Nessa última semana foi realizado o sorteio da ordem de desfiles do Grupo Especial para o Carnaval-2016. Os meus amigos envolvidos com carnaval (são a grande maioria) ficam em frenesi nesse dia e eu nunca entendi muito o porquê, já que esse sorteio é direcionado. Dividem as escolas em pares de uma forma que as gigantes não sejam muito prejudicadas.

A única curiosidade que me aguça é qual será a “bucha”, a que será a segunda de domingo.

Historicamente essa posição e a pior “sorteável” do carnaval. É a posição que as escolas passam o ano rezando para não pegar. Os números mostram que isso é verdade. As piores colocações que as escolas conquistam em seu currículo geralmente ocorrem quando são a segunda de domingo e, mesmo as que desfilaram bem, ficaram pelo menos duas posições abaixo do que mereciam desfilando nessa posição.

Especial Domingo 2012 065E por quê isso ocorre?

É cultural, já está enraizado em nossa folia. É o tipo de lenda que se torna real e entra na cabeça de todos. A escola já entra, senão derrotada, já sabendo que terá mais dificuldades que o normal, já entra pensando no carnaval do ano seguinte. Nunca uma escola segunda de domingo venceu o carnaval e de 1998 para cá apenas duas vezes a escola que abriu os desfiles não caiu. Duas delas, a Rocinha e o Império Serrano, desfilaram como segunda de domingo.

É tão ruim que muita gente defende que a penúltima colocada do carnaval no ano seguinte receba a “punição” de ser a segunda de domingo.

Saindo da parte lendária e psicológica digo que é ruim ser a segunda de domingo pela nota ser comparativa. A primeira de domingo geralmente é a “Boi de piranha” escalada para descer e manter assim o clube do Bolinha fechado. O julgamento para valer começa na segunda de domingo e como a nota, eu já disse, é comparativa, na quinta escola de domingo ninguém mais lembra dela e na segunda-feira lembram nem mais se alguma escola desfilou como segunda de domingo.

20140302_222531Pois bem. É a maior curiosidade do carnaval, a única que tenho no sorteios e a minha escola, a União da Ilha, escolheu esse ano ser a segunda de domingo. Tirou a posição de última do mesmo dia, mas trocou com a Unidos da Tijuca pegando a “posição do medo”.

As redes sociais se dividiram entre a revolta pelo ato da escola com a incredulidade. A pergunta mais vista na internet naquela noite foi “Por quê a União da Ilha fez isso?”

Aqui no Ouro de Tolo o Pedro Migão coordenou uma postagem de “emergência”, querendo saber a opinião dos colunistas envolvidos com carnaval sobre o sorteio. Eu preferi não participar. Não tinha como naquele momento diferenciar o analista do torcedor. Estava revoltado, incrédulo, de cabeça quente e não devemos nos pronunciar nunca em uma situação dessas.

De cabeça fria e usando mais a experiência no samba que a emoção tentarei decifrar esse enigma.

O pronunciamento oficial do presidente Ney foi que a troca era melhor para colocar o enredo sobre as Olimpíadas em horário nobre e poupar o desfilante de desgaste. De ter que se concentrar as onze da noite e só desfilar as cinco.

20140303_224329Respeito a trajetória do presidente Ney Filardi na União. Ele transformou a escola, tirando-a do Acesso e levando-a ao Especial sem riscos de queda, beliscando desfile das campeãs, com uma das melhores quadras de samba do Brasil e devolvendo a auto-estima ao torcedor. Mas discordo totalmente.

Para mim, não existe horário nobre em termo midiático no desfile. Cada vez mais quem assiste desfile é o apaixonado por carnaval, os outros apenas observam às vezes, sem ter a atenção presa. Também não concordo com a questão do desfilante. Desfile só existe uma vez por ano, na hora da escola entrar na avenida o mesmo se anima e vai dar sua vida pelo amor ao pavilhão.

A União já desfilou tarde e bem muitas vezes, com horários piores do que o que tirou e mais desgaste que horário ao desfilante é desfilar com fantasias pesadas, como fez nos últimos anos. Se a questão era se preocupar com desgaste dos mesmos nunca poderiam desfilar com fantasias em que boa parte dos componentes chegou à dispersão passando mal.

Vou dizer o que realmente acho que ocorreu.

Algum papo sério aconteceu naquele palco. Só ver a foto do presidente Ney com o presidente Farid da Beija-Flor e o Horta da Tijuca. Algo conversaram com ele para convencê-lo. Não foram apenas as questões apresentadas.

Partindo desse pressuposto que algo ocorreu, corrijo pensamento meu da noite do sorteio e contenho a histeria vista onde quase todos apontavam a União como candidata ao rebaixamento. Se minha visão estiver certa, aí que ela não cai mesmo. Alguém ficou feliz com essa troca e de repente é o alguém que devia ficar.

E o mais impactante para o torcedor da escola, caso em que mais uma vez me incluo. Mesmo que não seja intencional, a União da Ilha assumiu que não é uma escola de ponta, não é escola que vem para brigar por carnaval.

ilha94Todo mundo sabe disso, o presidente Ney sabe, mas é evidente que a imagem vendida não pode ser essa. Ele todos os anos fala na quadra que para ganharem carnaval tem que ganhar da União da Ilha e todos os presentes aplaudem. Está certo, esse é o papel dele. Mas sabemos que isso não é verdade.

O histórico da União da Ilha mostra que ela é uma escola média (Não existem escolas pequenas no Especial). Uma escola de imensa popularidade, das mais queridas, detentora de grandes sambas de enredo, mas que, para classificação de campeonatos, tem resultados modestos. Nos últimos trinta anos só ficou entre as seis primeiras em 1986, 1988, 1989, 1994 e 2014. O normal da Ilha é a “zona da marola” e ela não teve vergonha em dizer isso.

Se fosse brigar por campeonato, não se preocuparia com horário nobre, com desgaste de desfilante, nem agradar a poderosos. Diria “Minha posição é essa e nos vemos na Sapucaí”. Mas a Ilha achou melhor sair da “confusão”, deixar os grandões brigando entre eles e apenas observar de longe, tentando pegar uma boa posição na classificação final.

A maldita posição de segunda de domingo acabou virando zona de conforto para a União da Ilha. Bem vista pelo poder com seu enredo arrumado pela prefeitura e não criando problemas para quem briga por campeonato como aquele piloto de F1 que abre passagem a quem briga pela vitória, a tricolor insulana mostra sua simpatia.

Para os torcedores é pouco, mas é o que temos para hoje.

Twitter – @aloisiovillar

Facebook – Aloisio Villar

Imagens: Arquivo Ouro de Tolo e O Globo

7 Replies to “A escolha da Ilha”

  1. Escrevi exatamente isso nas redes sociais no momento do sorteio. A União da Ilha garantiu mais um ano no Especial. E mais: Se batesse de frente com Horta e o Anísio, a Estácio estaria garantida no Especial porque esse pessoal pode ser vingativo quando quer. Ele tinha que ceder a um dos dois e como os últimos movimentos internos da Liesa não favoreciam a Família David, segundo divulgaram, a escolha dele sobre a quem agradar me pareceu acertada.

    Mas apesar disso eu também não deixei de ficar com raiva da situação. Estava torcendo para a São Clemente não cair no mesmo dia da Beija-Flor exatamente por isso e o Ney me surpreende negativamente.

    Na minha opinião todas as escolas deveriam ir para sorteio, sem pares, sem favorecimentos e sem trocas no final. Somente a décima-primeira colocada do ano anterior poderia abrir os desfiles, mas o restante vai pro saco. E zefini.

  2. Vou te falar: Gostaria de ver Unidos da Tijuca e Beija-Flor desfilando nas posições em foram sorteadas. Justamente as três últimas campeãs em posições ingratas de desfiles. Teoricamente deixaria o desfile bem mais equilibrado, mas o Ney resolveu acabar com a nossa brincadeira. Como eles jogam sujo.

  3. Boa tarde!

    Prezado Aloisio Villar:

    Pouco a acrescentar ao seu texto, que expôs em palavras mais refinadas o que havia me surgido quando de toda a confusão.
    Não posso deixar de colocar fogo na situação sobre a “reunião” de presidentes no dia do sorteio.
    Isto ainda parece dinheiro, e, se for, Ney mais uma vez mostrou-se um presidente esperto! Engordou o orçamento para 2016, que tem tudo para ser um dos carnavais mais pobres da história (Para todas as Escolas), e garantiu uma apresentação visualmente viável para um enredo pífio (Sendo educado).

    Atenciosamente
    Fellipe Barroso

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