Quarta feira passada estive no lançamento da série “Cadernos de Samba”, série de pequenos livros que visam a resgatar a memória do carnaval carioca e especialmente das nossas escolas de samba. Coordenada pelo jornalista Aydano André Motta, os livros buscam registrar uma história que, muitas vezes, acaba se perdendo com a morte dos sambistas mais antigos das agremiações.
Os três primeiros livros são “Tantas Páginas Belas”, sobre a Portela, do historiador Luiz Antonio Simas; “Maravilhosa e Soberana”, do já citado Aydano, sobre a Beija Flor, e finalizando “Marcadas para Viver”, do jornalista João Pimentel. Este último conta a saga de cinco escolas pequenas: Unidos de Lucas, Em Cima da Hora, Vizinha Faladeira (onde já desfilei, em 2008), Unidos do Jacarezinho e a extinta Tupy de Braz de Pina.
O lançamento, na Livraria da Travessa do Shopping Leblon, contou com a presença de jornalistas, formadores de opinião do carnaval e representantes das escolas enfocadas. A se lamentar a ausência da Portela, representada de forma não oficial apenas por três integrantes do site PortelaWeb – entre os quais este blogueiro, por Mestre Monarco, pelo autor do samba de 2013 Luiz Carlos Máximo e pelo sócio Marcos Vieira de Souza, conhecido pelo apelido de “Falcon” – e que é esposo da porta bandeira da Beija Flor Selminha Sorriso.
Para o leitor ter uma ideia, somente a Beija Flor trouxe três ônibus com componentes para prestigiar o lançamento. Outro exemplo é que eu tive a oportunidade de conversar com o Presidente da Unidos de Lucas, também representado de forma oficial.
Os livros (na foto, da esquerda para a direita, Simas, Pimentel e Aydano) tem formato pouco maior que uma edição de bolso e tem cada um deles cerca de 120 páginas. Escritos em uma linguagem acessível, são lidos rapidamente – eu levei cerca de duas horas para completar a leitura no último sábado.
A noite também contou com a presença do Prefeito Eduardo Paes – que chegou depois que eu havia saído – e teve cobertura televisiva e de sites especializados. Inclusive em uma das matérias, que pode ser vista no Youtube, Luiz Antonio Simas chega a afirmar que sem a Portela o desfile tal como conhecemos talvez não existisse desta forma.
Faço abaixo uma pequena resenha de cada um deles, pela ordem de leitura.
Tantas Páginas Belas
Simas optou por contar a história da águia altaneira a partir da formação do subúrbio de Oswaldo Cruz, base da escola. Ao contrário de outras agremiações a Portela é uma “escola de planície”, ou seja, não está baseada em nenhum morro.
São mostradas as circunstâncias de formação da agremiação, os bons tempos de Natal – que ganha uma espécie de mini perfil bastante interessante, as grandes crises e o momento de renascimento da escola trazido pelas feijoadas da Velha Guarda e outras iniciativas semelhantes.
Este blogueiro e o Ouro de Tolo são citados como referência bibliográfica, em especial a coluna “Samba de Terça” que escrevi sobre o desastroso desfile de 2005. É um fato que muito me honra.
O site PortelaWeb, do qual faço parte da equipe, também foi uma fonte de pesquisa valiosa. É um belo exemplar àqueles que pretendem conhecer um pouco da bela história da minha escola.
Maravilhosa e Soberana
Aydano André Motta – que, devo avisar aos leitores, é fanático torcedor da escola de Nilópolis, a ponto de achar que o título de 2003 foi justo (risos) – optou por uma leitura mista: ao mesmo tempo em que mostra a história da agremiação (que eu mesmo não conhecia), também conta um pouco do “modo Beija Flor de desfilar”, que é quase religioso, messiânico.
Alternando passado e presente, tradição e modernidade, Aydano ajuda a desnudar este fenômeno representado pela sua comunidade e sua devoção à escola, a seu patrono e seus comandantes. O modelo de carnaval representado pela azul e branca, confesso, não me agrada totalmente, mas tem de ser respeitado. É um misto de “despotismo esclarecido” com paixão genuína de seus integrantes, que resultou em uma receita muito vitoriosa.
O autor também conta histórias como as de Laíla, Joãozinho Trinta, Anísio Abraão David e o carnavalesco Milton Cunha, entre outros. Pelo menos para mim, que conheço pouco o que ocorre na escola fora dos 82 minutos de avenida, se mostrou um valioso documento – aprendi bastante, e, somado ao que vi no lançamento, passei a admirar a organização e a força da agremiação.
Apesar de ser um livro escrito por um apaixonado, há ligeiras críticas ao adesismo político da Beija Flor – que tem dois a meu ver inacreditáveis enredos defendendo o Regime Militar nos Anos 70 e, recentemente, homenageou o Governo Lula. Aydano também demonstra preocupação com a sucessão na escola.

Marcadas para Viver

Contar a história de cinco pequenas agremiações deu um certo trabalho de pesquisa ao autor João Pimentel. Os registros escritos são muito tênues e os detentores da história oral nem sempre se encontravam disponíveis.

A história de cada uma das agremiações é contada de forma a entender o porquê de não terem se firmado no grupo das grandes, bem como resgatar sambas como “Os Sertões”, da Em Cima da Hora, “Sublime Pergaminho”, de Lucas (ambos enfocados na série “Samba de Terça” deste blog) e “Seca do Nordeste”, da Tupy de Braz de Pina – acima em versão com Clara Nunes.

Algo que impressiona nas histórias contadas é a relação com a questão da violência. Lucas, Tupy, Vizinha Faladeira e o Jacarezinho foram muito afetados por esta questão em algum momento.

Também se contam versões conflitantes da escolha de “Os Sertões”, para mim o maior samba de enredo da história do carnaval carioca.

O livro tem alguns equívocos de datas: a Vizinha desfilou com o enredo sobre Gilberto Gil em 2004 e não 2005, quando foi rebaixada – inclusive fui finalista de samba daquele ano. E a homenagem de Lucas a Elisete Cardoso foi em 1974, não 75.

Mas é documento indispensável para aqueles que pensam que as escolas de samba se resumem ao “mundo encantado da Sapucaí”.

Em resumo, os três livros valem bastante a pena. Recomendo.

Cine Debate PortelaWeb

Acabei não conseguindo escrever o post na semana passada, mas quero registrar aqui a iniciativa do Centro Cultural Cartola e do site PortelaWeb de trazer alguns dos principais personagens do desfile de 95 para relembrar a preparação do mesmo e falar um pouco sobre o carnaval atual.

Diga-se de passagem, o acervo do Centro Cultural sobre o carnaval (que eu não conhecia) e sobre o grande gênio Cartola são dignas de aplausos, com itens representativos.

O vídeo acima, com cerca de nove minutos, fala sobre a bateria de 95 – e a então inédita “paradinha” na Portela – e sobre o trabalho do mestre sala Jerônimo, que aliás deu ótimas declarações durante o debate.

Ótima iniciativa.

Promoção

Pensa que acabou, leitor?

O Ouro de Tolo tem três exemplares autografados dos livros para sortear: um de cada. Para participar baixa deixar na área de comentários deste post nome completo, cidade, e-mail, escola de samba pela qual torce e indicar qual dos livros gostaria de ganhar.

Publicarei o resultado na próxima segunda feira, dia 12. Participe!

19 Replies to “Resenha Literária – "Cadernos de Samba"”

  1. Migão, o enredo sobre Gilberto Gil foi realmente em 2005. A escola foi rebaixada em 2006, com o enredo sobre o Chopin.

  2. Fui no lançamento também, somente comprei o Tantas Páginas Belas, do Simas, devidamente autografado.

    Rafael Ferreira da Silva Neto
    Rio de Janeiro – RJ
    rafaelfsn@gmail.com
    Torço pela gloriosa União da Ilha do Governador
    Livro escolhido: Marcadas para Viver

    um abraço

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