Domingo, dia de bons textos publicados na chamada “blogosfera” e reproduzidos aqui.
Hoje transcrevo artigo do jornalista Lúcio de Castro, em seu blog na homepage da ESPN – link à direita  aqui mesmo no blog – com uma análise muito interessante dos movimentos periféricos à recente eleição do Clube dos Treze.
Obviamente, a foto de Al Capone é para “abençoar” os nossos cartolas…
“Dentro das quatro linhas o futebol brasileiro insiste em renovar nossas esperanças, paixões e alegrias. Quando alguém imagina que a fábrica secou, surge um Neymar e restitui a velha chama que faz esse jogo ser parte da nossa identidade, que faz nos enxergarmos no moleque magrelo que pode ludibriar com ginga e malícia o grandalhão. Mas os últimos acontecimentos fora dos campos não podem passar em branco. Tampouco serem dissociados um dos outros. E muito menos serem encarados e analisados isoladamente.

Vamos aos fatos das últimas semanas e veremos que os acontecimentos não podem ser isolados e dizem muita coisa. E apontam preocupantemente para a queda dos últimos resquícios de preocupação com a lei, a normalidade e qualquer possibilidade de que ilegalidades venham a ser combatidas e punidas.

Pois então vejamos: não foi normal o ritmos dos acontecimentos, que se sucederam alucinadamente. Vamos a eles, usando como recorte de tempo os momentos do ataque final da candidatura de Kléber Leite no Clube dos 13 para cá.

No dia 23 de março, contei nesse espaço sobre a articulação que unia a Santíssima Trindade: Ricardo Teixeira, Kléber Leite, e Rede Globo/Globo Esportes a abençoar a união como detentora dos direitos de transmissão do campeonato brasileiro. Uma união para tomar o poder do Clube dos 13, com tudo o que isso implica em termos de poder sobre os clubes e direitos de transmissão já referidos.

Tomemos essa data como largada então. De lá pra cá, o que vimos foi uma série de acordos nas trevas para mudança de votos, empréstimos, promessas, traições. O desdobramento disso tudo se deu em ritmo alucinante, não perca o fôlego: vinganças, retaliações, notícias vazadas como instrumento de pressão, ameaças. Coincidentemente, ao mesmo tempo em que o São Paulo confirmava o seu voto para Fábio Koff no C13, a Fifa (!) descartava o Morumbi da Copa do Mundo em definitivo (!?…,assim, como todas as pontuações que a afirmação pede). E a notícia vazava estrategicamente.

Mais dois dias, e foi a vez do Flamengo ver uma questão insuportável, que se arrasta há anos e não tem o menor sentido, se voltar contra ele. O Flamengo que através da presidenta Patrícia Amorim votou contra a Santíssima Trindade. E o corintiano Andres Sanchez, em cima dos acontecimentos, fiel escudeiro, foi anunciado chefe da delegação na Copa. Muita coisa em tão pouco tempo…Ainda veremos aqui onde isso tudo pode dar ou não dar. Mas antes vale a pena refletir sobre o modus operandi que moveu todas essas ações.

Retaliações, vinganças, casuísmos ao arrepio da lei, execuções de ações ao sabor de vontades próprias são características que apontam para um único caminho, que olhar para o passado nos faz enxergar: o despotismo, o absolutismo. E mais do que isso: todo déspota, com o andar da carruagem de seu tempo no poder, torna-se cada vez mais capaz de tomar as atitudes mais sem sentido, mais bizarras, mais ao arrepio da lei. Como ninguém o contraria, e todos os mecanismos de controle estão aos seus pés, seguidamente bota esses pés pelas mãos. Seu prazer começa a ser mostrar que pode fazer o que quiser. Sempre com alguém a cortejar e aplaudir.

É por isso tudo que chego aqui: os últimos acontecimentos não podem ser levados como mais alguns de tantos do futebol brasileiro. A incrível sequencia, em tão pouco tempo, de gestos tão significativos, envolvendo a vida de tanta gente (a maior cidade do país; a maior torcida do país), mostram que já chegamos a esse ponto de total piração, quase aquele em que Nero botou fogo em Roma.

E são estes últimos gestos que apontam para algo mais preocupante: o que vem por aí? Com Copa do Mundo de 2014 no radar, poder total na mão de quem tem acendido o fósforo e dado gargalhadas, o que vem por aí?

Isso é ainda mais grave. Não sou um cientista político, não me arriscaria em análise maior, mas acho que já é hora de demais setores da sociedade e não só nós nos debates esportivos, espicharem o olhar para o que está acontecendo fora dos campos em nosso futebol. Pois se a jovem democracia brasileira (apesar de seguir vacilante e frouxa quanto ao seu dever de investigar os criminosos da ditadura), apesar dos pesares, mostra seguidamente sua solidez e a maturidade das suas instituições, parece que estamos vendo surgir um estado dentro do estado. Um estado chamado futebol, onde tudo é possível, e onde essas instituições republicanas não conseguem penetrar, permitindo tal absolutismo.

No estado chamado futebol, não conseguem penetrar ou são cooptados boa parte do judiciário, do legislativo, e mais ainda o executivo. Mesmo instituições que tanto nos orgulham tantas vezes como Polícia Federal e Ministérios Públicos parecem longe desse reino chamado futebol e seu rei.

Para completar o quadro que parece botar nossa sólida democracia em xeque, entra a outra ponta disso tudo, a que sempre tem papel preponderante como oposição aos absolutismos: a imprensa livre. Pois se as duras penas a geração anterior conquistou e solidificou a imprensa livre e combativa, no reino do futebol e estado paralelo isso ainda vai longe. Com direitos de transmissão tão polpudos em jogo, não me falem no Granma, no Diário de Pyonyang ou nas TVs de Hugo Chaves. Quando o assunto é o estado paralelo do futebol, não ficamos longe de nenhum deles e sua chapa-branca de uma maneira geral, e por quem tem maior penetração e força.

Então, é ou não é um estado paralelo ao da democracia brasileira, e onde nossas instituições tão saudáveis não conseguem entrar? Nos próximos dias, Copa chegando, teremos certamente aquela matéria de todas as Copas: “juízes viajam como convidados da CBF”. É só aguardar, aceito apostas para ver quando vai sair. (Em geral é do mesmo autor: meu amigo e ídolo Chico Otávio, mestre dos mestres dos repórteres de minha geração. Dou o resto e aceito as apostas!).

Tudo é muito grave. E enquanto alguns seguem achando bonitinho discutir quem é o dono das bolinhas, o bicho tá pegando nas trevas do estado paralelo do futebol. Os últimos acontecimentos, a serem vistos em bloco, não deixam dúvida.

O outro lado disso tudo é o seguinte: todo império tem seu fim. Geralmente é quando os déspotas piram e se acham maiores que Deus, ou o próprio. Aconteceu algo bem significativo nessas eleições: um racha com forças maiores por trás. Como bem disse João Palomino esta semana, a tendência é que as coisas se realinhem, e tudo fique como está no estado paralelo. Mas pode ser que não… E pela primeira vez surge isso no fim do túnel.

E sabem o que pode significar o não realinhamento de Koff com a Santíssima Trindade? Renegociação de direitos de transmissão. Se a centelha for acesa, vai dar uma explosão nuclear no futebol, uma tsunami, com novas configurações para esse estado até aqui paralelo. O Bispo tá com a sacola cheia de verdes esperando o caldeirão ferver…E aí, amigo, é como uma revolução quando explode: as coisas vão perdendo a lógica, tudo pode acontecer.

O aliado de ontem vira inimigo do rei, aqueles programas com matérias investigativas de casarão em Angra e Miami voltam a ser feitos, xiiii…A ver…

De qualquer forma, os últimos dias do futebol brasileiro não podem passar em branco sem outras análises mais aprofundadas. Um terremoto pode estar no horizonte. Pode não acontecer nada, mas na dúvida, consultem o Chico Buarque. Aquele que já manifestou a necessidade de um “Ministério do Vai dar Merda”, pra que alguém avise a iminência da tsunami com alguma antecedência.”