Fui uma das pessoas que ficou muito marcada com o caso de estupro coletivo no RJ. Vez ou outra me lembro desse caso, seja deitada, no trabalho, no ônibus. Junto com as lembranças, vem a sensação de angústia, medo e impunidade.

Se já é assim para mim, imagina para a garota que passou por tudo isso? Apesar das várias hipóteses e mistérios envolvidos nesse caso, houve estupro e disso não há dúvida. Não importa se ela foi lá disposta a transar com um ou quarenta, se tocaram nela enquanto ela não estava consciente: houve violação.

Quando fui ao Rio de Janeiro, em 2014, levei muita cantada. Mas eu sei diferenciar algo que me faz bem de uma coisa que me enoja. Algo delicado de algo chulo. Sei muito bem que um ‘’princesa’’, um ‘’você é a beleza e a simpatia em pessoa’’ e tantos outros não foram com más intenções. Mas mulheres sofrem agressões morais nas ruas todos os dias, ouvem coisas que dão nojo, e isso pode trazer muitas conseqüências psicológicas. Além das vítimas de estupro lidarem com essas conseqüências, ainda têm outra: a física/biológica.

aids-foto04As doenças sexualmente transmissíveis, mais conhecidas como DST’s, fazem parte do cotidiano de boa parte da população e muitos sequer sabem, devido ao fato de algumas dessas infecções permanecerem silenciosas. Há ainda aqueles que são mais vulneráveis, os chamados grupos de risco, como profissionais do sexo, usuários de drogas, jovens e pessoas violentadas. Essas doenças têm características que as definem bem, peculiares, mas há uma em comum entre elas: como o próprio nome já diz, serem transmitidas através do ato sexual.

As mais comuns são sífilis, gonorréia, hepatite B, AIDS e HPV. Elas podem ser transmitidas por vírus, bactérias, ou qualquer outro agente infeccioso e têm em comum, como o próprio nome já diz, o fato de serem transmitidas pelo ato sexual. Muitas delas, quando não matam, deixam sequelas gravíssimas no indivíduo. Impotência, possível câncer de colo do útero, como no caso do HPV, cirrose, como pode ser o caso da Hepatite, entre outras situações.

Até pouco tempo atrás, a única doença que tinha vacina aprovada pela ANVISA era a Hepatite B. No entanto, em 2006 este mesmo órgão aprovou para meninas/moças que nunca tiveram contato com o vírus HPV uma vacina para os subtipos que são responsáveis pela maioria dos casos do condiloma aculminado. Infelizmente, nosso país ainda tem pessoas muito conservadoras no poder, compondo a sociedade. Muitos pais e líderes religiosos criaram polêmica por causa da vacina contra o HPV, alegando estarem influenciando garotas a fazer sexo mais cedo.

rio-de-janeiro-elevado-do-joaO que eu lamento é que a preocupação maior dessas pessoas seja a filha fazer sexo e não a segurança dela. Muitos pais não conversam sobre sexo com as filhas, não as educam em relação a isso. Entendo que possa até ser desconfortável, mas é algo extremamente necessário. Enquanto isso, muitos meninos são levados pelos pais a um puteiro para terem sua primeira vez o quanto antes. E recaímos na velha história do machismo de novo. Errado com os meninos e com as meninas: ambos devem ser educados da mesma forma.

A mais devastadora delas, a AIDS, doença que causa destruição do sistema imune e deixa a pessoa extremamente vulnerável a outras infecções oportunistas, está longe de ter uma vacina. Isso porque o Vírus da Imunodeficiência Humana, o HIV, sofre mutações muito rápido, e é capaz de enganar nosso sistema imune – e qualquer vacina. Enquanto os vírus atacam e destroem os linfócitos T, células de defesa do corpo, vão se transformando rapidamente que nem a defesa do nosso corpo nem a vacina dão conta de pará-lo. Sempre digo que nosso sistema imune é muito inteligente e um dia vou dedicar uma coluna somente a ele de tão fascinante que é, mas o vírus consegue ser mais esperto. O que nos resta fazer é nos proteger e torcer para que essa realidade mude

A pessoa que sofre violência sexual tem o direito de receber um coquetel contra as DST’s, que, inclusive, certas pessoas desse governo impostor querem dificultar o acesso. Já não basta toda a humilhação e julgamento que uma pessoa passa, ainda tem que ter seu direito negado, dificultado. O tratamento para essas doenças é durante a vida toda; sempre é bom se manter vigilante. Mas antes de pensar em chegar a tal ponto, é importante pensar em se proteger. Usar camisinha sempre é fundamental, até mesmo se o parceiro for fixo. Quanto as pessoas que sofrem violência, não vamos deixar que tenham seu direito roubado.

Já basta terem roubada a dignidade.

Imagens: Arquivo Ouro de Tolo

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3 Replies to “A cultura do estupro: as conseqüências físicas”

  1. Além da vacina citada e da dificuldade para o fornecimento do coquetel para vítimas de violência sexual por parte do governo golpista, também deve ser lembrado o fato de que a nova secretária de política para mulheres é contra o aborto em caso de estupro. Ou seja, uma mulher é contra algo que defende um direito da… mulher!

      1. Nem eu. E ouvindo as conversas desse caso horrível da menina estuprada na zona oeste, percebo que essas mulheres machistas existem em um número bem maior do que eu pensava…

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