Após um interregno, temos de volta a nossa coluna sobre cinema, a “Cinecasulofilia”, assinada pelo crítico de cinema, professor e cineasta Marcelo Ikeda.
O texto de hoje é sobre “Bruna Surfistinha”, filme estrelado por Deborah Secco (foto acima do filme) e que foi grande polêmica desde o livro que lhe deu origem. Como sempre, publicado em conjunto com o blog Cinecasulofilia.
 
Bruna Surfistinha
de Marcus Baldini
 
Fui assistir com interesse a Bruna Surfistinha. Filme pragmático sobre uma mulher pragmática. Filme de mercado que tenta fugir da aura de escândalo mas que se apropria dele: o politicamente incorreto politicamente correto. Hoje para se fazer dois milhões de espectadores um filme não pode ser extremamente vulgar mas ao mesmo tempo ele só pode fazer dois milhões se for extremamente vulgar. Ele tem que ser extremamente vulgar mas de uma forma que o espectador não se dê conta disso. 
 
Um equilíbrio improvável. As pornochanchadas eram aparentemente vulgares mas no fundo ingênuas: eram filmes (vários deles) que propunham uma crônica crítica de costumes, e uma leve subversão dos valores. Os blockbusters de hoje são filmes aparentemente ingênuos mas profundamente vulgares: são meros produtos ligeiros que reafirmam o mundo da futilidade, da vaidade e das aparências.

Toda a proposta de Bruna Surfistinha é tentar por termos a essa “equação”: equilibrar o vulgar com o invulgar. Tornar o vulgar palatável. 

 
Ora, mas não é disso que se trata o filme? O sucesso de Rachel Pacheco se dá exatamente por isso: por encontrar um modelo de negócio compatível com esse equilíbrio improvável. Ela não quer realizar fantasias, nem dela nem de outros: ela quer apenas se dar bem. 
 
Bruna Surfistinha, o filme, é coerente, e desenvolve cenicamente sua proposta de forma objetiva, sem atropelos, com eficiência. Extremamente vulgar na sua essência (um mero produto); mas na sua superfície falsamente vulgar. Prostituição de luxo. Não é um filme sobre o prazer ou sobre a perversão. É um filme sobre uma mulher que se prostituiu para lutar pelos seus sonhos. Mas quais são seus sonhos mesmo? Se dar bem.

Rachel não abre o blog porque tem uma necessidade íntima de se expressar, para expressar um ponto de vista sobre o mundo, mas essencialmente como instrumento de marketing para vender um produto. 

 
O que ela vende? Não importa que ela seja a mais gostosa, a mais bonita, a mais sacana. Ela encontrou um “modelo de negócio”, ela fez parte da “economia criativa”. Um modelo de negócio cheio de “formatos inovadores”, utilizando a “cultura da convergência” e os “nichos de mercado”. Mais que o seu corpo, Surfistinha vende sua imagem. Ou seja, Bruna Surfistinha é uma empreendedora do novo milênio.

Bruna Surfistinha é um filme sobre o cinema brasileiro. Pura metalinguagem. Surfistinha é uma cineasta: antiga, nova, novíssima. A forma direta (frontal) com que Marcus Baldini encena essa mistura de oportunidade e oportunismo é desconcertante. Bruna Surfistinha é um filme sobre o Brasil. Não é cínico. É simplesmente pragmático.”

One Reply to “Cinecasulofilia – "Bruna Surfistinha"”

  1. A construção do sonho
    Não acontece sem pisar em vidro
    E encher o chão de sangue

    Para não sofrer
    Esquecem do sonho
    E da rotina se aquecem

    O sonho custa o preço da dor
    Mas sem sonho
    O indivíduo
    Não acontece

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