Não quero lhe falar, meu grande amor, das coisas ruins que vêm ocorrendo pelo mundo ultimamente, mas não está fácil, infelizmente não tem como evitar. Deram graças a Deus quando acabou 2016, esquecendo que o problema não está em datas, está com a gente.
Viver é melhor do que sonhar? Talvez sim, apesar de eu ser um cara que sonha demais. Sonho, por exemplo, que de fato percebam que o amor é uma coisa boa porque anda faltando amor. Um mundo intolerante onde ódio e a falta de compaixão ganham proporções inimagináveis enquanto marchamos para dentro do século XXI e o futuro nos apresenta o atraso. Falta de respeito com a opção alheia seja política, esportiva, religiosa ou sexual. Tudo é motivo para a barbárie, a violência e não conseguimos aprender que opinião é diferente de opressão e a partir do momento em que não deixamos alguém ser feliz como deseja é opressão. O modo de pensarmos é sim menor que a vida de qualquer pessoa.
Por isso cuidado, meu bem, há perigo na esquina. Da esquina da alegria onde corações disparam e sonhos se realizam pode vir um carro alegórico desgovernado ceifando vidas e fazendo da folia uma tragédia. O que resta? A dor de quem ficou e perdeu o amor, o ente querido, a amiga carinhosa. Isso tudo nos dá indignação porque sabemos que o máximo que irá ocorrer é que a Liza Carioca tenha seu nome em algum espaço na Sapucaí, mas é uma indignação silenciosa, de medo de perder vaga em camarote ou credencial. O mundo do samba parece um mundo a parte com leis a parte onde fazem de tudo e assistimos quietos. Eles venceram e o sinal está fechado para nós que somos apenas sambistas.
Para abraçar meu irmão e beijar minha menina na rua é que se fez o meu lábio, o meu braço e minha voz. A mesma voz que depois reza baixinho para que meu irmão e minha menina voltem da rua sãos e salvos porque passou a fase de festa e o Rio de Janeiro voltou a ser a capital da violência. Sua parte maravilhosa se apagou com a chama olímpica. Tiros, arrastões, assaltos, assassinatos em um estado falido que não paga a quem deve e quase todo o governo mentor desse se encontra na cadeia. Você me pergunta pela UPP, digo que estou desencantado com essa invenção do governo Cabral. Infelizmente apenas foi para enxugar gelo, um grande acordo que findou.
Vou ficar nessa cidade, não vou voltar para o sertão até porque agora querem aprovar um projeto em que em vez de salário os trabalhadores da terra recebam moradia e alimentação. Teve uma época que foi assim, mas acabou quando surgiu a Lei Áurea. Eu sinto tudo na ferida viva do meu coração, vejo o Brasil em uma lama cada vez maior com políticos delatados e juízes querendo ser estrelas. Em quem confiar?
Na galera que eu vi na rua com cabelo ao vento? A gente jovem reunida? Essa já mostrou que não quer acabar com a corrupção e sim com um partido político. Não que esse partido não mereça toda a decepção que lhe cerca, mas a indignação seletiva que essa juventude que poderia mudar tudo apresenta está estampada na parede da memória desde 2013. Essa lembrança é o quadro que dói mais.
Nossos ídolos não são mais os mesmos. O jogador que praticou fair play é criticado e o violento é exaltado e chamado carinhosamente de “pit bull” . Nessa carência lembramos de ídolos antigos e que segunda-feira fez vinte e três anos da perda de Ayrton Senna e depois dele não apareceu mais ninguém. Amamos o passado porque percebemos que nem sempre o novo vem e estamos até hoje esperando por esse novo. Estamos vazios de ídolos, de referências, estamos vazios por dentro.
E quem me deu a ideia de uma nova consciência e juventude? Foi solto pelo STF. O ex-guerrilheiro que queria salvar o Brasil no Araguaia agora está em em casa com tornozeleira eletrônica contando seus metais.
Minha dor é perceber que apesar de tudo que fizemos, de todas as lutas, de tudo que sempre expomos as coisas não mudam. O Brasil é o mesmo desde sempre, o mundo continua se perdendo em picuinhas e estamos nas mãos de dois malucos, um coreano e um americano. Alguns inconformados ainda sonham com um mundo melhor, mas nada nunca muda e ainda somos os mesmos.
E eu que sou apenas um rapaz latino americano sem dinheiro no banco, sem parentes importantes vindo da Ilha do Governador, trago na cabeça uma canção do rádio de um imortal compositor cearense que não foi amigo meu , mas conseguia falar do mundo, amor e do seu tempo em versos. Relembro com sorriso nos lábios que a beleza existe e deixo de lado aquela angústia parecida com a do goleiro na hora do gol.
Enquanto existir poesia existirá esperança de um dia algo mudar de fato e quem sabe não sermos mais como eles, não sermos mais…
Como nossos pais
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