Iniciando a cobertura especial do Ouro de Tolo sobre a Copa do Mundo de 2014, aqui no Brasil, teremos uma nova seção. A “Meu Jogo Inesquecível” terá relatos sobre partidas inesquecíveis de Copa do Mundo da equipe do blog e de convidados. Será publicada até o final da competição, sem dia definido – ou seja, sob demanda.

Abro a série falando sobre uma partida que, digo, mentiria se fosse a mais marcante de minha vida. Entretanto, partidas como os dois Brasil e Itália (82 e 94) serão abordadas posteriormente, então trago aos leitores o dia em que um gênio das Copas se despediria dela: Diego Armando Maradona.

Considerado um dos principais expoentes de uma geração de cracaços de bola – Zico, Platini, Rummenigge, entre outros – o argentino já havia disputados três copas do mundo: 1982, 86 e 90, sendo campeão na segunda. Estava afastado da seleção após a suspensão de 15 meses por uso de cocaína determinada em março de 1991, sendo utilizado apenas em dois amistosos no primeiro semestre de 93. Sem Maradona, a seleção platina passa por grandes percalços nas Eliminatórias, perdendo a vaga direta após ser goleada impiedosamente pela Colômbia por 5 a 0, em plena Buenos Aires – e não foi maior ainda porque a seleção amarela “abriu o parquinho” antes do final da partida.

Com isso, a Argentina disputou a repescagem contra a Austrália, se classificando à Copa de 1994 “na bacia das almas”. Maradona estava presente, mas ainda acima do peso.

Para a Copa do Mundo, o craque fez um rigoroso regime, caindo de 89 para 76 quilos. Chegou aos Estados Unidos disposto a provar que ainda poderia jogar futebol em alto nível mesmo com 33 anos e após a suspensão por uso de drogas. O time argentino possuía diversos talentos: Batistuta, Caniggia (de triste memória para nós brasileiros), Redondo e outros.

maradona94_2Na estreia, Maradona fez grande partida contra a Grécia (foto), marcando um dos gols da vitória por 4 a 0. Fez ótima partida, comandando a sua seleção como capitão do time. A partida seguinte seria contra a Nigéria.

25 de junho de 1994. O Foxboro Stadium, nas cercanias de Boston, então casa do New England Patriots da NFL seria o palco da partida. Estádio que não existe mais, pois foi demolido em 2001 e construído em seu lugar o “Gilette Stadium”, sede da equipe da NFL atualmente. Tempo bom, estádio lotado.

A Nigéria havia também vencido sua estreia contra a Bulgária, com categóricos 3 a 0 e uma cena marcante: a oração do atacante Yekini dentro do gol após marcar o primeiro tento do país na história das Copas. Era uma equipe com alguns talentos individuais e muito forte fisicamente, além de um tanto quanto violenta – como a partida mostraria.

Contudo, Maradona foi o nome do jogo. Passou, driblou, criou jogadas, concluiu a gol e liderou a Argentina mesmo após sofrer o gol inicial da partida. A Nigéria abriu o placar aos 8 minutos do primeiro tempo com Siasia, mas sob a liderança de Maradona o esquadrão albiceleste viraria rapidamente a partida com dois gols de Caniggia, aos 21 e aos 28 da etapa inicial. Com a faixa de capitão, é um craque revigorado o que assistimos no decorrer da peleja. Maradona corre, pula, marca, sofre e comete faltas, lidera sua equipe.

Maradona participaria da jogada ensaiada de falta que levaria ao primeiro gol, mas é no tento da virada que sua genialidade fica marcante: um passe reto, vertical, não onde Caniggia estava, mas no chamado “ponto futuro”, atrás dos zagueiros. O bom atacante teve apenas o trabalho de desviar do arqueiro, dando a vantagem do marcador ao time sul americano. Poesia traduzida em bola.

Copa-2014-01Nos gols a Argentina ficou por aí, mas como mostra o vídeo que abre o post Maradona continuou criando jogadas e chances para a sua equipe ampliar o placar. Aos 48 minutos do segundo tempo, já nos acréscimos, Maradona dá um drible sensacional no zagueiro nigeriano, sofre o pênalti – ignorado pelo péssimo árbitro sueco Bo Karlsson, que deixou o pau comer a partida inteira – e a sobra ainda se torna mais uma conclusão perigosa após o bate e rebate na área.

O que ninguém sabia aquele momento é que este drible e o pênalti não marcado seriam o último momento do grande Maradona não somente em Copas do Mundo como utilizando em campo a camisa azul e branca número 10 de seu país: sorteado para o exame antidoping, seria acusada a presença da substância efedrina em sua urina – um estimulante também usado em regimes de emagrecimento.

Sem Maradona, suspenso, a Argentina definharia: derrotas para a Bulgária na última partida da primeira fase e para a Romênia nas oitavas de final, encerrando precocemente uma participação que poderia, com o grande camisa 10, ombrear-se ao depois campeão Brasil entre os favoritos à taça.

Entretanto, como o clichê associado ao nosso vizinho, a última página escrita por seu maior expoente nos gramados tinha de ter as cores de um bom tango: dramáticas, com finais infelizes e protagonistas atormentados. A volta por cima que se anunciava acabou tendo as nuances de uma canção típica da música nacional argentina: drama, choro e retirada.

Quem viu, viu.

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