Venho acompanhando nos últimos dias um intenso debate sobre o preço das cervejas brasileiras, envolvendo fabricantes, revendedores, corneteiros e consumidores. Obviamente não perderia a chance de entrar nesta querela.

O leitor mais antigo deve se lembrar de artigo que escrevi em setembro neste blog sobre esta questão. De lá para cá, pouca coisa mudou, e algumas para pior.

Recentemente artigo de um dos donos da cervejaria Colorado, respondendo às ponderações sobre o fato de sua cerveja custar nos Estados Unidos mais barata que aqui, afirmou que o consumidor brasileiro deveria pagar um sobrepreço “a fim de estimular a indústria cervejeira nacional”. Sabe-se que há dificuldades específicas de nosso mercado, mas afirmar este tipo de coisa é chamar quem gosta de cerveja especial de otário.

Os insumos são importados, a tributação é pesada e diferenciada, mas a meu ver falta também um pouco de gestão no cenário nacional. Eu não consigo conceber como uma boa IPA americana como a Anderson Valley, por exemplo, chegue aqui praticamente ao mesmo preço que bons exemplares nacionais, como a Green Cow da Seasons. As cervejas importadas são pesadamente taxadas e o mesmo custo de logística que impacta os exemplares nacionais também afeta as cervejas importadas – ou seja, falar nisso é desculpa esfarrapada.

Em minha observação, a impressão que tenho é de que, muitas vezes, as cervejarias artesanais brasileiras “brincam de serem empresários”. Um bom exemplo é o da Bodebrown, em Curitiba, cujos exemplares multi premiados em concursos são quase impossíveis de ser encontrados aqui no Rio. A fábrica só produz “quando os donos querem”, sem ter compromisso com o consumidor. Decididamente não é um modelo de negócios reproduzível e sustentável a longo prazo.

Ou o “empresário” que reclama da carga tributária e vive indo à Alemanha – este, costumo chamar de “playboy de Votorantim”. Uma questão séria do quadro artesanal brasileiro é que alguns dos principais próceres não dependem de suas produções para sobreviver. Na prática para alguns cervejeiros brasileiros a produção é um hobby, sendo mais vista pela qualidade do produto – o que é louvável – que pela viabilidade empresarial.

Outra questão é que não há iniciativa de união dos produtores brasileiros a fim de obter um regime tributário mais favorável e outros tratamentos específicos ao setor, em suas especificidades. Vale lembrar que a diretoria da Afrebras (associação dos fabricantes de refrigerante do Brasil) ofereceu sua estrutura a fim de que um departamento cervejeiro fosse criado e tal iniciativa foi rechaçada de pronto.

Também não entendo certas formações de preço. Um bom exemplo é o da Colorado Vixnu, Imperial IPA da qual gosto muito. A cerveja de 310ml custa R$ 14 como preço final, enquanto a de 600ml sai a R$16. É algo que eu, como economista, sinceramente acho bastante complicado.

Um dos donos da Colorado, respondendo a este questionamento que fiz na área de comentários do blog “Mosto Crítico”, me respondeu o seguinte: “Obrigado Pedro, apesar de não me considerar playboy sua crítica é pertinente e te digo que a garrafa de 310 ml custa praticamente a mesma coisa que a 600 ml por isso a pouca diferença de preço entre as duas, esta foi uma embalagem desenvolvida exclusivamente para restaurantes mas acabou indo para o mercado em geral, falha nossa, em vez de se desagradar comigo ou com a cervejaria você poderia comprar a de 600 ml que tem um melhor custo benefício para a cervejaria e para você.”

Ressalte-se a boa vontade em responder de forma educada às críticas, mas ainda assim o fato de uma embalagem de 310ml custar o mesmo preço de uma de 600ml é algo que precisa ser pensado. No mínimo é sinal de que falta escala e união de forma a melhorar a formação de preço das cervejas nacionais.

Por mais que o argumento seja que as cervejas brasileiras enfrentam problemas de insumos, logística e impostos (estes dois últimos, em termos), olhando pelo meu lado de consumidor fica difícil de “prestigiar” o produto nacional quando temos exemplares importados a um preço similar e até melhor. Haja nacionalismo…

Outra questão é que, se baixando os preços através de maior eficiência e união, se consegue atingir a um espectro maior de consumidores. Os fabricantes brasileiros precisam decidir se preferem manter suas criações em um “gueto” ou se desejam ganhar escala a partir da incorporação de novos bebedores de cervejas especiais. Uma reclamação que ouço muito é que muitos consumidores gostariam de beber somente brejas especiais, mas o preço impede. Pessoalmente tenho conseguido manter um mix de 90% de especiais em meu consumo, mas à custa de reduzir bastante a quantidade. Os fabricantes brasileiros não parecem muito interessados em ampliar seu mercado – e a teoria econômica ensina que maior mercado significa maior escala e, consequentemente, menor preço.

Em minha visão, o mercado brasileiro de cervejas especiais está em um momento em que precisa escolher se quer ocupar seu nicho de mercado ou se deixará este a cargo das importadas. Urge maior união, melhor gestão das empresas e especialmente ganho de escala.

Finalizando, deixo meu protesto quanto à postura de algumas importadoras que buscam exclusividade em cervejas importadas apenas para subir artificialmente o preço. Um bom exemplo é a belga trapista Chimay, que desde que passou a ser importada com exclusividade viu seus preços, que experimentavam forte redução, voltar aos patamares anteriores. Isso é uma forma de se aumentar a margem unitária em prejuízo do mercado e do consumidor.

Como pode ver o leitor, apreciador de cervejas sofre…

6 Replies to “Uma vez mais, o preço das cervejas brasileiras”

  1. Sem comentar a questão da cerveja, uma garrafa de agua mineral de 310ml custa o mesmo ou algumas vezes mais caro que uma de 500ml. (Já vi preços maiores no mesmo supermercado)

    No caso da cerveja nem sempre é quando queremos, a produção artesanal não é tão simples quanto uma produção industrial e mesmo assim no carnaval e ano novo falta cerveja “normal” no mercado.

    Ahoy marujo!

  2. Ja vi casos de agua mineral de 310ml mais cara que 500ml no mesmo supermercado. Preço final, não era proporcional. Se for calcular o preço do litro então, vai descobrir que a agua sai de graça, o que custa é a embalagem.

    No caso da cerveja, a produção artesanal é bem mais complicada que a industrial, e mesmo assim no carnaval e ano novo falta cerveja “comum” no mercado. O problema é que a procura é grande e o processo lentom causando o desabastecimento.

    Ahoy marujo!!!!!

  3. Pedro, acho que seu novo post não faz justiça ao mercado brasileiro e nem às dificuldades de gestão que os empresários que atuam nesse mercado passam. Sugiro você entrevistar melhor ou pesquisar melhor o assunto para não ficar no “achismo” que permeia seu texto.

    1. Não é questão de “achismo”, mas sim de tentar analisar a questão sob os ângulos de economista e de consumidor. Ainda assim acho que o post cumpriu o papel de fomentar o debate

      abs

  4. Meu caro amigo Migão , erguendo uma Chimay Blue pelo aniversário desse nobre espaço , queria pontuar algumas coisas já que trabalho no setor e conheço pelo menos sete fábricas pequenas de cerveja… Para mim são dois pontos cruciais . Impostos . Esses machucam demais o pequeno empresário , juntando na mesma bacia quem fatura bilhões e quem fatura 6 dígitos. Muitos dos pequenos empresários cervejeiros são ultra ricos e começaram por hobbie e hojem florescem como suas atividades principais… aí vem outro problema…
    As artesanais brasileiras nasceram sob a conotação de supra sumo.. puro sangue… aquelas que prestam .. e aí , por óbvio nasceram caras e distante da realidade da maioria… Na Alemanha , pra citar 1 , não há essa discrepância.. De uma brincadeira cara , caíram na teia da Substituição Tributária .. O imposto mais voraz que tem e que é baseado no preço final. Ou seja , um circuito vicioso que vai demorar a ser desamarrado… O playba de Votoramntim é o típico caso … e nariz em pé a parte ele é um sonhador … um empreendedor .. que deveria ser olhado com carinho pelo poder público… mas ele não contribui nem pra campanha poliica nem pra fiscais do icms…. Abraço

    1. Sem dúvida alguma suas ponderações são pertinentes, mas também me parece faltar um pouco de espírito empreendedor. Além de iniciativas que visem ampliar o mercado consumidor de brejas especiais/artesanais

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