Para mais um domingo de bons textos, repercuto aqui texto escrito pelo jornalista Leandro Fortes (Carta Capital) em seu blog “Brasília, Eu Vi”.

O artigo conta a história real da “Operação Lunus”, tramada pelo PSDB para desmontar a candidatura presidencial de Roseana Sarney às eleições de 2002. Nos últimos dias circulou uma versão requentada pela grande imprensa serrista dando conta de que o episódio era de responsabilidade da equipe petista de então.

Vamos ao texto, escrito por quem, à época, participou da apuração dos fatos.

“Seria apenas risível, não fosse, antes de tudo, muito grave, o surgimento de uma nova e alucinada versão sobre a operação da Polícia Federal, deflagrada em março de 2002, que resultou na apreensão de 1,3 milhão de reais na sede da construtora Lunus, em São Luís, no Maranhão. A empresa, de propriedade da governadora Roseana Sarney (PMDB) e do marido dela, Jorge Murad, tornou-se o epicentro de uma crise política que modificou os rumos da campanha eleitoral de 2002, justamente quando a direita brasileira parecia capaz de emplacar, finalmente, um candidato puro-sangue com real chance de chegar à Presidência da República. Na época, Roseana Sarney era do PFL, atual DEM, e resplandecia numa eficiente campanha de mídia como exemplo de mulher corajosa, determinada e, sobretudo, competente. Resguardada pelo poder do pai, o senador José Sarney (PMDB-AP), e pela aliança pefelista que sustentava o governo Fernando Henrique Cardoso, Roseana sonhou, de fato, em tornar-se a candidata da situação contra Luiz Inácio Lula da Silva.

O desejo da família Sarney de retornar ao Palácio do Planalto revelava, em primeiro plano, o absoluto descolamento da realidade de um clã provinciano e truculento, incapaz de perceber o mundo além das fronteiras do Maranhão. Por outro lado, revelava, ainda, total desconhecimento dos métodos e da sanha de seu verdadeiro adversário, o tucano José Serra, empenhado em ser candidato pelo PSDB a qualquer custo. Serra, ao contrário de Roseana, tinha montado uma máquina de moer inimigos a partir de um “núcleo de inteligência” instalado na antiga Central de Medicamentos (CEME) do Ministério da Saúde, comandada pelo delegado da PF Marcelo Itagiba, atual deputado federal pelo PSDB. Itagiba, no entanto, era apenas o ponto de contato entre Serra a direção-geral da corporação, então nas mãos de outro tucano, o delegado Agílio Monteiro Filho, que chegou a se candidatar, sem sucesso, à Câmara dos Deputados, em 2002, também pelo PSDB. Em 2007, o delegado foi nomeado ouvidor-geral adjunto do Estado de Minas Gerais, uma espécie de ombudsman paroquial, pelo governador Aécio Neves. Um prêmio de consolação, convenhamos, para lá de meia-boca.

Agílio Monteiro Filho comandou de longe uma operação montada em bases políticas, dentro do Palácio do Planalto, com o aval do presidente Fernando Henrique e de seu candidato à sucessão, José Serra. Imputar esse fato ao PT e, mais incrivelmente, a Lula, quase uma década depois do ocorrido, só se justifica pela insana caminhada de parte da mídia ao precipício, onde também se pretende jogar a memória nacional e a inteligência alheia, para ficarmos em termos brandos. O depoimento do tal sindicalista Wagner Cinchetto à revista Veja, como parte da série “grandes entrevistas de dedos-duros do mundo sindical”, tem a pretensão de transformar fatos concretos e apurados numa versão aloprada baseada, unicamente, nos valores invertidos do mundo bizarro em que se transformou boa parte da imprensa brasileira. Trata-se de caso explícito de abandono completo da regras básicas do jornalismo, mesmo a mais primária, a de pesquisar, com um google que seja, aquilo que já foi escrito a respeito.

Digo isso porque, quando da deflagração da Operação Lunus, eu era repórter do Jornal do Brasil, em Brasília, e fui destacado para descobrir os bastidores daquela sensacional ação policial que, inusitadamente, havia sido comemorada tanto pelo Palácio do Planalto como pela oposição petista. Eu tinha boas fontes na Polícia Federal, tanto em Brasília como no Maranhão, e desde as primeiras horas da notícia fui alertado de que, embora a grana dos Sarney fosse mesmo suja, a operação da PF tinha sido armada para detonar Roseana Sarney. Outro que foi avisado cedo sobre o assunto foi o próprio José Sarney. Furibundo, o chefe do clã iniciou um movimento político que resultou em uma de suas raras dissidências governistas e em um ódio paternal profundo pela figura de José Serra.

Na ponta da Operação Lunus estava o delegado Paulo Tarso de Oliveira Gomes, atual adido policial nos Estados Unidos, nomeado pelo diretor-geral da PF, delegado Luiz Fernando Corrêa, imagina-se, por bons serviços prestados à corporação. Gomes era um homem de confiança de Agílio Monteiro Filho e, portanto, do PSDB. A chance de haver alguma ligação dele com o PT ou Lula é a mesma de Marcelo Itagiba se tornar ministro da Justiça em um eventual governo Dilma Rousseff. Ou seja, zero. Jamais houve, contudo, o tal telefonema para o Palácio do Planalto feito por Gomes para avisar FHC do sucesso da empreitada. O delegado Paulo Tarso Gomes enviou, isso sim, de dentro do escritório da Lunus, um fax para o Palácio da Alvorada, à noite, onde o presidente Fernando Henrique, ansioso e de pijamas, aguardava notícias sobre a ação. O texto anunciava a missão cumprida. Foi uma matéria minha, no JB de 2 de março de 2002, que revelou a armação.

Eu soube do fax porque, à época, consegui acessar os dados da companhia telefônica do Maranhão e me deparei com o grau de amadorismo da ação. Incrivelmente, o delegado-chefe da operação, no afã de mostrar serviço, nem esperou voltar para o hotel em São Luís para dar as boas novas a FHC: passou um fax de dentro da empresa investigada! Os números, tanto do telefone da Lunus, como do Palácio da Alvorada, foram registrados pela telefônica e, um dia depois, também foram estampados pelo Jornal do Brasil, a tempo de desmentir uma versão montada às pressas, na assessoria de imprensa da PF, que chegou a apresentar um fax falso para evitar a desmoralização da operação. Tudo isso poderia ter sido checado, sobretudo na Editora Abril, haja vista que o editor-chefe do jornal, que participou diretamente da edição das matérias, era o jornalista Augusto Nunes, atualmente, um dos colunistas da revista Veja.

Mais uma coisinha que ninguém se lembra de falar quando se trata da Operação Lunus: embora tenha sido um sucesso político para os tucanos, foi um fracasso total para a Polícia Federal. Um ano depois, o Supremo Tribunal Federal (STF) arquivou, por falta de provas, o processo contra Roseana Sarney decorrente da ação da PF.

No fim das contas, o neoarrependido Wagner Cinchetto nada mais é o do que um dos cachorros loucos liberados pela mídia neste agosto eleitoral. Ao imputar a Lula e ao PT a tucaníssima Operação Lunus, o sindicalista conseguiu apenas consolidar essa impressão terrível, que cresce com a proximidade das eleições, de que os ventos da derrota não trazem, definitivamente, bons conselhos aos candidatos.”

4 Replies to “Operação Lunus”

  1. Pedro, você leu a reportagem? A operação pode ter contado com um petista infiltrado, como o texto diz. Mas dizer que a operação foi inputada como sendo só do PT, é uma estupidez completa!

    Textualmente na reportagem: “(…)o nosso grupo sabia da operação, sabia dos prováveis resultados, torcia por eles e interveio para que aparecessem no caso apenas as impressões digitais dos tucanos.” Em algum momento ele diz que atribuiu a culpa aos tucanos, mas que deixou “apenas as impressões digitais dos tucanos”, ou seja, porque os tucanos já estavam por trás da operação e eles deixaram que ela ocorresse, pois se beneficiaram dela.

    Complementando: “(…)soubemos que a candidatura da Roseana seria destruída com uns três dias de antecedência. Houve muita festa quando isso aconteceu.” Dada a presença do PT em todos os níveis da administração pública desde a década de 1990, não seria possível acontecer?

    Minha namorada tem que se tratar até hoje por conta de petistas corruptos infiltrados na administração pública cometendo desvios “em nome do partido” que a isolaram e a enlouqueceram até que ela se deprimisse e fosse forçada a se aposentar. É esse tipo de gente que você quer manter no poder e que eu quero afastar. Mesmo sabendo que as outras opções são tão ruins quanto. Mas sabendo do que o PT é capaz.

    Por isso, como amigo, espero sinceramente que você se beneficie desta sua fidelidade canina. Porque por opinião ideológica, é pura burrice.

  2. Bruno, entendo a sua história pessoal, mas a minha opção é ideológica sim. Há muito tempo, desde 1994…

    Quanto à Operação lunus, o pT se beneficou dela, mas não teve nada a ver com a história. abs

  3. Pois é, então você se cegou por necessidade.

    Necessidade de manter seu emprego, porque acha que outros governos vão tomá-lo.

    Por achar que suprir as necessidades momentâneas da população são suficientes para que eles possam ter uma vida de qualidade ao invés de dar-lhes oportunidades de viver mais e melhor. Com conhecimento, com um trabalho ou com oportunidades para crescer. Eu vejo uma cidade no interior nordestino chamada Santa Cruz do Capibaribe, de onde minha mãe veio e onde meu avô estabeleceu pequeno comércio durante um tempo, crescer não porque o governo investiu dinheiro. Mas porque gente da região acreditou em suas capacidades e prosperou levando junto outras cidades vizinhas também no ramo da confecção.

    Por fechar os olhos para a corrupção que receberá a aprovação máxima nesta eleição e, com isso, ficará cada vez mais encrustrada na mente dos brasileiros de que, sim, o crime compensa. De que existem cidadãos que merecem tratamento especial.

    Por achar que por um governo que se diz “esquerda”, mas na verdade é um governo populista e que deseja enveredar pelo caminho da auto-louvação e do tratamento da população como imbecis, como demonstrado em Honduras, Venezuela e Argentina.

    Por causa disso, eu tenho vergonha de termos tido uma educação que nos permite questionar estas coisas e você simplesmente as aceita, sem levar em conta que temos um custo altíssimo por dois fatores chamados de DESONESTIDADE e GESTÃO TEMERÁRIA. São eles que precisamos combater. Em qualquer governo. Pois é por causa deles que nos fazem pagar este custo absurdo em impostos, ocultos da população em geral do qual ela prefere não ter noção e que, no final, somos nós mesmos que pagamos quando comemos ou bebemos. Afinal, você quer degustar boas cervejas, ou só as que o governo determinar?

    Queremos ter luz, água, gás, telefone e TV a cabo de graça, mas ninguém pensa que pagar por esses serviços, mesmo que haja um empresário ávido por lucro por trás deles, faz com que milhares ou milhões tenham um trabalho por causa destes serviços. Ninguém pensa nisso.

    Há uma engrenagem oculta por trás sim. Mas o que o estado precisa fazer é permitir que as oportunidades apareçam para todos de entrar nestas engrenagens. Pela seleção natural de Darwin, só os mais aptos sobreviverão. Mas não podemos ser uma cleptocracia que permite oportunidades apenas ao filho do presidente e seus amigos ou a um anão ganhar 300 vezes na loteria. Hoje o estado está tomando um papel de tal forma que acabará com as oportunidades e o interesse no país e a bonança vai terminar.

    As cigarras estão cantando e as formigas estão morrendo. Você está defendendo uma melhoria momentânea. Eu quero a melhoria definitiva. E vou ser do contra, enquanto não me demonstrarem que ela está a caminho. Só espero que, no caminho, não tenhamos de ficar em campos opostos. Eu defendendo a liberdade de expressão e, você, seu emprego. O problema é que hoje, para os atuais candiatos, só a mamata interessa.

    “Você sabe o que um deputado federal faz? Vote em mim que eu te digo!” (Tiririca)

  4. Bruno, acho que a sua avaliação possui alguns equívocos.

    Eu não “fechei os olhos” ou apóio Dilma por “carreirismo”. Como escrevi em outras ocasiões, a economia melhorou e eu não quero de volta um projeto elitista e subserviente de poder.

    em que pesem os problemas que o país tem, hoje um pobre tem muito mais chance de ascender na vida que nos anos do tucanato.

    entendo que a sua experiência pessoal com o governo atual seja negativa, mas fique claro que minha adesão não é cega. A política é a arte do possível e, em minha opinião, a proposta de governo atual é o melhor “possível” que pdoemos ter.

    abraços

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