Passada a Copa do Mundo, como bem disse a presidente Dilma, a prioridade máxima do Brasil passa a ser a boa organização dos Jogos Olímpicos de 2016 no Rio de Janeiro. Por tanto, aproveitando o marco de dois anos para o início dos Jogos, comemorados no último dia 5, é hora de pagar uma dívida antiquíssima com este blog e darmos uma olhada no andamento das obras que estão sendo feitas para o maior desafio de nossa história.

O cenário é muito ruim em certas obras, que estão bastante atrasadas, em um cronograma preocupante e sem nenhuma folga para contratempos. A sociedade terá que acompanhá-las com lupa porque é gigante a chances de termos aditivos de emergência nelas lá pelos idos do segundo semestre de 2015 e todos sabemos que esses aditivos de emergência são perigosos em termos de desvio de verbas públicas.

rio2016_cenario.jpgObs: na comemoração do dia 5 de agosto também foi divulgado o  “visual dos jogos”, a arte abstrata que irá nortear todo o design (foto ao lado). Gostei bastante da escolha do verde como cor principal, é uma cor que tem relação com a cidade que abriga a maior floresta urbana do planeta e que nunca foi utilizada como cor principal em outras edições da competição.

Alguns membros do COI que não estão diretamente ligados à comissão de acompanhamento da Rio 2016 inclusive fizeram declarações muito duras, afirmando que o Rio está mais atrasado que Atenas (que teve um atraso colossal em sua preparação) estava em 2002 e ameaçaram a organização carioca  afirmando que o COI já estava estudando planos B para enviar algumas competições esportivas para fora do Brasil. Isso ocorreu pouco depois do Financial Times revelar que membros do COI já haviam sondado as autoridades londrinas sobre a possibilidade da cidade, aproveitando as estruturas de 2012, sediar novamente os Jogos de 2016 no lugar do Rio de Janeiro. O COI e as autoridades inglesas desmentiram rapidamente tanto o plano B quanto a sondagem a Londres.

Deve-se perguntar como o Rio de Janeiro deixou a situação chegar a tal ponto, pois tinha condições ideais para fazer um planejamento tranquilo. As duas obras que historicamente dão dor de cabeça às organizações olímpicas, Vila Olímpica e Estádio Olímpico, são justamente as duas mais adiantadas na nossa preparação.

Por mais que não seja de todo absurdo comparar a situação do Rio apenas quanto as obras atrasadas (que não são poucas, mas também não são tantas como se apregoou) em relação a Atenas, não se pode perder de vista que a declaração mais contundente e mais divulgada foi dada por John Coates e só isso já explica o porquê de tanta ferocidade.

John Coates (foto ao lado), presidente do comitê olímpico australiano, apesar de ser vice-presidentes do COI e um de seus membros mais influentes, sempre teve atitude extremamente cética e, em alguns momentos, arrogante contra o Brasil e o Rio de Janeiro desde a época da candidatura da cidade (especula-se que ele apoiava Chicago), sempre tendo atitudes hostis. É claro que ele não perderia a oportunidade de espetar a cidade mais uma vez, ainda mais tendo uma ferida aberta pelos atrasos nas obras, especialmente em Deodoro onde a situação, quando da declaração ao final de abril, era alarmante.

Alias, ressalte-se que John Coates não é único. Ele apenas é a figura mais proeminente e corajosa de um grupo do mundo olímpico, que faz uma oposição ferrenha ao Brasil desde os primeiros passos da então aspiração da cidade de ser sede olímpica. Quem também faz parte deste grupo e causa barulho é o site especializado Around The Rings. Leio este site há 8 anos e até hoje ainda não li uma mísera reportagem com enfoque positivo sobre o Rio. Quanto tem, é mera reprodução de alguma Nota Oficial.

Inclusive relatos de jornalistas que acompanharam a visita do COI as quatro cidades candidatas à 2016 (Chicago, Tóquio, Rio e Madrid), indicam que a postura do veículo contra o Rio de Janeiro já era claramente percebida nas perguntas que foram dirigidas aos dirigentes brasileiros, muito mais ácidas e agressivas do que as que foram dirigidas a espanhóis, japonenses e, especialmente, americanos (o site é de Atlanta, EUA). Interessante notar que é costume que as cidades candidatas comprem espaços na página do ATR para divulgar sua candidatura e a única que não o fez isso em momento nenhum para 2016 foi o Rio.

Após essa explicação sobre as últimas polêmicas internacionais envolvendo a organização, vamos às situações das obras. Para quem não sabe, as instalações olímpicas no Rio foram divididas, desde ainda o projeto de candidatura, em 4 zonas: Barra, Copacabana, Maracanã e Deodoro. Abordarei a situação de cada zona separadamente, na qual mostro a situação das instalações esportivas e de apoio (Vila Olímpica, vila de mídia, locais de transmissão de jogos etc.), mas todas as obras relacionadas a transportes na cidade estarão em um tópico específico ao final. Na coluna de hoje apenas escreverei sobre a complexa “Zona Barra”, deixando as outras zonas para a próxima coluna.

Zona Barra

Esta zona será o coração dos Jogos. Nela estará concentrada a Vila Olímpica e inúmeras modalidades, especialmente no Parque Olímpico (onde era o antigo autódromo de Jacarepaguá) e no Riocentro. Também abrigará os gigantescos IBC (centro das equipes de TV do planeta) e MPC (centro de mídia impressa oficial).

A Vila Olímpica, como eu disse, já está sendo construída há muito tempo no local que abrigou a primeira e a terceira edições do Rock in Rio. A obra está sendo tocada por uma construtora séria e com financiamento bem definido (o exato oposto da Vila do Pan). Obra indo as mil maravilhas, dentro do cronograma e até um pouco adiantada, apesar de sua complexidade. São 31 prédios a serem construídos e todos devem ser entregues em março de 2016. Poderiam ser entregues até antes, mas manteve-se a data para contenção de despesas.

Talvez a Vila (foto da obra, ainda em fevereiro, acima) seja o que de mais especial tenha na estrutura olímpica carioca. Até por ser feita para ser um condomínio de relativo luxo, foi muito bem planejada e deve ser a melhor Vila Olímpica já feita. Junto com o Parque dos Atletas (palco das duas últimas edições do Rock in Rio), deve fazer um conjunto de alegrar até o mais ranzinza dos atletas e dirigentes que por lá passarão.

Atravessando a rua, chega-se ao Riocentro, o maior centro de convenções da América Latina e que também abrigará competições de levantamento de peso, tênis de mesa, badminton e boxe em 4 pavilhões, sendo um deles temporário (salvo engano, o de boxe). Aqui a estrutura será basicamente temporária, a cargo do Comitê Organizador e só será realizada já no fim de 2015; nada para se esquentar a cabeça. Só a construção do pavilhão temporário me preocupa um pouco, mas como diminuirá consideravelmente a área de estacionamento do Riocentro não há como começar tal obra antes do fim da Bienal do Livro de 2015 (costuma ser por volta de setembro). Abaixo uma foto do Riocentro no Pan 2007, quando também abrigou o tênis de mesa.

Andando pouco mais de 500m do Riocentro chegamos ao Parque Olímpico e aqui começam os problemas. O Parque Olímpico será uma mega estrutura com quatro ginásios, tênis, velódromo e Centro Aquático, além do IBC/MPC. Uma obra extremamente complexa e quase toda partindo do zero. Mesmo o que já estava pronto do Pan precisará passar por profundas modificações, à exceção da Arena Olímpica (HSBC Arena), palco das ginásticas. Para piorar, as obras foram começadas com atraso e ainda enfrentaram uma greve de duas semanas dos trabalhadores.

Também remanescente do Pan, o Parque Aquático Maria Lenk (foto mais abaixo), além de não mais satisfazer as exigências olímpicas para a natação (refeitas após a entrega do belíssimo centro aquático de Pequim, em 2008) terá que sofrer alguns ajustes para conseguir sediar os saltos ornamentais e o nado sincronizado.

A Rio 2016 jura que serão pequenos ajustes, mas já experiente do que ocorreu com o Engenhão (abordarei na Zona Maracanã), eu esperarei a finalização do projeto básico, ainda não concluído, para compartilhar do mesmo otimismo. Como sequer o projeto básico da reforma está pronto, a obra não tem nenhum cronograma ainda e é uma das que me despertam atenção detalhada.

Como o Maria Lenk não poderá ser usado para a natação, haverá a necessidade da construção de um segundo Centro Aquático no Parque Olímpico. Com custo estimado de R$ 217 milhões, foi outra obra que começou depois do previsto, só em abril deste ano e os construtores correm para finalizá-lo em fevereiro ou março de 2016. O prazo é apertado para fazer testes, mesmo sendo entregue a tempo. É a primeira luz amarela do complexo esportivo.

A terceira estrutura que deveria ser aproveitada do Pan nesta área era o Velódromo, que receberia o ciclismo de pista. Porém é outra estrutura que não atendia às exigências olímpicas e a reforma seria tão cara que decidiram desmontar o Velódromo (despachando o material para ser reconstruído em Goiás) e criar um novo do chão. Até pela polêmica despertada pelo “desperdício” do velódromo do Pan essa foi outra obra que começou um tanto atrasada, só em fevereiro desde ano, ao custo previsto de R$ 113 milhões. A obra está prevista para acabar em dezembro de 2015. O prazo não é o perfeito, mas ainda é razoável. É uma obra em que aposto que terá atrasos, mas ainda será entregue sem complicações até o primeiro trimestre de 2016. Apenas não haverá muito tempo para ser testado. Mais uma luz amarela.

Outra estrutura esportiva a ser construída no Parque Olímpico será o Centro de Tênis. Serão dezesseis quadras de tênis na qual ocorrerão todas as disputas do esporte. Apesar do número assustador, apenas uma quadra terá uma grande capacidade, 18 mil pessoas; e outras duas, capacidade mediana. As outras quadras, basicamente, serão apenas as quadras de jogo sem maiores complexidades. Foi uma das primeiras obras a se iniciar no Parque, ainda em novembro de 2013, e deverá ser concluída até o fim do ano que vem.

Para agilizar e baratear a construção ainda foi escolhido o piso de cimento (igual ao do US Open), apesar de toda a tradição do esporte no país ter sido construída em quadras de saibro (mais complexas de construir e manter).

A Confederação Brasileira de Tênis reclamou bastante da escolha, mas ela é perfeitamente compreensível. Todas as sedes olímpicas que tiveram que construir as quadras optaram pelo piso duro. As únicas exceções foram Barcelona 1992, que usou seu já conhecido complexo de quadras de saibro, e Londres 2012 que usou a grama do lendário AELTC, sede anual do famoso torneio de Wimbledon.

A alma do Parque Olímpico serão os 4 ginásios a serem construídos, que comporão sua fachada e o maior legado educacional-esportivo após os Jogos. Neles serão realizados o basquete (Pavilhão 1, para 16mil pessoas), o judô, a luta olímpica (Pavilhão 2 para 10 mil pessoas), a esgrima, o Taekwondo (Pavilhão 3 para 10mil pessoas) e o Handball (na arena 4, a única temporária, que será transformada em escola após a competição). Por serem 4 ginásios ao mesmo tempo, é uma obra um tanto mais complicada. Ela está sendo feita pela iniciativa privada em uma Parceria Público-Privada (PPP). Foram as primeiras obras a começarem na área, ainda em julho de 2013 e espera-se que sejam completadas ainda em setembro de 2015, a tempo de se fazer eventos-teste antes da virada do ano. Após um inicio demorado, as obras foram aceleradas e estão indo bem.

Além de toda essa estrutura esportiva, o Parque Olímpico ainda precisa ter tanto o prédio do IBC como do MPC prontos. São construções gigantescas e, especialmente no caso do IBC, precisa ser belíssima e muito bem construída, afinal todos os estúdios das emissoras de TV mundo afora serão instaladas neles. São duas construções que costumam demorar em torno de 3 anos para serem construídas e o Rio as iniciou com extremo atraso apenas no fim do ano passado, também no esquema de PPP.

O cronograma prevê a entrega de ambos para o fim de 2015, mas mesmo no ritmo frenético que as obras estão tomando, será difícil dos ajustes finais serem concluídos antes do 1° trimestre de 2016, em cima da hora. É uma obra que inspira cuidados e apreensão; outra luz amarela.

Para hospedar os jornalistas, ainda será feita um Hotel de Mídia no Parque Olímpico, que terá 400 quartos e foi iniciado com um belíssimo atraso só em dezembro de 2013. A promessa é que ela seja entregue em junho de 2016 e para isso também está em ritmo frenético, mas com os jornalistas já chegando no fim de julho, não há nenhum margem de segurança para essa obra e é a última luz amarela do complexo, já querendo se tornar vermelha.

Para finalizar a Zona Barra, fica faltando outra obra polêmica: o Campo de Golfe. Para quem não se lembra, o golfe não estava incluído no dossiê de candidatura do Rio pois sua inclusão como esporte olímpico só foi votada 4 dias após a escolha do Rio como sede. Mas era natural que a competição fosse feita no Itanhangá Golf Club, o campo de golfe mais tradicional do Rio que fica a poucos quilômetros da Vila Olímpica.

Porém o prefeito Eduardo Paes insistiu que a cidade precisava de um campo público de golfe e que além de ser imoral a prefeitura bancar a reforma de um clube particular, os Jogos Olímpicos seriam a alavanca necessária para a construção de tal campo público de golfe. Assim foi feito e uma PPP foi assinada para a construção do campo de golfe em uma área de proteção ambiental.

Como demonstra a foto abaixo, a obra do campo está indo bem. O último estágio de construção do campo, o cultivo da grama, demorado até o ponto necessário para as disputas, já começou. Depois da grama, restará a fazer as construções de alvenaria do campo, que também não são poucas. Por isso, o campo só está previsto para ser entregue em junho de 2016, outra obra que ficará pronta no limite.

Só que, não bastasse o tempo curto, por ficar em uma área de proteção ambiental, o Ministério Público exigiu uma série de contrapartidas para diminuir o impacto da construção do campo ao meio ambiente e isso tem sido alvo de inúmeras tentativas do MP de interromper a obra porque alguma contrapartida não está sendo feita. A última foi uma liminar solicitada na 7ª Vara de Fazenda Pública do Rio na sexta-feira passada. O juiz decidiu não conceder a liminar de plano (inaudita altera pars) e marcou audiência para o dia 3 de setembro para decidir sobre o pedido.

Apesar de todos os problemas, a realização do golfe não deverá ser problema, mas tais atrasos poderão afetar o término da infraestrutura do campo para os Jogos e resultar em uma competição feita de forma improvisada.

Ainda abordarei as Zonas Copacabana, Maracanã, a delicadíssima Zona Deodoro e as obras de transporte, em outra coluna.

Imagens: Rio 2016 (Vila Olímpica, Maria Lenk, Campo de Golfe, Foto da Capa e “Visual dos Jogos”), COI (John Coates) e Wikipedia (Riocentro).

2 Replies to “Situação das Obras Olímpicas – Parte I”

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