Já tem mais de ano que a pauta do impeachment está no topo da crise política, para a qual, via de regra, se imaginam apenas dois desfechos: a) Dilma resiste e cumpre seu mandato até o final; b) a oposição triunfa, Dilma é deposta e seu vice, Michel Temer, assume.

Pode ser, no entanto, que outros cenários, até aqui impensados, sejam o resultado final desse rolo onde nos metemos. Jamais se deve desprezar a capacidade dos brasileiros de serem ao mesmo tempo criativos e catastróficos, fazendo escolhas até então não imaginadas.

Por economia de espaço, me dediquei a especular apenas sobre 4 cenários não corretamente avaliados, mas é certo que há muitos outros à disposição. Basta dar tratos à bola que as opções vão surgindo. O comum entre esses 4 cenários que escolhi é que todos eles se fundamentam em dados da realidade que já estão mais ou menos em prática, ainda que a gente não tenha prestado a devida atenção.

#vemcomigo.

kassab_dilma4Cenário I – Dilma Fora do PT

O alvo do impeachment, por mais paradoxal que possa parecer, não é Dilma. Ela, aliás, é um complicador para os inconformados com o resultado eleitoral, porque, como dizem até seus adversários, ela seria uma pessoa honrada e alheia ao submundo da política, território, aliás, que nunca frequentara antes de ser Presidente – já que jamais se candidatara.

A raiva verdadeira é contra Lula e o PT, do qual Dilma é apenas uma representante, sem muita afinidade com a agremiação partidária a qual se filiou tardiamente. O PT, por sua vez, também não morre de amores por Dilma.

A imprensa já noticiou que Dilma cogitara sair do PT. Se ela levar essa decisão a sério e, mais ainda, passar a criticar publicamente alguns de seus ex-colegas de partido ou até mesmo aplaudir a prisão de alguns deles, rapidamente os canhões saem de sua mira, principalmente se todos os petistas perderem seus cargos no governo (ou, caso queiram seguir, que saiam também do partido).

Feito isso, Dilma pode remontar o governo ofertando ministérios de alto cacife para o PMDB, inclusive para a ala que hoje a combate. Com o PMDB unido em torno de Dilma e mais alguns ministérios distribuídos para partidos menores, não vai ser difícil criar uma maioria sólida no Congresso, evidentemente sob a lógica do toma-lá-dá-cá. A imprensa será menos hostil, o ajuste fiscal será empregado sem grandes resistências e as nuvens carregadas do ambiente político se dissiparão.

Perto da eleição de 2018 a base se esfacelará. Cada um por si, em busca da sucessão. Dilma estará novamente isolada, sob pesadas críticas de seus ex-aliados de ocasião e com a popularidade no chão. Um quadro parecido com o fim do mandato de Sarney. Porém, vai para a casa de alma lavada e sem a honra ferida.

O PT, claro, estará na oposição, com alguns de seus líderes presos; até Lula, talvez. Será curioso ver como reagirá a militância do partido quando Dilma virar as costas para eles e resolver virar peemedebista.

quem-e-silas-malafaia-2Cenário II – Evangélicos no Poder

As pedaladas fiscais arrastam Dilma e Temer, fazendo com que Cunha vire o presidente interino. Com o Congresso subjugado, uma lei eleitoral repleta de casuísmos ditará o ritmo da eleição.

Um candidato conservador se alia aos evangélicos (e também à ala católica mais conservadora) e se elege com uma agenda que prega valores “tradicionais”.

Com a sua eleição e o Congresso controlado por Cunha, várias medidas de impacto são aprovadas, tais como: [1]

  1. Anistia para crimes de lavagem de dinheiro cometidos por políticos, mediante repatriação de valores com pagamento de impostos;
  2. Concessão de incentivos fiscais para doações de dízimos;
  3. Convênios com organizações religiosas para realizações de obras sociais com dinheiro público;
  4. Proibição do aborto em qualquer circunstância;
  5. Aprovação do Estatuto da Família;
  6. Restrição aos cultos afros ou que invoquem espíritos satânicos;
  7. Obrigatoriedade do estudo do criacionismo;
  8. Cláusula de barreira nos parlamentos, para dificultar a eleição de políticos fora do establishment.

stf-pleCenário III – Judiciário no Comando

As pedaladas fiscais arrastam Dilma e Temer, mas Cunha e Renan são cassados também, por conta de seus problemas na Lava-Jato. Mais do que isso: o Judiciário promove uma cassação ampla de políticos enrolados com a corrupção.

O Presidente do STF assume a Presidência. No Congresso, há uma enxurrada de suplentes em substituição aos parlamentares cassados, sendo que esses suplentes também passam por rituais de cassação, sempre ditados pelo Judiciário, com base em provas contundentes e irrefutáveis obtidas pelas investigações.

A sociedade, em êxtase, aplaude a faxina geral.

Diante do quadro de degeneração da classe política, as eleições para escolha do novo Presidente não ocorrem nos 90 dias previstos pela Constituição. Ao invés disso, são adiadas para que sejam convocadas eleições gerais.

Uma comissão de juristas é nomeada para elaborar um anteprojeto de uma nova Constituição, no prazo de 12 meses, inclusive recebendo emendas de iniciativa popular. Ao final desse prazo, haverá um referendo para sua aprovação, à margem do Congresso, cuja popularidade é quase nenhuma.

As eleições gerais são realizadas sob as regras consolidadas na Nova Constituição.

Golpe de 64Cenário IV – Intervenção Militar

Algum tema unificador (como a reorganização escolar em SP) reacende o estopim das jornadas de junho de 2013. Por todo o país, manifestações de jovens tomam as ruas. Em um crescendo, as manifestações se tornam mais violentas, a repressão sobe no mesmo tom.

O quadro de insatisfação geral contagia o movimento sindical, que consegue impor greves em setores estratégicos. Em luta contra o impeachment, Dilma hesita em reprimir as manifestações e as greves, que estão na vanguarda do #ForaCunha.

Jovens da periferia ressuscitam as práticas do “rolézinho”, tornando os shoppings centers espaços de tensão social. Agências bancárias e lojas de rua são constantemente depredadas, ônibus são incendiados, o medo se espalha pela população.

Diante da impotência das autoridades em conseguir conter o caos social e da dificuldade de se retomar o ritmo normal das atividades, a mídia conservadora clama pelo restabelecimento da ordem. O recado é entendido pelos quartéis, que promovem a deposição de Dilma, fecham o Congresso temporariamente e prometem novas eleições em 1 ano. Milhares de pessoas são presas com base na Lei de Segurança Nacional e julgadas pela Justiça Militar.

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Gostaram? Pede mais impeachment, que tá pouco. Tá ruim, mas sempre pode piorar.

[N.do.E.: neste cenário traçado pelo colunista, eu acrescentaria mais uma medida: leis restritivas ou proibitivas do consumo de álcool. PM]

Imagens: Uol (Capa) e Arquivo Ouro de Tolo

4 Replies to “Cenários Alternativos e Sombrios”

  1. se cairem Dilma e Temer são convocadas eleições nos dois primeiros anos de mandato… não é Cunha quem assume

  2. “…Gostaram? Pede mais impeachment, que tá pouco. Tá ruim, mas sempre pode piorar…”
    Pois é, conheço gente que pedia impixa há alguns meses mas, parece, mudou de ideia.

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