Estava em dúvida sobre o que escreveria na coluna esportiva desse sábado, mas infelizmente na noite da última quinta veio um forte tema para esse espaço. A morte do ex-centroavante Gaúcho.

Não escondo de ninguém que sou rubro-negro e procuro sempre ser isento nessas colunas esportivas; meu espaço sobre o Flamengo era no finado SRZD. Mas hoje, especialmente hoje, deixo florescer um pouco o lado torcedor para falar dessa tristeza.

Já tinha visto os tricolores perderem Washington, Assis e Ézio, vi os vascaínos perderem Dener ainda jogando, os corintianos perderem Sócrates e todos mostrarem suas tristezas. Respeitei esses momentos porque esses jogadores também fizeram a história do meu time, fazendo duelos inesquecíveis contra ele.

Mas não tinha tido ainda como torcedor de futebol uma perda como essa. Evidente que vários ex-jogadores do Flamengo morreram desde que comecei a torcer pelo clube. Lembro da morte do ex-goleiro Zé Carlos, ocorrida em 2009, com tristeza. Mas a morte do Gaúcho me abalou mais.

Gaúcho é um dos meus ídolos de infância, um de meus heróis. O curioso que começou como vilão. Em 1988 o campeonato brasileiro previa em seu regulamento três pontos por vitória (na época normalmente as vitórias valiam dois pontos) e em caso de empate ocorria disputa de pênaltis – onde o vencedor levava dois pontos e perdedor um.

Durante o campeonato teve um Flamengo x Palmeiras no Maracanã e o Palmeiras vencia por 1×0 até quase o fim do jogo quando o goleiro Zetti (depois bicampeão mundial pelo São Paulo) quebrou a perna em uma dividida. Como o Palmeiras já fizera as duas substituições (eram só duas) teve que por um jogador de linha no gol. Foi o centroavante Gaúcho.

Ele foi para o gol e imediatamente o Flamengo empatou, com gol de Bebeto. O jogo assim foi para os pênaltis e aí veio um dos momentos inacreditáveis do futebol. Gaúcho pegou os pênaltis de Zinho e Aldair e o Palmeiras venceu a disputa, levando os dois pontos.

Dois anos depois o jogador chegava ao Flamengo, na verdade voltava já que passara pelos juniores em 1984. Era um momento complicado para o clube: Zico acabara de se aposentar, o time fizera um campeonato carioca ruim, mas com as chegadas de Gaúcho e Renato o time cresceu e venceu a copa do Brasil.

Renato não ficou para 1991, mas Gaúcho sim e aí ele começou a virar ídolo. Não era um craque, não tinha grande técnica, mas era raçudo, um excelente cabeceador e irreverente como é a marca da torcida do Flamengo. Assim caiu nas graças do povo. Gaúcho foi artilheiro da Libertadores daquele ano e junto com o Júnior me arrisco a dizer que foi o principal jogador da conquista do carioca de 1991. Título que o Flamengo não ganhava desde 1986.

GauchoNo ano seguinte foi fundamental para o título brasileiro e assim se eternizou na galeria dos grandes jogadores de nossa história. Ficou no Flamengo até 1993, rodou por vários clubes, inclusive o Fluminense, até que parou de jogar.

Como eu disse, Gaúcho era irreverente e tinha carisma. Cara de porte, estiloso, namorava atrizes, participava de programas de televisão, ele foi um dos reis do Rio em uma época que isso tinha graça. Gaúcho foi um dos últimos grandes personagens dos campeonatos cariocas. Uma época que tínhamos futebol na Band segunda à noite e Januário de Oliveira ajudou a consagrar jogadores e apelidos como “Super Ézio” – outro levado precocemente pelo câncer.

Tínhamos Ézio no Fluminense, Valdeir no Botafogo, Gaúcho no Flamengo, Vasco com Bebeto, época de ídolos, de apostas entre jogadores, gozações, de Valdeir comemorando gol fingindo telefonar no orelhão que ficava atrás do campo do Maracanã e Gaúcho fazendo gol em cima do Vasco e botando a bola embaixo da camisa saindo para imitar o “Seu Boneco”, famoso personagem da “Escolinha do Professor Raimundo”.

Tempos mais felizes, que jogadores comemoravam gols com a galera da geral, onde as discussões eram sobre futebol e terminavam com risadas e provocações. Não os tempos de ódio como vemos hoje em dia. Éramos felizes e sabíamos.

gaúcho 1Nós ficamos mais velhos e lembramos de nossa infância e adolescência com saudade, nostalgia. Machuca quando um personagem importante dessa época vai embora, porque é um pedaço de uma época nossa que vai também. Com a morte do Gaúcho vai um pedaço de mim, um pedaço do moleque que pelo radinho de pilha vibrava com seus gols.

Não jogou na seleção, não foi campeão do mundo, mas fez parte da vida de uma geração de torcedores e isso não tem preço.

Vai Gaúcho, vai que você cumpriu sua missão. Vai que no time do céu estão precisando de alguém para cabecear e lá os anjos, assistindo a partida, vão cantar como a “Nação” cantava no Maracanã.

“Oh que beleza / Mais um golaço do Gaúcho de cabeça.”

Valeu jogador!!

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