mas está chovendo? Não tem problema, treina na chuva. E assim ele vai encantando os ‘gestores’ da corporação, que tiraram um dinheirão do orçamento para pagar o cachê. Isso, se não fizeram algum acordo do tipo ‘permuta’, ‘merchandising’, ou outra regalia qualquer. Três frases sintetizam a palestra do craque: “ele (o chefe) foi duro, ele exigiu muito, mas ele quer o seu melhor. Ser eficiente e ocupar espaços é o caminho do sucesso. Foi bom, foi muito bom, mas pode ser melhor.” No fim de um ano duríssimo, em que a equipe estava arrasada, que tal uma palestra motivacional dessas?

Pois é. Também tenho muitas ressalvas sobre este tipo de palestra e sua influência na motivação das equipes.

Até porque, se formos reparar bem, o núcleo destas paletras é basicamente similar: “você precisa se superar, você pode, você deve ser melhor”. Tempere-se isso com lacrimogêneas histórias do tempo em que o palestrante amarrava cachorro com linguiça e passava dificuldade em “São Cabrobó do Paraíso Perdido”; e encontramos um exemplo de vida habilitado a cobrar fortunas por uma hora de falação e conversa fiada.

Como nunca ocupei posições gerenciais em meus 15 anos de carreira como economista, não tive muitas ocasiões para assistir a este tipo de evento. Por isso, acho que perdi menos tempo em minha vida.

Por outro lado, tenho sérias dúvidas se as chefias em geral “querem realmente o seu melhor”. Diria que o objetivo principal é fazer com que a equipe trabalhe de acordo com as suas metas e de forma a garantir a continuidade de sua carreira. Se esta postura representar o bem para a empresa e trazer benefícios para os funcionários da equipe, é uma consequência acessória e não alvo inicial.

São raras as chefias que se preocupam com o desenvolvimento profissional de sua equipe de forma genuína. Normalmente este tipo de ação é de fora para dentro, geralmente com origem no Departamento de Recursos Humanos da Empresa. Ressalto, porém, que tive chefes diretos que são exceção a este quadro de descrevo aqui.

Se a sociedade atual é extremamente individualista, o mundo empresarial é um microcosmo deste ambiente. Não espere encontrar frequentes declarações de solidariedade ou honestidade.

Contudo, voltando ao tema deste post, tais eventos refletem o poder do marketing pessoal sobre as coisas que realmente importam. Mais relevante que apresentar bons resultados é apregoar “eu trouxe o Bernardinho”, “eu contratei o Fernando Henrique Cardoso”, mostrar como são bons gerentes e querem o bem da empresa.

Que fique clara uma coisa: acho que um trabalho motivacional, bem feito, pode agregar muito valor a qualquer tipo de grupo. Em meus tempos de liderança na Juventude Messiânica fazia muito este tipo de coisa. Eu só não acredito em iniciativas deste tipo trabalhadas de forma genérica, porque é um trabalho eminentemente individualizado.

Por isso que não acredito em livros de auto-ajuda nem neste tipo de palestra. Para mim é perda de tempo. Se quer contratar o cara para ouvir histórias – e muitas deles são bem legais – e enriquecer algum tipo de evento, sem problemas. Mas daí a tirar lições de gerenciamento e espírito de equipe…

Eu não acredito em duendes ! Nem em palestras…

4 Replies to “Palestras Motivacionais – uma grande bobagem”

  1. Cara, seu blog é foda. Cada dia com assuntos diversos. Foi um grande achado te encontrar. Parabéns mesmo pela diversividade e riqueza de conteúdo que nos proporciona.

    Quanto a estas palestras e livros sobre o assunto acredito que a maioria serve como “tiro curto”. O cara vai lá, ouve aquela coisa toda, se motiva e tal, e por algum tempo tem uma força maior para realizar algo. O problema é que, por não envolver uma transformação pessoal, esta motivação tem vida curta e o indivíduo já volta ao rame-rame de sempre. Por isso as palestras motivacionais em esportes geralmente se dão pouco antes do início das partidas decisivas na esperança que o “dopping emocional” esteja máximo no momento certo.

  2. Eu já assisti uma palestra do Bernardinho, logo após ele ter sido campeão mundial de vôlei pela primeira vez, em 2002.

    Só que foram 2 horas de apresentação: 1 de apresentação dos resultados, outra da palestra do Bernardinho. E num dia de semana! Muito mais “suportável”. Valeu pelas histórias e perceber o carinho que ele tinha com o Dante, na época um jogador de 20 e poucos anos.

    8 horas num domingo, desanima qualquer um…

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