Nesta quarta feira, a coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro, retoma tema abordado semana passada pelo colunista Affonso Romero e fala sobre a indústria fonográfica.
A Indústria Mais Estúpida do Mundo
Quando eu tinha 12 anos a diversão da rapaziada fissurada em música era gravar os últimos lançamentos das rádios em fitas de cromo TDK, que custavam uma grana e precisavam ser encomendadas a quem viajasse para o exterior, porque no mercado local as fitas cassetes eram Basf (acima na foto), supostamente de qualidade inferior.
A gente comprava muitos LPs, mas divertido mesmo era gravar as músicas da Rádio Cidade ou da Fluminense FM.
Quem tem menos de 40 anos pode achar difícil de acreditar, mas nem sempre existiu rádio FM no Brasil – e as primeiras que surgiram tinham uma programação mais elitizada e envelhecida. Música pop ou rock, só na virada da década de 80. Foi aí que a gente passou a gravar The Police e The Clash nas nossas fitinhas. Mas não impunemente…
As gravadoras tinham uma associação (deve ser a mesma de hoje), na época presidida pelo João Araújo, pai do Cazuza. Não passava um mês sem que ele desse uma entrevista falando cobras e lagartos das rádios FM, que ele chamava de “inimigas do disco”, ao permitir que músicas fossem copiadas com “alta qualidade”. Sua bandeira de luta era exigir que as rádios “sujassem” as músicas com vinhetas e outros sons, para impedir que os artistas falissem.
A indústria fonográfica é, de longe, o segmento mais estúpido da história do capitalismo. Eu vejo esses engravatados de hoje em dia e suas previsões catastróficas do fim da indústria da música como a versão reloaded do simpático João Araújo. Ainda haverá o dia em que as profecias deles soarão tão ridículas como a ideia canhestra do pai do Cazuza querendo enxertar sons nas canções veiculadas nas rádios em 1980.
Quem vê essa gente pregar contra a tecnologia tal e qual o operário Chapliniano de Tempos Modernos raramente se dá conta de uma obviedade: essa indústria, historicamente falando, é novíssima e só existe graças a um invento tecnológico: o disco de vinil, em 1950.
Gente vivendo profissionalmente de música existe desde tempos imemoriais. Há mais de 300 anos Johann Sebastian Bach já vivia muitíssimo bem como diretor musical de Weimar. Ou, um século depois, Antonio Salieri (injustamente elevado à condição de vilão pelo filme Amadeus) se refastelava no posto de diretor do Teatro de Viena.
É claro que a indústria musical só ganhou impulso para valer depois da Segunda Guerra. Antes não havia meios de fazer a música chegar a casa das pessoas de um jeito agradável – a alternativa, pesados discos de 78 RPM para serem ouvidos em gramofone, não despertava interesse.
Por isso não consigo entender como uma indústria que só existe por força da tecnologia – o vinil – ser tão refratária a uma tecnologia nova – o MP3. Eu sempre gostei de imaginar o seguinte cenário: quando o Napster foi criado, lá na virada do milênio, o que teria acontecido se, ao invés de chamar a polícia, a indústria tivesse se associado a Sean Parker?
Pode parecer banal para os nativos do mundo digital, mas para muita gente – muita mesmo – baixar músicas ilegalmente da Internet é algo complexo, trabalhoso e pouco atrativo. Portanto, se a indústria buscasse meios de tornar esse processo mais amigável e a um custo acessível, poderia, com relativa facilidade, controlar a oferta de música na rede.
Mas não é assim que eles agem… Napster, Kazaa, All of MP3, Limewire, Megaupload, basta alguém ter uma boa ideia para disseminar o fluxo de músicas que o povo das gravadoras vai correndo chamar a polícia. Não sei o que se passa na cabeça deles. Será que eles pensam que as gerações futuras continuarão a comprar CDs? Ou que é melhor pagar pedágio para a Apple monopolizar o comércio de músicas via ITunes?
Eu queria, sinceramente, esbarrar nos caras influentes do segmento e cutucá-los: acordem senhores, nesse exato momento há um bando de nerds inventando um programa genial em algum alojamento universitário. Corram lá, comprem o programa, enriqueçam os nerds, deixem a música circular livremente e, um dia, quando estivermos todos viciados no seu programinha, aí sim passem a cobrar.
Duvidam de mim? Então liguem para o Bill Gates. Ele não ficou milionário cobrando pelo Windows desde o início. Pelo contrário, dava o programa de presente a quem comprasse um computador dos seus parceiros e deixava todo mundo fazer cópias… Uns quinze anos depois, quando já tinha dominado o mundo, aí sim ele começou a endurecer o jogo e a cobrar o que bem entendesse.
Ou então continuem chamando a polícia. Isso costuma dar super certo. 
No Brasil, então, nem se fala.

One Reply to “Bissexta – "A Indústria Mais Estúpida do Mundo"”

Comments are closed.