Abrindo a semana, a coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro, traz a segunda coluna referente à viagem empreendida pelo colunista a Bogotá. Desta vez, porém, o tema é bem nacional: a falta de negros na advocacia, o que considero uma forma reversa de racismo.

Aliás, não é um privilégio dos causídicos: entre os economistas, classe profissional a que pertenço, o quadro é bastante parecido: negros são expressiva minoria, e mesmo entre os de pele clara a ascendência esmagadora é de origens familiares de alta renda. Meu caso, absolutamente, é uma exceção.

Ainda vou escrever um post sobre isso, mas sou totalmente a favor das cotas nas universidades e em outros locais. Apenas considero que deveria ser primordialmente por renda e, dentro desta, por raça. Contudo, voltarei ao tema quando tiver tempo para fazer a pesquisa que se impõe.

Vamos ao artigo.

A Dinastia Branca da América Latina

Como eu disse aqui na semana passada, passei uns dias em Bogotá, Colômbia. Fui lá para um congresso que acontece de dois em dois anos, uma conferência regional da América Latina de advogados que atuam em Direito Internacional. Esse nem é exatamente o meu caso, mas o congresso é relativamente barato para o que oferece, uma ampla discussão de variados temas jurídicos, com almoços e jantares incluídos. Procuro ir sempre que posso.

Ao contrário de mim e outros gatos pingados, que são só curiosos mesmo, o congresso reúne a elite da advocacia empresarial do México até a Patagônia. Só advogados bem sucedidos, metidos em causas internacionais, que não vão para lá aprender, mas sim para fazer contatos e negócios. Esse ano o congresso teve cerca de 430 inscritos. Vamos dizer que desses 430, uns 50 fossem europeus, canadenses ou norte-americanos, com algum interesse no nosso continente.

Sobram 380 latinos.

Eu vi dois negros: um senhor muito simpático e dirigente da instituição que organiza o evento e uma jovem. Ambos norte-americanos. Vi também um outro advogado com traços indianos. Era um inglês, que veio dar uma palestra sobre a influência das mídias sociais no futuro da advocacia,

Bom, estamos na América Latina, terra de gente morena, como Salma Hayek ou Juliana Paes. Vá lá que os negros faltaram ao evento, mas e os morenos? Seriam maioria? Que nada! Com muito boa vontade eu diria que tinha uns 100 morenos e ainda assim sendo generoso na conta.

Brancos, sim, eram abundantes.

Bolivianos, por exemplo. Eu nunca tinha visto tantos bolivianos brancos. Nenhum dos que vi por lá se parecia com Evo Morales. Assim como os chilenos, quase caucasianos, ninguém lembrava Marcelo Rios ou Figueroa, todos eram como Sebastian Piñera: grisalhos e com cara de rico.

Colombianos, maioria no evento, branquinhos, olhos azuis, sem qualquer semelhança com Gabriel Garcia Marquez ou Shakira (que, apesar dos cabelos tingidos, é morena).  Se pareciam todos como Alvaro Uribe. Mexicanos, eu nem sabia que no México tinha tanta gente branca. A turma que foi ao evento por certo não teria problemas ao cruzar a fronteira com os Estados Unidos, pois não despertaria qualquer suspeita de sua origem.

Dos argentinos e uruguaios eu já não esperava muito mesmo, são os países mais brancos da América do Sul, mas ainda assim nem todos são Messi ou Forlan, há também morenos como Tevez ou Cristina Kirchner. Entretanto, era diminuta a proporção de pele escura entre os platenses.

E o que dizer dos brasileiros? Uma delegação praticamente europeia, digamos assim. Olhos claros, pele alva e cabelos lisos eram os traços mais marcantes dos compatriotas – esclareço que eu também me encaixo na descrição, exceto pelos meus olhos castanhos.

Agora me digam….como pode, em um continente marcado pela miscigenação e onde a parcela branca é minoritária, que a elite da advocacia seja tão marcadamente composta pelos descendentes diretos dos europeus? É claro que esse texto nada tem de científico – é fruto somente das minhas observações, que sequer se pode afirmar serem precisas.

Apesar disso, é profundamente revelador que ao menos em um segmento muito particular da advocacia – aquele que cuida das grandes transações econômicas entre empresas globalizadas – os negros não tem vez e até mesmo os morenos tem dificuldades.

E ainda dizem por aí que as oportunidades são iguais para todos e que políticas afirmativas é que fomentam o racismo e injustiça com quem não é beneficiário delas.

Ah, tá!