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Neste sábado, está de volta após o recesso carnavalesco a coluna de contos “normais” do compositor Aloisio Villar, a “Buraco da Fechadura”.

Aconteceu no Verão 

Diego era adolescente, na faixa dos quinze anos de idade. Introvertido, com poucos amigos e mais ligado a modernidades como internet e vídeo game.

Filho de um juiz de direito, Olavo Feitosa e de Sonia Feitosa, artista plástica Diego vivia bem em uma mansão no Cosme Velho, bairro do Rio de Janeiro.

Olavo era juiz da área criminal e não tinha medo de bandidos nem de poderosos. Era considerado um juiz honesto de linha dura. Temido pelos criminosos, mas alvo de muitas ameaças também.

Sobrevivera a dois atentados, mas mesmo tendo sua vida em risco nunca quis arrumar seguranças: dizia que a população em geral não tinha o benefício da segurança particular, então não era justo que tivesse. Diego era totalmente alheio à vida do pai e seus riscos, era alheio a tudo: só queria saber de jogar e usar redes sociais.

Olavo vivia em confronto com Sonia. O casamento não ia bem e estavam prestes a se separar, mas Olavo decidiu fazer uma última tentativa e chamou esposa e filho para jantar fora.

Diego foi sem vontade nenhuma e no restaurante colocou fone no ouvido e ficou ouvindo músicas, ignorando totalmente os pais. Olavo e Sonia viviam um clima bom como há tempos não passavam. Olavo levou um presente para a esposa, um colar de brilhantes e colocou em seu pescoço. Logo depois dois homens tocando violino surgiram para abrilhantar o momento.

Combinaram tentar melhorar a vida em conjunto e salvar o casamento. Fizeram planos para uma nova lua de mel e beijaram-se apaixonadamente, como há tempos não faziam. Olavo chegou ao ouvido da esposa e convidou para continuarem a conversa em casa, no quarto: só eles.

Sonia deu um sorriso e concordou com o marido. Olavo pediu a conta e contou a Diego que ele estava livre daquele “martírio”.

Saíram, o manobrista levou o carro até eles e Olavo assumiu a direção com Sonia ao seu lado – e Diego atrás jogando no celular. Andaram alguns quarteirões e Olavo notou um carro estranho que lhes seguia.

O carro de repente passou por eles e deu uma fechada. Quatro homens desceram do veículo com fuzis na mão e metralharam o veículo, acertando muitos tiros em Olavo e Sonia – que morreram na hora. Diego foi alvejado com dois tiros e quando os bandidos se aproximaram do carro fechou os olhos, fingindo estar morto. Ainda ouviu seu pai tomar o tiro de misericórdia.      

O caso ganhou grande repercussão. Enquanto Diego estava em coma lutando pela vida a imprensa deu grande espaço para o assassinato do juiz e a polícia caçava os assassinos. Ao mesmo tempo em que a polícia prendia suspeitos, Diego saiu do coma.

A polícia esperou que ele melhorasse um pouco, ficasse mais forte e levou o rapaz para reconhecimento. Ele reconheceu a todos: entre eles estava Pablo Chacal, um perigoso contrabandista de armas que tivera seus negócios atrapalhados por Olavo. O homem contratou os outros três bandidos para junto a ele cometerem os assassinatos.

Dessa forma o habeas corpus dos quatro bandidos foi negado e eles iriam a julgamento. O homem tinha outros comparsas soltos então se chegou à conclusão que era melhor Diego “sair um pouco de circulação”, sair do Rio de Janeiro, além de que realmente precisava de um novo lar com a morte dos pais.

A solução foi Diego morar em Saquarema com sua avó, dona Margarete.

Era um mundo novo para Diego. Saquarema não é uma cidade pequena, muito pelo contrário. Na região dos Lagos do Rio de Janeiro é a cidade preferida dos surfistas graças a suas ondas, recebendo muitos turistas o ano inteiro devido às suas belezas naturais.

Mas sem dúvidas era bem diferente da capital, diferente do ambiente que Diego se acostumara. Não era uma mansão como morara com os pais, mas era uma casa bonita e confortável na beira da praia. 

Da sala podia ouvir o mar, as ondas batendo nas pedras. Seria a casa dos sonhos de muita gente – mas não de Diego.

Chegou com as malas sendo saudado pela avó e reagindo friamente. Perguntou qual era seu quarto e ela mostrou. Entrou no lugar e nem desarrumou as malas direito pegando o notebook e entrando na internet. 

Dona Margarete chamou o neto para o almoço, fez uma macarronada à bolonhesa maravilhosa, mas o neto sentou-se à mesa, deu umas colheradas rápidas e se levantou voltando para o quarto.

Isso foi assim durante alguns dias até que dona Margarete se aborreceu e entrou em seu quarto. Diego reclamou a invasão e dona Margarete irritada pegou o note. Diego revoltado mandou que a avó devolvesse e ela respondeu que só à noite. A partir daquela data ele só usaria computador ao anoitecer e teria que aproveitar o dia na rua.

Diego implorou que a avó não fizesse isso, mas dona Margarete manteve-se irredutível e mandou que ele fosse para a rua. Resignado, o rapaz não teve alternativa e foi.

Andou um pouco pela areia e sentou olhando as ondas. Sentiu saudade dos pais, de sua casa onde tinha liberdade e pensava que começaria a conhecer o inferno com sua avó, quando um rapaz de sua idade se aproximou perguntando se ele poderia guardar suas coisas enquanto surfava.  

Diego concordou e o garoto correu pro mar com a prancha, dando um show. Diego ficou impressionado e quando o garoto voltou se apresentou, chamava-se Frank.

Diego entusiasmado falava do garoto surfando e Frank rindo respondeu que já notara que ele não era dali. Uma grande amizade surgia nas areias de Saquarema e Frank convidou o novo amigo para irem a uma boate de noite.

Diego relutou um pouco, disse que teria que entrar na internet e Frank mandou que o rapaz parasse de bobagem que a vida real era muito melhor. Diego nunca tinha saído à noite para se divertir e acabou topando.

Contou para avó que iria sair e ela tomou um susto. Perguntou a Diego se tinha certeza que ele era o seu neto e o menino riu dando um beijo nela e contando que não iria chegar tarde. Encontrou Frank na porta da boate e entraram com o surfista mandando o amigo se preparar que ali era o paraíso da mulherada.

E era verdade, Diego nem sabia para onde olhar com tantas mulheres lindas no local.  Frank bem enturmado, bonitão logo chegou a um grupo de meninas e chamou o amigo para se aproximar.

Diego tímido chegou até o grupo e Frank encheu a bola do amigo contando que ele era uma fera da informática. Uma menina se interessou por Diego e começaram a bater papo. Quando foram ver já estava de porre aos beijos com a menina em um canto da boate.

Acordou na manhã seguinte na areia com uma vaca lambendo sua cara. Acordou assustado e Frank gargalhando e com uma garrafa na mão lhe deu bom dia e passou a garrafa para que ele tomasse um gole.

Diego pegou, deu o gole e rindo respondeu ao bom dia.

Chegou apenas de manhã em casa e encontrou dona Margarete preocupada. Deu um beijo na avó e perguntou “a senhora não queria que eu saísse?”. Indo direto para o quarto dormir. 

Saía todas as tardes para aprender a surfar com Frank e a noite para as boates e farras da vida. Diego era um novo garoto, mais feliz, com mais vida.

Um dia batia papo com Frank na areia quando viu chegar um carro à casa próxima. De lá viu sair uma mulher espetacular, mais ou menos vinte anos mais velha que ele e se encantou.

Perguntou a Frank quem era e ele respondeu que se chamava Ana. Mudou-se pra lá há pouco tempo e só isso que se sabia dela. Diego notou que ela tirava várias sacolas de compras do carro e Frank falou que ela precisava de ajuda.

Saiu correndo em direção à mulher com Diego correndo atrás pedindo que ele esperasse. Frank chegou nela e perguntou se precisava de ajuda. Ana respondeu que sim: eram muitas compras e o surfista logo pegou uma sacola levando para dentro.

Diego e Frank levaram as sacolas para dentro da casa da Ana, que agradeceu e perguntou se eles queriam tomar café. Os dois aceitaram e eles beberam, papearam até que ficou tarde e Frank comentou que tinham que partir.

Na saída Frank apertou a mão de Ana e comentou que esperava vê-la mais vezes, Ana simpática respondeu olhando Diego que estava sempre ali e era só aparecer. Dessa forma os meninos foram embora.  

Andando pela areia Diego comentou com o amigo que estava apaixonado e Frank rindo respondeu que Ana era mais velha, um mulherão e ele não tinha nenhuma chance. Diego concordou com o amigo, mas pediu ao menos permissão para sonhar um pouco.

Alguns dias depois Diego entrou em casa e Ana estava sentada no sofá da sala com dona Margarete. O menino sorriu com a surpresa e Ana lhe cumprimentou. Dona Margarete comentou que Ana vendia perfumes e xampus perguntando se o menino queria algum. Diego sentou com as duas e começou a olhar o catálogo, mas na verdade não tirava os olhos de Ana.

Enquanto olhava Ana comentou com dona Margarete que seu computador estava com problemas e perguntou se ela conhecia alguém que entendesse de informática. A senhora logo apontou para Diego dizendo que ele era especialista. Ana perguntou ao garoto se era verdade e o rapaz gaguejando respondeu que sim. Ela perguntou se ele poderia ir a sua casa no dia seguinte e ele concordou.

No dia seguinte Diego estava lá mexendo na máquina e Ana perguntou se ele tinha namorada. O rapaz respondeu que não e a mulher comentou que era um desperdício, pois, era um rapaz muito bonito. Diego, suando frio, terminou o conserto e perguntou se ela queria checar. Ana checou e o computador estava ótimo. Agradeceu o conserto e chamou Diego para jantar em forma de agradecimento. 

Diego tímido aceitou o convite e apareceu à noite para o jantar. Beberam vinho, conversaram bastante, riram. Diego contou sobre sua vida e disse que seus pais foram assassinados. Ana lamentou e não falou muito sobre ela, só que era separada.

Diego quis saber porque o casamento não dera certo e Ana não quis entrar muito no assunto, apenas disse que o ex era violento e estava preso.

Diego olhou o relógio e contou que tinha que ir embora. Ana levou o garoto até a porta e lhe deu um beijo no rosto pedindo que voltasse, pois não tinha amigos e ele era seu único.

E ele voltou várias vezes, com a intimidade deles aumentando. Frank reclamava que o amigo não aparecia mais, mas a verdade é que Diego estava completamente apaixonado, o que sentia nunca passara na vida e aquele amor impossível por uma mulher mais velha era o que tomava sua cabeça e seu coração vinte e quatro horas por dia.   

Uma noite Diego bateu na porta de Ana e a mulher abriu chorando. O rapaz perguntou o que a mulher tinha e ela o abraçou forte molhando o ombro de Diego com lágrimas.

Ele entrou e sentaram no sofá. Ana comentou que recebera comunicado do presídio que o ex fora assassinado, não tinham mais amor um pelo outro, anos separados, mas ela sentia porque ele tinha sido muito importante em sua vida.

Diego abraçou mais uma vez Ana e em seu ouvido ela pediu que ele nunca lhe abandonasse. Diego limpou as lágrimas da mulher e prometeu ficar sempre junto. Os dois se olharam por instantes e Ana beijou Diego.

Minutos depois estavam no quarto de Ana fazendo amor. Era a primeira vez de Diego.

Um apaixonado e feliz Diego foi acordado no dia seguinte por Ana com um beijo apaixonado e dizeres de bom dia. Diego se espreguiçou respondendo o bom dia e Ana perguntou se ele estava com fome. Diego respondeu que sim, então a mulher falou que já voltava com café na cama.

Diego colocou a cueca, se espreguiçou na cama novamente e ouviu uma voz masculina dizendo “surpresa”.

Quando abriu os olhos viu Pablo Chacal. O rapaz tomou um susto, ficou branco… Chacal riu perguntando ao menino se achava que deixaria barato mesmo a delação para a polícia. Diego estava tão encantado, vivendo tanto aquele momento com Ana que nem soube que Chacal fugira da cadeia.

Diego tentava entender aquela situação e Chacal contou que era uma armadilha. Ele descobrira que Diego estava lá e mandara sua mulher pra seduzi-lo e levar até onde ele queria. Chacal riu e chamou o garoto de idiota por acreditar que uma mulher daquelas iria se interessar por ele.

Apontou a arma para Diego e falou que era hora de morrer. Diego deu um salto sobre o bandido e os dois começaram uma luta ferrenha pela arma. No meio da luta ouviu-se um estampido e Diego caiu ferido.

Chacal ria quando Ana apareceu no quarto atirando cinco vezes no marido. Chacal caiu morto no chão. A mulher logo depois limpou a arma e jogou sobre o bandido.

Diego, agonizando, olhava Ana. Esta pediu desculpas, deu um beijo no garoto e pegou uma maleta que pertencia a Chacal.

Uma maleta com quinhentos mil dólares que o bandido escondera e levara para a casa para fugir com Ana. Mas ela resolveu fugir sozinha, deixando os dois pra trás.

Entrou no carro, botou a maleta no banco de trás e deu um beijo em Frank que lhe esperava no banco de carona. Ligou o carro e partiu.

Deixando um rastro de sangue pra trás.