De volta após interregno para férias de seu titular, a coluna “Bissexta”, do advogado Walter Monteiro, advoga a questão do envelhecimento natural do ser humano e situações decorrentes da não-aceitação deste caso.
Vamos ao texto.
“Forever Young
Eu fui ao cinema sábado passado. Cinema é algo que me intriga. Segundo informações deles próprios, cerca de um terço da receita dos cinemas vem da bomboniére. E é incrível como eles se esmeram em prestar um serviço capaz de irritar um monge budista. A fila para comprar guloseimas supera em muito a fila dos ingressos. Sem nada melhor para me distrair, me pus a observar os colegas de espera.
 
Logo na minha frente, uma moça sozinha. Um cabelo bonito, longo, com mechas douradas. Um vestido preto curto, de um tecido molinho. Uma sandália alta e alguns adereços ripongas. Quando ela se virou em busca de seu acompanhante, tomei um susto. De costas, eu jurava que ela teria no máximo 25 anos, só que o rosto, maltratado por anos de exposição ao sol, mostrava que ela por certo já tinha idade para candidatar-se à Presidência da República. 
De repente, seu acompanhante chegou. Com um boné. Homem de boné, à noite, em geral significa uma coisa: calvície profunda, no caso disfarçada por um chapéu com uma caveira na frente e a inscrição “muerte”, em escrita imitando grafitti – ainda assim, o cabelo cortado rente deixava escapar muitos fios grisalhos. O rapaz usava um tênis de skatista, decorado em branco e preto, uma camiseta (hoje em dia se diz tee) negra com uns desenhos enormes e uma calça cinza, também no estilo SK8.  A única coisa fora de lugar é que debaixo daquele traje infanto-juvenil habitava um cidadão de mais de 40 anos.
 
Continuei a olhar. Na fila ao lado, um homem, de calça jeans justa clara, calçando um Croc azul e vestindo uma blusa apertadíssima, para realçar a boa forma física, com a inscrição “Harlem” em letras garrafais. A pele, bronzeadíssima no conhecido tom laranja “umpa lumpa”, que as pessoas insistem em achar bonito no verão. Os cabelos e a barba rala inteiramente brancos, não havia nenhum resquício da cor que um dia tiveram. Esse senhor por certo não paga mais passagem de ônibus (ou ao menos está em via de gozar o benefício), mas se veste igualzinho a alguém que poderia ser seu neto.
 
Ninguém mais usa sapatos. Há uns dez anos fui barrado em uma boate em Salvador (em Salvador!) porque estava de tênis. Hoje, se eu saísse de sapatos (ok, eu também não uso sapatos) seria um ET. Mulheres quarentonas e cinquentonas acham sensacional usarem as mesmas roupas das filhas, terem o mesmo corte de cabelo, se iludirem com a crença de que se parecem irmãs. Homens fazem o mesmo com seus filhos, às vezes até saem juntos para a caça noturna. Isso não pode fazer bem à cabeça desses pirralhos.
 
A minha geração, é fato, sofre muito com o envelhecimento. Quando eu era criança/adolescente, nos cafonérrimos anos 80, a divisão de espaços entre filhos, pais e avós era muito bem demarcada. As pessoas envelheciam e nem por isso se amarguravam. 
Mas um mundo em que Mick Jagger, Paul McCartney, Gilberto Gil e Rita Lee são idosos realmente é diferente do que nos acostumamos a ver quando crianças e torna tudo um pouco mais nebuloso.
 
Nem por isso há de nos faltar um pouco de bom senso. Seremos todos mais felizes quando entendermos que não há mal algum em aparentar a idade biológica que de fato ostentamos no RG. A compreensão de que aos 40 anos não dá para sair de noite vestido como um garoto de 15 anos que brinca de skate no playground do prédio é o primeiro passo para evitar o ridículo de ser um pastiche risível do adolescente que um dia fomos. Maturidade faz bem à alma, acreditem.”