Semana passada o Rio de Janeiro foi uma vez mais sacudido por uma crise em sua Polícia Militar.
Como reflexo das investigações sobre o assassinato da juíza Patrícia Accioli, o ex-comandante geral da Polícia Militar Mário Sérgio Duarte pediu demissão e foi substituído no cargo pelo também coronel Erir da Costa Filho (foto).
Erir, para quem não se lembra, foi o comandante punido após ter denunciado que o atual deputado estadual Chiquinho da Mangueira tivera ido em sua sala pedir que “pegasse leve” com a repressão ao tráfico de drogas no morro da Mangueira, um dos currais eleitorais do deputado. Naquela ocasião ele comandava o batalhão da Polícia Militar em São Cristóvão e a pedido do deputado foi exonerado pela então governadora Rosinha Garotinho – em clara inversão de valores.
Agora o coronel foi reabilitado e assume o comando geral da corporação devido especialmente à sua fama de honesto. Infelizmente, honestidade é artigo que tem andado em falta na polícia carioca, como já explanado fartamente por livros, filmes e declarações.
O comandante anterior optou por pedir demissão ao saber do envolvimento do então comandante do batalhão da Maré e ex de São Gonçalo Cláudio Luiz de Oliveira, acusado de ser o mandante da morte da juíza. Também contribuiu matéria publicada em jornal carioca dando conta que o mesmo batalhão de São Gonçalo estava envolvido em práticas como desvio de dinheiro apreendido em operações e revenda de armas tomadas de bandidos.
Na última semana já foram trocados nada menos que treze comandantes de batalhões – no momento em que escrevo, madrugada de domingo – em busca de uma maior probidade no comando da tropa. Sem dúvida alguma é uma tentativa de tornar mais honesta e mais efetiva a polícia carioca, mas há dúvidas se tal processo se tornará efetivo.
Pelo menos observando de fora, a impressão que se tem é que o comandante anterior ou era peça decorativa ou estava conivente com os evidentes desvios de conduta. Com a troca tenta-se estabelecer um padrão moral mais elevado, somado a medidas como alargamento das investigações sobre a evolução patrimonial de policiais e o reforço do papel da corregedoria.
Entretanto, luta-se contra uma moral deformada que vem há pelo menos cinquenta anos dominando as polícias cariocas. Criou-se uma cultura de impunidade, de tortura e de confusão entre o público e o privado que não se consegue derrotar na base da “canetada”.
Outro aspecto que deve ser observado é a questão salarial. Como já escrevi aqui anteriormente, um soldado que ganhe R$ 900 atualmente fica muito mais suscetível ao “canto da sereia” do ganho fácil representado pela corrupção. Urge uma melhoria salarial a fim de tornar mais palatável a vida cotidiana do PM e assim tornar menos atrativa a vida no crime.
Além disso, com um salário melhor passa-se a atrair pessoal mais qualificado, com maior capacidade para responder de forma adequada em situações de stress. Hoje um dos grandes problemas da corporação,em minha visão de leigo, é a falta de preparo e de sangue frio em situações limítrofes.
Cabe analisar também a postura do secretário de segurança do Rio de Janeiro José Mariano Beltrame. Ele parece imprensado entre uma cúpula estadual com várias suspeitas de atos não muito republicanos – para se dizer o menos – e uma corporação habituada há muito com práticas heterodoxas, ao arrepio da lei. A impressão é que ele tenta dentro de seus limites impor uma cultura de respeito à lei na segurança pública carioca.
Vale ressaltar também que o projeto das UPPs – Unidades de Polícia Pacificadora – começa a esbarrar em um limite há muito alertado por especialistas: que ocupação por tempo indeterminado não resolve a questão.  Sem políticas de inclusão das comunidades e de alternativas de geração de emprego e renda que tornem ruins a opção pelo tráfico, a tendência é uma lenta deterioração das condições nestas comunidades – e o retorno de práticas criminosas.
Além disso começam a pulular casos de corrupção nestas unidades, fruto do excessivo poder dado a estes policiais ocupantes e dominadores. É sintomático o fato desta última grande “dança de cadeiras” ter alcançado comandantes deste tipo de política.
Resta-nos torcer para que a troca de comando possa significar uma “faxina” efetiva nos quadros da instituição. Entretanto, a impressão é que a corrupção, os desmandos e a arbitrariedade estão arraigados de tal forma que somente algo do tipo “zerar e começar de novo” é que irá resolver a questão.
O que nós como cidadãos podemos esperar e cobrar é uma Polícia mais honesta, mais preparada e menos arbitrária. Mas o tempo para isso acontecer parece bastante longe.
Sorte ao novo Comandante Geral.