Nas últimas semanas a campanha presidencial vem girando em torno de um tema palpitante e que, embora não pareça, está ligado diretamente à nossa vida cotidiana: a exploração do petróleo da camada pré sal e o papel da Petrobras.

As coordenações de campanha dos candidatos Aécio Neves e Marina Silva vem dando reiteradas declarações não somente  no sentido de mudar o modelo de exploração do pré sal como privilegiar as empresas estrangeiras na exploração, alijando ou diminuindo o papel da Petrobras no processo. Talvez seja coincidência, mas nas últimas semanas estamos assistindo a uma intensa campanha de órgãos de imprensa e políticos no sentido de incutir na opinião pública a ideia de que a empresa “é um antro de corrupção” e que seus empregados “são vagabundos, corruptos e ladrões” – mas esta campanha é tema para outro artigo.

Existem no mundo três formas de exploração de petróleo: o modelo de concessão, a partilha de produção e o monopólio:

A general view shows the Saudi Aramco oi1) Monopólio: existente em vários dos grandes produtores (Arábia Saudita, Irã, Venezuela), onde o Estado detém o monopólio da extração e do refino do petróleo. Normalmente, há uma empresa estatal que é a operadora deste monopólio.

À guisa de exemplo, a Saudi Aramco, a maior empresa de petróleo do mundo, é a estatal da Arábia Saudita, país que detém as maiores reservas provadas do mundo.

2) Contratos de Concessão: modelo adotado no Brasil até 2010 de forma total e ainda hoje em determinados contratos/blocos, é utilizado em países que não sejam exportadores expressivos de petróleo. Leiloam-se áreas de exploração (os “blocos”), e as empresas vencedoras ganham o direito de explorar aquela área por determinado período.

Se não encontrarem petróleo ou gás natural, podem devolver as áreas, mas não recuperam o investimento. Caso encontrem, possuem a propriedade do óleo e do gás encontrados, pagando ao Estado as taxas determinadas.

No Brasil, hoje, o modelo é este para os campos licitados antes da mudança de legislação. As empresas concessionárias pagam royalties às cidades e estados pelo uso do território das mesmas e a “Participação Especial” à União, que pode ser definida como um “pedágio” pago pela empresa para poder vender livremente o óleo prospectado, encontrado e extraído.

pre-sal3) Partilha de Produção: utilizado em países exportadores como a Noruega e também modelo adotado no Brasil atualmente, é o seguinte: o Estado contrata – através de licitação ou não – empresas para explorar e extrair óleo e gás a seu serviço, e remunera a operadora através de percentagem do petróleo extraído. A área prospectada não pertence às empresas, que, na prática, prestam um serviço ao Estado e são remunerados em petróleo por este.

No caso brasileiro, a Lei 12.351, de 22 de dezembro de 2010, instituiu a partilha de produção como modelo exploratório do pré sal, bem como instituiu a Petrobras como operadora única destes campos e criou uma estatal administradora destes campos. A mudança do marco regulatório se fazia necessária porque o índice de sucesso nas perfurações de poços de petróleo nesta camada é superior a 80%, o que diminui expressivamente o componente de risco envolvido na atividade.

Além disso, a lei determinou que a Petrobras recebesse alguns campos para desenvolvimento e exploração, na chamada “cessão onerosa”. Nos demais campos, a estatal brasileira teria ao menos 30% dos campos, sendo a operadora determinada por lei. Outras empresas poderiam ser sócias, mas não irão operar os campos.

Também determinou a criação do “fundo social”, que originalmente previa aplicações no exterior a fim de mitigar a “doença holandesa”. Originalmente o fundo previa aplicações futuras em diversos campos, como educação, saúde e esporte; em 2013 a legislação foi alterada (abaixo) e 50% dos recursos decorrentes deste fundo necessariamente deverão ser aplicados na educação.

Brazil's former president da Silva gives the thumbs-up during a demonstration in Rio de JaneiroEm 2013 também, a lei 12.858 alterou a destinação dos royalties e da participação especial de todos os campos cuja declaração de comercialidade – instrumento jurídico que determina a viabilidade comercial de um poço – tenha ocorrido após 3 de dezembro de 2012, destinando 75% dos recursos à educação e os 25% restantes à saúde. Na prática, como não houve mais leilões significativos sob o regime de concessão – mantido para as áreas “não pré sal” – esta mudança na legislação afeta os campos da camada pré sal.

Vale lembrar que estados e municípios terão de contar com “destinação livre” apenas a parcela de royalties decorrentes de poços anteriores a esta data, muitos maduros e já em produção declinante. Mas também é tema para outro artigo.

Recapitulando, hoje a Petrobras é operadora única da camada pré sal sob o regime de partilha de produção (há alguns campos mais antigos ainda sob o modelo anterior) e tanto os royalties como a participação especial são integralmente revertidos na melhoria da educação e da saúde. Hoje o pré sal produz cerca de 500 mil barris/dia, se constituindo em contrabalanço à produção dos campos maduros da Bacia de Campos.

Além disso, a política de compras nacionais e percentual mínimo de produção nacional determinada impulsiona toda uma cadeia produtiva aqui no Brasil, gerando empregos e toda uma cadeia produtiva dinamizadora da economia. Especialmente no Rio de Janeiro, cuja economia é bastante dependente do petróleo, esta política se fez sentir de forma sensível.

DSC01877E o que propõe a oposição?

Grosso modo, retornar ao modelo de concessão, o que significa revogar as Leis 12.351/2010 e 12.858/2013. Além disso, tirar a Petrobras do pré sal a fim de abrir espaço para as empresas estrangeiras explorarem esta camada e, nas palavras dos assessores econômicos dos candidatos, “estimular o ambiente de negócios do país”.

Na prática, com a revogação das leis boa parte dos royalties destinados à educação e a saúde irá se transformar em dividendos para acionistas em locais como Houston e Amsterdam. Ou seja, a apropriação da renda do pré sal sairia da melhoria da saúde e da educação brasileiras para engordar lucros de acionistas fora do Brasil.

Além disso o coordenador da campanha de Marina Silva, Walter Feldmann, afirmou que a política de incentivo às compras no país deverá ser abandonada em busca de “eficiência”. Hoje, a indústria do petróleo tem de comprar ao menos 60% dos componentes necessários no Brasil. Traduzindo: com esta mudança, o petróleo brasileiro poderá gerar empregos em Cingapura, nos Estados Unidos, na Holanda, no México ou em Tuvalu, enquanto gera desemprego no Brasil.

monteiro lobatoDestarte, retirar ou ainda diminuir a presença da Petrobras na exploração do pré sal significa reduzir o papel da companhia, por um lado, e a possibilidade de desemprego de técnicos altamente especializados, formados internamente durante anos de estudos e pesquisas. Ou seja, é uma ótima estratégia se o objetivo é vender a Petrobras no futuro.

Note o leitor que, adicionalmente, Aécio Neves tem insinuado em entrevistas recentes que pretende trazer técnicos estrangeiros para gerir a Petrobras. Ou seja, pode-se resumir a estratégia da oposição em privilegiar as empresas multinacionais na exploração do petróleo e depletar a Petrobras para uma posterior venda.

Além disso, a volta ao sistema de concessão, nas bases estabelecidas atualmente, significa transformar o que seriam recursos capazes de transformar a educação e a saúde no Brasil em remuneração a acionistas fora do país e a gastos muitas vezes sem controle em estados e municípios.

Tudo depende de 5 de outubro.