Uma das notícias de maior relevância no mundo esportivo nesta última semana – apesar de curiosamente não ter aparecido na maior rede de televisão do país, e com destaque apenas no principal portal de esportes do mesmo grupo – foi o escândalo referente às eleições na Fifa, a entidade que comanda com mão de ferro o futebol mundial.
Após denúncias da delegação que representava a candidatura inglesa à Copa do Mundo de 2018 surgiu um esquema de corrupção que indicaria a compra de votos por parte da Russia e do Catar, respectivamente os vencedores das disputas pelos direitos para sediar estas duas Copas.
Para os leitores saberem, a escolha dos países-sede da Copa do Mundo é realizada pelos 24 membros do Comitê Executivo da Fifa, que são representantes da diretoria da própria entidade e das confederações continentais que regulamentam e administram o futebol. Estas pessoas possuem um grande poder, ao terem voto naquela é que uma das duas principais festas esportivas do planeta- a outra são os Jogos Olímpicos.
Como o voto é secreto e transparência não é o forte desta turma, apesar dos critérios técnicos exigidos aos países que desejem sediar a competição abre-se um terreno fértil para a busca de propinas e vantagens pessoais.
Há algum tempo que vem pululando aqui e ali suspeitas de que teria havido corrupção na escolha destas sedes, mas as denúncias dos representantes ingleses acenderam um verdadeiro “pavio” em um barril de pólvora. Joseph Blatter, Presidente da Fifa – que veremos mais a frente ser suspeito em diversos outros casos – se aproveitou convenientemente do escândalo para se livrar de seu oponente nas eleições que seriam realizadas na última terça feira, o qatariano Mohammed Bin Hamman, presidente da Confederação Asiática.
O qatariano e o vice presidente da Fifa Jack Warner foram suspensos pelo “Comitê de Ética” da entidade por supostamente terem se envolvido em um caso de propina paga pelo então candidato às federações da Concacaf, no valor de US$ 40 mil. Entretanto, quase ao mesmo tempo estourou a denúncia de que Blatter teria pago uma propina de US$ 1 milhão à mesma confederação para obter seus votos nas eleições.
Complementando o quadro, o secretário geral da Fifa, Jerome Valcke, teve um e-mail divulgado por Warner onde dizia que “Bim Hammam pensa que vai comprar a eleição como fez para ser a sede de 2022”. O secretário geral disse que foi mal interpretado, mas sem dúvida alguma é mais um componente explosivo nestes escândalos.
Vale lembrar, também, que Ricardo Teixeira (Presidente da CBF) e Nicolas Leoz (Presidente da Confederação Sul Americana) foram acusados pelos representantes da candidatura inglesa de terem pedido propina para votar na Inglaterra como sede de 2018.
Mas na verdade este não é o primeiro escândalo referente à entidade que comanda o futebol mundial. A matéria que disponibilizo acima, veiculada na Rede Record último domingo faz uma espécie de “inventário” dos últimos escândalos envolvendo a entidade. A reportagem tem como base um especial da televisão inglesa BBC onde o jornalista Andrew Jennings, que há anos investiga o que se passa nos bastidores da instituição, mostra parte de suas conclusões.
Em praticamente todos os casos mostrados aparece a figura do atual Presidente da CBF, que inclusive, segundo o jornalista, teria devolvido em acordo judicial (na Suiça, lógico) propina recebida em valores estimados de R$ 10 milhões.
Vale lembrar que a CBF já foi alvo de Comissão Parlamentar de Inquérito aqui no Brasil, que tomou como ponto de partida o contrato com a fornecedora Nike para investigar uma série de denúncias (abaixo, a primeira parte de um Globo Repórter especial de 2001 sobre o tema. As demais partes podem ser vistas no Youtube). Por pressões da chamada “bancada da bola” o relatório final jamais foi aprovado, embora tenha se tornado livro posteriormente.

Não podemos nos esquecer da preparação para a Copa de 2014, com estádios claramente super dimensionados e super faturados. O país poderia perfeitamente adotar uma linha de estádios mais simples, mas optou por obras faraônicas por exigência da Fifa e de Ricardo Teixeira, principalmente. Haja visto o potencial escândalo propiciado pelo “Itaquerão” – melhor seria chamá-lo de “Malocão” – onde se vai gastar R$ 1 bilhão de dinheiro público em um estádio que posteriormente será propriedade particular do Corinthians.
Corinthians cujo presidente, aliás, é o principal aliado de Ricardo Teixeira, sendo inclusive cotado para sucedê-lo na Presidência da CBF após a Copa de 2014. Vale lembrar que Andrés Sanchez foi justamente o aliado de Teixeira na manobra que “melou” a concorrência do Clube dos 13 para os direitos televisivos entre 2012 e 2015 – que entregaram o controle total do nosso futebol à Rede Globo de Televisão.
Talvez venha daí o motivo pelo qual esta última tenha ignorado as recentes denúncias e, também, pela divulgação ter sido feita pela rede Record- que provavelmente seria a vencedora da licitação para televisão aberta. Infelizmente, hoje a notícia está subordinada aos negócios.
Tudo isto deve estar levando o leitor a pensar sobre o cotidiano de nosso futebol. Bom, não podemos nos esquecer de 2005, onde o mesmo Corinthians – que tinha uma parceria com uma empresa suspeita de ligações com a máfia russa – ganhou em uma canetada do STJD o título que perdera no campo, apesar das várias arbitragens assustadoramente parciais nas rodadas finais. Ainda há o escândalo “Edilson” naquele ano, que me parece ter sido claramente um “boi de piranha” para aquele momento. Circulam no bastidores histórias de casas de praia e correlatos sobre este episódio, mas é aquilo: provar é que são elas…
Citei um exemplo, mas com a total falta de transparência com o que o futebol é gerido – e, em tempo, o mesmo vale para o carnaval – não me parece ser um caso isolado. Mas precisa-se de uma denúncia para que se investigue o que se desconfia.
Como afirmou em entrevista a este blog o jornalista AydanoAndré Motta, “o comando do esporte mundial difere dos traficantes enxotados do Alemão apenas no corte da roupa e no preço do perfume.” Sendo mais direto, ao que parece a única diferença entre os dirigentes do futebol mundial e o traficante Fernandinho Beira Mar é que os primeiros usam terno e gravata…
Uma coisa é certa: com as fissuras no comando da instituição diria que a chance de virem à tona novos escândalos é bastante alta. Porque estes dois que estouraram recentemente são apenas a ponta do iceberg.
P.S. – Finalmente foi lançado aqui no Brasil “Jogo Sujo”, livro de Jennings que faz uma “devassa” na Fifa e mostra seus casos de corrupção. Ele pode ser comprado neste link e assim que chegar o exemplar que encomendei farei a resenha do mesmo. Também publiquei em julho do ano passado entrevista dada pelo jornalista ao”Estado de São Paulo”, que pode ser lida aqui.