Nos últimos anos, o crescimento econômico e a ascensão social de uma parcela importante da sociedade brasileira têm possibilitado uma nova realidade: viagens, muitas viagens. Pelo Brasil e para o exterior, nós brasileiros temos viajado bastante. Basta entrar no Facebook e conferir os álbuns dos seus amigos e conhecidos.

Nesta época, então, temos uma explosão nesse movimento: janeiro é tempo de férias pra muitos e, justamente por isso, um período em que muita gente viaja. E, como vocês sabem, um dos esportes prediletos dos brasileiros em suas viagens, sem dúvidas, é reclamar do Brasil. Mais ainda se a viagem for pro exterior.

Aí, ele se enche de força pra reclamar de todas as coisas que deixou pra trás quando passou pelo guichê da Polícia Federal no aeroporto. Ganha uma disposição impressionante pra cobrar eficiência de serviços públicos, reclamar dos preços das coisas no Brasil, falar mal do clima e questionar o serviço de mesa no restaurante.

Que fique claro, não há nada de errado em reclamar. É até bastante saudável. Só é curioso, e inconveniente, às vezes, o tom das reclamações. Explico: algumas coisas que acontecem no mundo inteiro são tratadas como se fossem problemas exclusivamente brasileiros; e o jeito arrogante como a coisa é verbalizada também pode incomodar bastante.

Em 2013, fui à Europa pela primeira vez. Passei o mês de dezembro inteiro lá. Em todos os países em que estive, os trens atrasaram. Todos, sem exceção. Em muitos, não houve qualquer tipo de aviso. Cheguei a falar disso no meu primeiro texto no Ouro de Tolo.

A diferença em alguns lugares, como a Holanda, tava no serviço. Como assim? Eu e os outros passageiros esperávamos por uma conexão em Roterdam, às 8:08. Ela não veio e, àquela hora, bem cedo para o inverno europeu, sol ainda nascendo, já havia uma fiscal da empresa na plataforma pra ouvir as reclamações, nos dar uma satisfação e encontrar uma solução. No caso, a confirmação do trem seguinte e um voucher pra tomar café da manhã.

Mas a verdade é que, dos lugares que visitei, a Holanda foi uma exceção. Lá os trens tinham até conexão wi-fi e dava pra ver na tela do celular quanto tempo demoraria para chegar à estação seguinte. Era tudo muito bom. Já fora de lá, não era nada demais. Às vezes, bem ruim.

Nada também, claro, que se compare ao serviço prestado pela Super Via e o Metrô Rio por aqui. Não era tão ruim também. Sem nem entrar em temas como conforto, segurança e tecnologia, basta pensar que a atenção ao usuário é praticamente inexistente. O mais perto que se chega disso são os seguranças do metrô empurrando a galera pra dentro dos trens na hora do rush.

De fato, o serviço prestado por aqui pelas empresas de transporte, ônibus, metrô, trem, barcas é horrível. Isso pra não falar dos táxis: no Rio, paga-se ao taxista pra ele fazer, quando aceita, a viagem reclamando do caminho que você escolheu. E antes fosse apenas o problema de um setor específico, né?

Acontece que as reclamações dos brasileiros no exterior costumam ser muito diferentes das de alguém que usa de fato o transporte ou qualquer outro serviço público. É o cara que só anda de carro no Brasil e quando vai pra Europa, fazendo aqueles passeios bem de turistão, só anda de transporte coletivo às duas da tarde, fora do horário de pico, em estações centrais e próximas, bem longe das periferias.

Afinal, o turistão, no Brasil ou no exterior, vai sempre achar tudo perfeito na cidade que visita por três dias e duas noites passeando naqueles ônibus coloridos que só param nos lugares legais e fazem aquele lance meio safári nos mais tensos.

E não ssomente sobre os serviços públicos são as reclamações. Quando estive em Montevidéu, em dezembro, ouvi uma brasileira esbravejando sobre o preço do show de um artista brasileiro por lá. Custava o mesmo que o show do mesmo artista aqui. Só posso deduzir que ela nunca foi a um show daquele músico. Ou pode ter sido enganada por um filho que usou o troco do ingresso pra comprar balas 7 Belo.

Essas reclamações, não só a da moça sobre o show, mas em geral, vem acompanhadas, muitas vezes, de uma fala sobre impostos. Na verdade, boa parte das reclamações de brasileiros no exterior, talvez a grande maioria, esteja apoiada no trinômio impostos-serviços-corrupção. Não vamos entrar nessa questão aqui, fica para outra oportunidade. O ponto é: essas reclamações são a expressão da realidade ou, em parte, fruto de uma visão distorcida propagandeada ao extremo?

Tendo a ficar com a segunda opção. Além disso, a forma e o comportamento de muitos desses mesmos reclamadores colaboram imensamente pro inconveniente. Grosserias desmedidas, gente furando fila, a famosa postura “faz agora porque estou pagando”, “ai o Brasil é muito perigoso”. Tudo isso junto leva a duas imagens: o Brasil parece um lugar horrível pra se viver ou pra se visitar, em que nada funciona, e a Europa e os EUA são paraísos de perfeição; por outro lado, fica latente, diante de alguns comportamentos, que o sistema de educação carece de maior qualidade.

Belo Horizonte - aeroporto confinsQuando vejo isso acontecendo, lembro sempre de um amigo português que diz que nada faz tão mal à imagem do Brasil do que o brasileiro em viagem. Não se trata, repito, de esconder deficiências óbvias, da realidade brasileira, tratando o país sem fazer as devidas críticas. Mas de perceber que algumas questões são dilemas de qualquer grande cidade no mundo ou de países em desenvolvimento e de compreender certas características associadas aos contextos locais.

Nessas horas, prefiro pensar que é um processo, que quanto mais a gente viaja, mais conhece a realidade no exterior e percebe que a coisa é bem diferente da imaginação. E, de quebra, entende que não dá pra levar tudo no jeitinho, na esperteza. Só não sei quanto tempo esse meu otimismo é capaz de resistir.

No fim das contas, a verdade é que há sempre uma tendência em achar a grama do vizinho, ou do país vizinho, mais verde que a nossa. Mas, quem sabe, a gente vai ficando mais esperto e entendendo que a distância do olhar colabora muito pra isso e que os matizes de verde muitas vezes não são tão diferentes assim.

Pro bem e pro mal.

2 Replies to “A grama do país vizinho é sempre mais verde”

  1. Certíssimo!

    Lembro de uma entrevista do Profº Luiz Marins no Programa do Jô, dizendo sobre isso: “Em Nova York, ficamos 2h 30min na fila do desembarque, no aeroporto, e nossas malas foram quase todas destruídas. Cinco dias depois, no Brasil, em Cumbica, com 15min as pessoas já reclamavam na fila”.

    É assim mesmo!! Eles só esquecem que “turismo é uma coisa, imigração é outra”. O cara que reclama aqui e acha tudo lindo lá é somente turista.

    No dia que ele tiver que lavar prato ou limpar privada pra sobreviver lá fora (porque estrangeiro só tem esse tipo de emprego lá fora, em sua maioria), ele para de reclamar do Brasil à toa.

    1. É bem por aí mesmo, Rodrigo. Na Copa, por exemplo, foi muito interessante ver os estrangeiros achando que, apesar de problemas por conta do volume, as coisas funcionavam, diferentemente do que ouviram lá fora e ouviam dos próprios brasileiros.

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