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Nesta quinta feira, a coluna “Sabinadas”, do jornalista esportivo Fred Sabino, traça pequeno perfil daquele que defino como o último grande herói rubro negro: Ronaldo Angelim.

Em um momento onde Leonardo Moura chama de “fariseus” seus (muitos) críticos e que Renato Abreu é apontado como “líder” – sendo que se coloca como uma “prima dona” intocável – é uma grande lição. Aliás, a (dispensável) renovação dos dois acabou sendo o “Presente de Natal” da nova diretoria do clube à torcida – mas este é papo para outro post.

Vamos à coluna.

There is only one Ronaldo

Nos últimos dias pintou a notícia de que Ronaldo Angelim pretende deixar o futebol até o meio deste ano e que um amistoso entre Fortaleza (clube que o recontratou) e Flamengo, dois dos clubes pelos quais o zagueiro passou, seria marcado para a despedida do jogador – hoje com 37 anos.

Ora, você leitor pode perguntar, com razão: com tanto jogador badalado por aí e tanto cara fazendo jogadas maravilhosas como Neymar, Lucas, entre outros…

Por que diabos uma coluna dedicada ao Ronaldo Angelim?

Respondo: porque o Angelim, seguramente, é o jogador de futebol nos últimos anos que mais se mostrou parecido conosco. Simples, guerreiro, verdadeiro, fiel aos seus princípios. Um cidadão comum. Um ser humano.

Ao contrário do que muitos pensam, Angelim não é nordestino. Nasceu na capital de São Paulo, mas logo na infância teve de se mudar para Porteiras, sul do Ceará, onde tinha de cavar poços artesianos para prover a família com água, tão difícil de se conseguir naquelas bandas na época – e infelizmente até hoje pela incompetência dos nossos governantes (falo de todos, independentemente do partido).

Por isso mesmo, não conseguia se dedicar integralmente ao futebol, o que só aconteceu a partir de 1996, quando Angelim já tinha 20 anos, em Juazeiro do Norte. Um início tardio, é verdade. Ele passou por Icasa, Juazeiro, Ceará e Ituano até conseguir uma transferência para o Fortaleza, em 2001.

Depois de boas temporadas no Tricolor cearense, pelo qual mostrou sempre bom senso de colocação e desarmes precisos, em 2004 Angelim fez o gol que levou o clube de volta à Série A, no jogo contra o Avaí. De cabeça após um escanteio, vejam só…

Após mais um bom ano no Fortaleza, Ronaldo teve a maior chance de sua carreira ao ser contratado pelo Flamengo, clube mais popular do Brasil. Reserva no começo, não comprometia quando era escalado, mas tampouco era efetivado como titular.

Tudo mudou em 2007, quando a saída de outros (e piores) zagueiros e a chegada de Fábio Luciano criaram o cenário ideal para Angelim se firmar. E, com uma forte defesa comandada pelos dois, o Rubro-Negro saiu do buraco e ainda conseguiu uma vaga na Libertadores.

Mas o que mais chamava a atenção da torcida, mais até do que a boa fase como zagueiro e os gols sempre importantes, era a postura de Angelim. Sempre sincero nas entrevistas, ele admitia seus eventuais erros, não tinha vergonha de dizer que o Flamengo fizera uma partida ruim mas sem criticar os companheiros e não ficava chorando contra os árbitros.

Fora de campo, mantinha-se fiel à família, não aparecia nunca nas noitadas e/ou orgias que alguns jogadores mais badalados promoviam na época, era sempre muito solícito com os fãs e fazia amizades com os porteiros da rua onde morava. Nada mais simples e autêntico.

Logo no começo de 2009, Angelim levou uma forte pancada na coxa direita e teve a chamada Síndrome Compartimental Aguda (inchaço dos vasos sanguíneos), correndo o risco de ter a perna amputada. A cirurgia emergencial salvou a perna e a carreira do zagueiro, que aos poucos foi voltando ao time titular.

Depois do tricampeonato carioca, o Flamengo fazia um Brasileirão irregular com o técnico Cuca e, mesmo sofrendo ao lado do limitadíssimo Wellinton na zaga, seu prestígio não foi abalado. Com a chegada de Andrade e do também experiente zagueiro Álvaro, a defesa voltou a se firmar e o time encorpou.

Angelim ficou muitas rodadas sem receber cartões, algo raríssimo no faltoso futebol brasileiro atual, e na última rodada, contra o Grêmio, coube a ele, de novo de cabeça após um escanteio, livrar o Flamengo do incômodo jejum de 17 anos sem títulos brasileiros. E, após o hexa, deu outra lição de humildade e sinceridade:

– A minha vaidade é o Flamengo vencer. Eu me considero um torcedor, jogo com a alma. Procuro jogar com raça porque sou flamenguista desde criancinha e o mínimo que posso fazer é correr quando entro em campo.

Na volta a Juazeiro, onde poderia descansar com a família e fugir dos holofotes, Angelim foi recepcionado por cinco mil torcedores. Talvez um fato inédito no futebol: um jogador apenas provocar tanta comoção numa cidade.

E Angelim não mudou. É lógico que o tempo passou e a idade pesou. Ronaldo passou a ter mais dificuldades com a velocidade, falhou em alguns momentos e saída do Flamengo no fim de 2011 foi natural. O próprio Ronaldo, sempre consciente, não ficou magoado. Não atuou regularmente em 2012 e agora conseguiu um contrato com o Fortaleza.

[N.do.E.: em 2010 ele chegou a ter a humildade de pedir para ser sacado do time ao reconhecer que estava mal e que precisava retomar a boa forma técnica. Uma lição aos renatos, ibsons e leo mouras da vida.]

Ele está feliz e felizes somos nós de termos visto um sujeito simples e humano ter vencido na vida sem jamais ter perdido os valores que cultivou ao longo da sua existência. Quem dera que ninguém neste mundão deixasse o sucesso subir à cabeça. Quem dera que todos nós fôssemos mais humanos e desprovidos de vaidades bestas.

Por isso mesmo, como diz a torcida rubro-negra: there is one only Ronaldo: Angelim!

(Foto: Folha)