Uma das notícias de maior impacto da última semana seria uma suposta intenção do Governo Dilma Rousseff de recriar a CPMF, a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira. Como anteriormente, seus recursos teriam como destinação o Sistema Único de Saúde, o SUS.
Criada originalmente em 1993 como IPMF, o imposto foi recriado em 1996 e permaneceu sendo cobrado até 2007, quando o Senado vetou sua prorrogação até o ano de 2011 – talvez naquela que foia maior derrota no Congresso Federal do então Presidente Luis Inácio Lula da Silva.
Face à reação negativa, em especial de camadas mais abastadas da sociedade, o governo negou que pretenda recriar o imposto – embora haja uma proposta já aprovada pela Câmara de Deputados e em tramitação no Senado Federal.
Entretanto, irei remar contra a maré: sou a favor de sua volta. Explico o porquê.
A CPMF, além de pelo projeto de lei propiciar recursos para a saúde possui um efeito fiscalizador muito interessante: como ele incide sobre as movimentações bancárias, o simples cruzamento de seus dados com o pagamento de impostos como o Imposto de Renda permitiria saber com bastante certeza empresas e pessoas físicas que sonegavam este imposto – e outros como ICMS e IPI.
Não é segredo para ninguém que pessoas em faixas maiores de renda e especialmente empresas se utilizam de recursos “criativos” para diminuir ou mesmo eliminar o Imposto de Renda a pagar. As empresas se utilizam de sofisticados estratagemas de elisão fiscal a fim de fazer seu “planejamento tributário” – uma expressão muito mais palatável que “sonegação” mas que na prática significa a mesma coisa.
No fim das contas, o peso do Imposto de Renda acaba se concentrando na classe média, que é descontada diretamente na fonte e não pode se utilizar deste tipo de recurso. Na prática acaba sendo um imposto bastante regressivo, pois seu peso se concentra nas classes assalariadas.
Com a CPMF a Receita Federal podia fazer o “cruzamento” de dados e verificar quem pagava impostos em um patamar incompatível em relação à sua movimentação financeira. De posse destes números podia-se buscar neutralizar estes instrumentos de elisão de impostos e cobrar o valor devido a empresas e pessoas físicas de alta renda.
Também era possível detectar algo que é proibido mas que muitos empresários fazem: moram em super casas, andam em carros caríssimos – mas declaram renda pessoal ínfima e nenhum patrimônio pessoal. Lógico, está tudo em nome da empresa.
É algo até simples neste caso: como verificar os sinais exteriores de riqueza com um patrimônio pessoal declarado inexpressivo? Pela movimentação bancária. Ter bens de uso pessoal em nome de empresas é proibido pela nossa lei. Com a CPMF este subterfúgio é facilmente detectado – não há como ter movimentação de R$ 100 mil mensais, por exemplo, declarando renda de R$ 5 mil.
Outra faceta interessante é o combate à lavagem de dinheiro. Sabe-se que organizações criminosas utilizam-se de contas de terceiros – muitas vezes sem seu conhecimento – a fim de “lavar” e “esquentar” lucros advindos de atividades ilícitas. O raciocínio é exatamente o mesmo: como o “Zé Laranja”, que muitas vezes sequer declara Imposto de Renda por ser isento possui movimentação mensal muitas vezes na casa das centenas de milhares de reais?
Eu sei que os bancos são obrigados a informar ao Banco Central as operações individuais acima de R$ 10 mil por transação. Mas se o “laranja” faz várias transações de R$ 9 mil, por exemplo, fica impossível pegar este tipo de delito – pelo menos muito mais complicado.
Curiosamente, quando a Receita Federal passou a incluir no cruzamento das informações os dados de compras em cartões de crédito a prorrogação da CPMF foi negada. Claramente houve legislação em causa própria: como explicar CPMF alta, gastos nababescos no cartão de crédito e renda ou patrimônio pessoal incompatíveis?
Ou seja, a recriação da CPMF, com uma alíquota simbólica – 0,01% talvez fosse o mais adequado – possibilitaria à Receita Federal exercer um papel fiscalizador com maior eficácia a fim de coibir a sonegação de impostos. E diminuir a carga em especial do Imposto de Renda da classe média, que é descontada na fonte e acaba ficando muito concentrada nesta parcela da população.
Poderia-se até propor que parte da CPMF descontada durante o ano possa ser deduzida na declaração anual de imposto de renda. Não sei se a legislação tributária permite este tipo de medida, mas pode ser uma forma de premiar quem paga de forma correta seus impostos.
Finalizando, não acredito que a saúde necessite dos recursos de um novo imposto. A queda da taxa básica dos juros diminuirá os recursos públicos necessários para o pagamento do serviço da dívida interna, o que abre possibilidade para a elevação dos investimentos neste setor. A função da CPMF é essencialmente fiscalizatória, não de arrecadação.

One Reply to “Sobre a CPMF”

  1. Migão, vc quer algo que controle as movimentações financeiras e não investir na saúde que seria o propósito deste imposto.

    Então que o Governo seja claro em sua proposta e não use de subterfúrgios. Diga claramente:”Queremos saber o que cada um movimenta em sua conta bancária”.

    Aí a sociedade aprovaria o “Big Brother” de butuca em sua conta ou não.

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