Eis que, em um Rio de Janeiro que já sofre bastante com as obras para os grandes eventos que a cidade irá sediar e o fechamento de vias importantes, ocorre uma grande tragédia:  um caminhão bate em uma passarela na Linha Amarela, a derruba, interrompe o tráfego nos dois sentidos da via e, o que é pior: causa mortos e feridos.

Para os leitores de fora do Rio de Janeiro, a Linha Amarela é uma das principais artérias da cidade, ligando, grosso modo, a Ilha do Governador à Barra da Tijuca. Passa por diversos bairros das zonas norte e oeste da cidade e se tornou importante no fluxo de tráfego carioca. Não a utilizo no meu deslocamento diário; apenas quando vou à casa dos meus pais ou à quadra da Portela.

O acidente foi no bairro de Pilares, um pouco antes das saídas para o supermercado Walmart e o Norte Shopping (para quem trafega no sentido Ilha-Barra). A dinâmica do acidente já foi explicada pela imprensa e não cabe aqui repetir.

Uma das coisas importantes é que o caminhão não deveria estar trafegando naquele momento pela via. Há uma determinação proibindo caminhões na Linha Amarela entre cinco e dez da manhã e das cinco às oito da noite, exatamente para melhorar o fluxo de trânsito na cidade. Entretanto, como se vê tal proibição não foi respeitada.

Também de acordo com os relatos o caminhão estava com a caçamba levantada – para evitar multas – e trafegava em alta velocidade pelo local. Com a caçamba baixada provavelmente não teria havido o choque com a passarela.IMG-20140128-WA0058

Contudo, ao contrário do que muita gente afirmou na imprensa e nas redes sociais, não era da Prefeitura do Rio de Janeiro a responsabilidade pela fiscalização. A Linha Amarela é uma concessão administrada pela iniciativa privada, sendo inclusive pedagiada. A ela caberia impedir que o caminhão estivesse trafegando naquele horário, bem como coibir o tráfego com a caçamba levantada.

Não conheço os detalhes do contrato de concessão, firmado em 1997 – nos tempos do ex-prefeito Cesar Maia – e que vai até 2037 após ter sido prorrogado em 2010, mas tudo o que se refere a tráfego naquela via é de responsabilidade da LAMSA (Linha Amarela S.A.). A empresa faz parte do Grupo Invepar, formado por fundos de pensão em parceria com a construtora OAS (segundo o site da empresa).

Entretanto, é muito mais fácil colocar a culpa nos governos municipal e estadual, ainda mais dentro de um panorama onde boa parte da chamada ‘grande imprensa’ se comporta mais como um partido político que como um órgão jornalístico. Vale dizer que, embora o caminhão prestasse serviço à prefeitura, era de uma empresa terceirizada – e estes contratos deixam a responsabilidade pelas condições de serviço à contratada.

Acredito que a única responsabilidade da Prefeitura nesta lamentável tragédia, teoricamente, é em caso de indenizações às vítimas, onde ela atua como “responsável solidária” – comum neste tipo de processos e contratos.

Ainda assim imputa-se total responsabilidade, esquecendo-se que a via é uma concessão privada. Por outro lado, a tragédia deixa claro que o sistema viário carioca está operando no limite após os fechamentos de vias no Centro e a não entrada em operação das novas obras simultaneamente – como novas vias e a completa operação do BRT – que só deve ocorrer de forma total próximo às Olimpíadas.

Por mais que haja um apelo da Prefeitura para que os cariocas deixem o carro em casa, os problemas no deficiente sistema de transporte público deixam ao carioca muito poucas opções. Em bairros como a Ilha, onde moro, utilizar o (quase inexistente) sistema de ônibus acarreta em baldeações obrigatórias e um acréscimo do tempo a ponto de triplicar ou até quadruplicar os deslocamentos. Poucas linhas, poucos horários, trajetos extensos e veículos em péssimo estado de conservação.

Isto significa, aí sim, uma falha grave das esferas de governo municipal e estadual: a fiscalização dos transportes públicos no Rio de Janeiro é bastante deficiente, como provou o acidente ocorrido semana passada em São Cristóvão que parou todo o sistema de trens urbanos da região metropolitana do Rio. O Secretário Estadual de Transportes, Julio Lopes, parece mais interessado em defender os pleitos das empresas que em promover o interesse público, fundamental para o cargo que exerce.22jan2014---um-trem-descarrilou-no-comeco-da-manha-desta-quarta-feira-22-na-zona-norte-do-rio-de-janeiro-o-problema-afetou-todo-o-transporte-ferroviario-no-grande-rio-na-estacao-sao-francisco-de-1390392241760_956x500

Acredito que a entrada em operação de todo o sistema dos BRTs (linhas expressas de ônibus) e a (tímida) extensão do Metrô que se constrói neste momento irá melhorar o quadro, mas se não houver fiscalização não adianta nada. Este problema, aliás, vem se sucedendo governo após governo, independente de cor partidária.

A favor do atual alcaide vale dizer que nos 16 anos do mandarinato de Cesar Maia a única obra de porte em vias urbanas no Rio de Janeiro foi justamente a Linha Amarela, deixando a cidade claramente defasada em relação ao crescimento da frota e da economia carioca.

Eduardo Paes (verdade que pressionado pelos eventos que a cidade irá sediar) vem em seu governo se esforçando para aumentar a capacidade viária, e até ficar tudo pronto um pouco de paciência se faz necessária. Por outro lado, os últimos fatos mostram que falta um plano de contingência de tráfego, e isso fica claro em tragédias como a de hoje.

Também deve se elogiar no prefeito a sua disposição para se deslocar imediatamente aos locais de tragédias: imediatamente ele foi ao local onde a passarela foi derrubada, e isso se traduz em socorro mais rápido, atendimento mais preciso às vítimas e normalização mais rápida da situação na via. O mesmo já havia ocorrido em outras tragédias, como o desabamento ocorrido em 2012 de dois prédios no centro da cidade.

Bom, só nos resta lamentar os mortos na tragédia e cobrar as responsabilidades a quem é de direito: a Lamsa e a prestadora de serviços pelo acidente, as esferas de governo pela mobilidade diária e a fiscalização de transporte público.

(Imagens: Extra e O Dia)