Mais um período eleitoral se encerrou.

Primeira eleição após o impeachment da presidente Dilma, a primeira depois do escândalo do Lava-Jato, e o resultado ficou explícito.

A esquerda precisa se reinventar.

Não vamos entrar no mérito se foi golpe ou não, se a mídia e a justiça são parciais ou não, até porque cada um tem opinião diferente, mas está bem claro que o PT está em maus lençóis. Seu poder eleitoral caiu muito nessas eleições, o partido se apequenou tanto em cargos majoritários quanto em quantidade de vereadores graças aos escândalos em que se meteu. Quase todos os caciques do partido foram denunciados, vários presos e sobrou até para o Lula.

O maior nome do partido e da política nacional teve sua vida devastada, é acusado de vários atos ilícitos e corre risco de ser preso a qualquer momento. Tudo isso provocou reflexos nas eleições.

Não só o PT, mas a esquerda toda foi colocada no mesmo balaio. Ter seu nome, sua sigla associados ao PT passou a ser algo ruim, prejudicial. Nas eleições de 2016, o PT virou um fardo, um pária e ficou bem nítido em pleitos como em São Paulo onde vi muitas pessoas falarem “Votaria no Haddad tranquilamente, pena ser do PT” ou na eleição carioca, na qual o PSOL foi associado ao PT mesmo o partido nunca tendo feito parte do governo. Ser aliado ao PT na eleição carioca virou motivo de ofensa como escrever livros intolerantes ou apoiar black blocks.

O eleitor associou o PT ao restante da esquerda e esse foi um dos motivos de o PSOL ter perdido no Rio. Em 2014, logo após a eleição presidencial escrevi uma coluna aqui dizendo que a direita tinha perdido a vergonha. Durante décadas ninguém queria ser associado à direita e a partir daquele momento muitos já se declaravam de direita e com orgulho.

Muitos foram os fatores que fizeram a direita vencer as eleições de 2016 e acredito que desde a redemocratização podemos dizer que é a primeira vez que isso ocorre. Os escândalos dos governos do PT ajudaram, até porque os maiores beneficiados desses governos foram os pobres e pobre normalmente não é de direita, normalmente porque aqui no Brasil até pobre de direita existe.

As manifestações de junho de 2013 ajudaram, como o surgimento do MBL, que hoje é uma milícia de direita que se acha importante o suficiente para ameaçar estudantes que fazem ocupações. Outro fator que ajudou é a violência. A esquerda brasileira é associada aos direitos humanos e aqui no Brasil tão incrível quanto sabermos que existem pobres de direita é saber que direitos humanos podem ser associados a algo ruim. A classe média e mais à direita do país acha que direitos humanos só servem para proteger bandidos quando o termo é lógico, direitos humanos foram feitos para defender o… adivinhem… ser humano. A violência, a impunidade fazem surgir com força seres como Jair Bolsonaro e sua família. A descrença e a falta de esperança fazem que bispos pentecostais se elejam em grandes cidades a cargos majoritários.

A falta de esperança na justiça, nos poderes e mesmo na vida em geral fazem surgir os falsos Messias, aqueles que prometem riqueza, justiça nem que seja no olho por olho dente por dente como na Alemanha nos anos 30. Mas é um problema mundial, vide que Donald Trump tem boas chances de virar presidente dos Estados Unidos.

A voz das urnas mostrou isso. O povo está cansado de roubalheira, está cansado de sofrer, cansado de sentir medo. O PT é o principal alvo, mas mesmo a direita vencendo não dá pra dizer que há vencedores de fato quando vemos o alto índice de votos brancos, nulos e abstenções por todo país. O povo não confia na classe política e isso fez que em São Paulo elegessem um candidato que dizia com firmeza não ser político.

E a culpa disso tudo é do PT. Pessoalmente acho, sim, que existe perseguição contra o partido, por parte da mídia e da justiça, mas não dá para negar, não dá para ficar cego a tudo que o PT fez. Da melhoria de vida das classes mais baixas tendo acesso a universidades, bens de consumo e saindo da linha da pobreza, mas também à crise econômica e principalmente à corrupção. O partido que sempre foi paladino da ética se sujou e manchou sua biografia, comprometendo seu futuro.

A única chance de o PT ressurgir vem justamente do seu maior alvo hoje, Lula. Ele é o único nome do partido capaz de vencer uma grande eleição. Apesar de todos os problemas e denúncias, Lula ainda é um cara muito querido principalmente nas regiões Norte e Nordeste, o que lhe garante passagem para segundo turno presidencial. O carisma dele seria capaz de vencer uma eleição mesmo com Sudeste e Sul contra. A chance de o PT seria que ele vencesse e fizesse um grande governo como fez nos seus oito anos.

Mas para isso depende da justiça, depende de Sergio Moro e não lhe vejo com muita vontade de deixar que isso ocorra. Acho bem mais fácil que ele seja preso do que vire presidente. Caso isso ocorra só vejo uma chance para o PT. A mudança de nome como fizeram PDS e PFL.

É hora de a esquerda fazer uma auto crítica, como Freixo fez após a derrota,  dizendo que o PSOL tem de chegar às classes mais pobres. É hora de aceitarem e se refazerem. Principalmente é hora do PT assumir seus corruptos e bani-los em vez de acobertar e culpar a tudo e a todos.

A voz das urnas foi forte.

Só não ouve quem não quer.

Twitter – @aloisiovillar

Facebook – Aloisio Villar

3 Replies to “A voz das urnas”

  1. Resido numa cidade cuja Câmara Municipal tem 21 vereadores, nenhum dos eleitos foi do PT. Na minha cidade natal Lula veio pedir votos pro candidato do partido dele, também é a cidade do governador do estado (que me dava caronas em comícios pró Lula em 2006), e na sexta-feira às vésperas da eleição uma assessora da primeira dama (que foi colega de sala de um irmão meu, e cuja casa qdo solteira teve projeto assinado por minha irmã) foi pega pela polícia federal com dinheiro vivo que seria usado para compra de votos. No domingo o resultado foi, governador Camilo perde “em casa por 178 votos, e pro PSDB.
    No vizinho Pernambuco (moro a poucos Km da terra de Luiz Gonzaga) a figura da alma penada Eduardo Campos tem sido utilizada pra expulsar o PT do estado. Muitos crêem que o partido de Lula mandou matar o neto de Arraes, a figura mais importante da esquerda no Nordeste até a ascensão do “filho de Chico Buarque”. No Recife toda a direita se juntou ao prefeito do PSB e derrotou facilmente aquele que tinha sido o prefeito mais popular da Veneza brasileira desde a redemocratização, o petista João Paulo.
    No maior estado da região, a Bahia – onde desde 2006 tem garantido a maior diferença absoluta pró PT nas eleições presidenciais, o Carlismo retomou a força na capital, quase três quartos dos votos válidos dos soteropolitanos foram pro Neto.
    Voltando ao Ceará, com sacrifício os Ferreira Gomes (cearense só chama os irmãos Ciro e Cid pelos dois sobrenomes, nada de apenas Gomes) conseguiram vencer na Capital contra a onda de Bolsomitos e militarismo de quem tomou ódio e medo do clima de insegurança a ponto de votar em policial pra prefeito.
    Nos outros estados da região o PT é quase zero, isso em termos de eleição municipal.
    Este foi o recado das urnas no ‘lulista’ Nordeste.
    Eleição Federal são outros quinhentos, mas neste momento a perspectiva é de super poderes também em via eleitoral para a hoje desavergonhada direita brasileira. E

  2. Sem contar, Aloisio, que em muitas campanhas, os candidatos do PT esconderam as estrelas e o vermelho, numa tentativa de se desvincular do partido.

  3. “O eleitor associou o PT ao restante da esquerda e esse foi um dos motivos de o PSOL ter perdido no Rio.”

    Uma parte somente, talvez, e uma parte bem pequena. A maioria expressiva do eleitorado não está nem aí para esquerda e direita. Essa coisa de que “pobre normalmente não é de direita” é verdade. Nem de direita, nem de esquerda. Ele tá pouco ligando para isso. Pobres (classes C, D e E) são maioria expressiva no Brasil e são quem efetivamente elegem governos. Enquanto os governos petistas foram bons, foram reeleitos. Qdo Dilma cometeu o estelionato, perdeu sua base de apoio.

    Por fim, se “é hora do PT assumir seus corruptos e bani-los em vez de acobertar e culpar a tudo e a todos”, entendo que é um recado para expulsar Lula, paradoxalmente sua tábua de salvação. Mas fazer isso agora, quase dez anos depois do mensalão, soará como oportunismo. Mas pode ser a saída.

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