Nesta segunda feira, a coluna “Histórias Brasileiras”, do historiador Luiz Antonio Simas, aproveita o ensejo da eleição de Fernando Henrique Cardoso para a Academia Brasileira de Letras para contar uma história envolvendo outro político e as letras.

Imortais

A semana começou bem. Perguntaram em sala se D. Pedro II tinha sido presidente do Brasil, se o livro que Graciliano Ramos escreveu quando estava preso na Ilha Grande se chama Memórias de um Sargento de Malícias [com “a” mesmo] e, para completar, se São Jorge foi guilhotinado durante a Revolução Francesa. Faz parte.

Confesso, porém, que isso é pinto perto da notícia mais impressionante que recebi nos últimos anos, vinda de um camarada incapaz de qualquer facécia: No dia em que Fernando Henrique Cardoso foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, descobri que Fernando Collor de Mello é imortal da Academia Alagoana de Letras desde 2009 (foto, na posse). Como é que eu ainda não sabia disso, minha gente?

O atual senador é autor de grandes obras da prosa canarinho e eu não desconfiava. Collor escreveu, por exemplo, O desafio de Maceió; Maceió: 20 anos em 3 e O Manual dos Municípios. Vou imediatamente correr atrás para ler as obras do imortal, eleito com esmagadora maioria dos votos para a casa a qual pertenceu o poeta Jorge de Lima.

Collor e FHC não são os únicos ex-presidentes do Brasil a alcançar a imortalidade. Getúlio Vargas e José Sarney foram eleitos para a Academia Brasileira de Letras. Vargas, inclusive, conseguiu a proeza de virar imortal sem escrever um mísero panfleto. Sarney, autor do livro de poemas Marimbondos de Fogo, derrotou na disputa o poeta Mário Quintana.

Eu bem que deveria ter desconfiado que Collor alcançasse a imortalidade quando o então presidente subiu a rampa do Planalto acompanhado por duplas sertanejas e a bandeira nacional foi hasteada ao som de Pense em Mim, o clássico de Leandro e Leonardo. Ou então quando Collor fez uma daquelas corridas matinais pelas ruas de Brasília, acompanhado por uns trinta índios a caráter, com direito a cocar, tanga e sandálias havaianas.

Se isso for tendência latino-americana, aguardo para breve a eleição de Carlos Menem para a Academia Argentina de Letras. O ex-presidente argentino, lembro-me bem, em certa ocasião apareceu em um programa de auditório e participou de uma brincadeira que incluía rodar em um bambolê, subir escadas, descer por um escorrega, cair dentro de um tanque de piche, rolar numa cama de penas de galinha e participar, feito uma d´angola, com o grupo Los Tremendos de uma coreografia da imortal dança do passarinho. Isso é garantia de imortalidade.

Meu imortal predileto, porém, continua sendo o general Aurélio de Lira Tavares. Ministro do Exército no governo Costa e Silva e entusiasmado defensor do AI-5, Lira Tavares fez parte da junta militar que assumiu o governo do Brasil quando Costa e Silva teve um derrame, num dos momentos mais pesados da ditadura. Governou o país, ao lado dos ministros da Marinha e da Aeronáutica, até a posse do general Médici.

Entre um ato institucional e outro, Tavares foi poeta bucólico [palavras do próprio] e dedicou-se especialmente aos sonetos. Não lançou livros assinando o nome de batismo. Preferia usar o fabuloso epíteto de Adelita: A de Aurélio; Li de Lira e Ta de Tavares. Adelita foi eleito para a Academia Brasileira de Letras em 1970. Ocupou a cadeira número 20, que tem como patrono Joaquim Manuel de Macedo. Vou procurar algum poema do general para postar no Ouro de Tolo qualquer hora dessas.

Esse espaço, portanto, ciente da honra que eleva e consola, parabeniza com imperdoável atraso a Academia Alagoana de Letras pela escolha do imortal Collor de Mello. Saber que Collor é imortal me impactou de tal forma que sequer consigo pensar na eleição de FHC para a ABL. É irrelevante.

Fico por aqui lançando, desde já, a ideia de que a nobre instituição das Alagoas, após a imortalidade de Collor, eleja para seus quadros mais um alagoano ilustre, que muito contribuiu para as letras canarinhas: Mário Jorge Lobo Zagallo.

Abraços