Depois de uma segunda-feira épica em 2016, as expectativas para os desfiles das escolas de samba do Grupo Especial em 2017 eram muito grandes. Afinal, após anos de enredos e sambas questionáveis, as apresentações do ano anterior, sobretudo as do segundo dia, agradaram em cheio aos amantes do samba.

A crise econômica e política – para não dizer moral – do país, se por um lado fazia os mais céticos preverem um carnaval sem a mesma pujança de outros anos, por outro poderia proporcionar escolhas de enredos mais autorais e menos patrocinadas, além de provocar mais ênfase ao chão de cada escola.

Com o carnavalesco Leandro Vieira em alta após o título de 2016, a Estação Primeira de Mangueira escolheu um enredo sobre o sincretismo religioso, com mais um samba de qualidade. Já a vice-campeã Unidos da Tijuca faria uma exaltação à música dos Estados Unidos num estilo que, segundo os críticos, era um legado de Paulo Barros na escola.

Este, em seu segundo ano como carnavalesco da Portela, iria desenvolver um enredo sobre os rios do mundo, inspirado na antológica canção “Foi um rio que passou em minha vida”, do histórico portelense Paulinho da Viola. Mas ainda em setembro de 2016, a Portela recebeu um duro golpe com o assassinato do presidente Marcos Falcon. O vice Luis Carlos Magalhães assumiu o cargo.

O Salgueiro do casal Renato e Márcia Lage levaria para a Sapucaí o enredo “A Divina Comédia do Carnaval”. O melhor samba-enredo do ano era o da Beija-Flor, que teria um enredo sobre o romance “Iracema”, de José de Alencar. A Imperatriz Leopoldinense exaltaria os índios do Xingu e alertaria contra a devastação da região – o setor do agronegócio reclamou contra uma suposta crítica direta no samba-enredo.

A Acadêmicos do Grande Rio resolveu homenagear Ivete Sangalo e recebeu inicialmente uma saraivada de críticas, mas a participação da cantora baiana em ensaios da escola e o engajamento dela na preparação acalmaram as coisas. A Vila Isabel tentaria se reerguer com o enredo “O som da cor”, sobre a música negra, mas a escola tinha problemas financeiros.

Já a São Clemente de Rosa Magalhães teria um enredo de nome estranho chamado “Onisuáquimalipanse”, sobre a história de um grande baile ocorrido na Corte de Luís XVI. A Mocidade Independente de Padre Miguel homenagearia o Marrocos, o que também gerou desconfiança inicial, mas a escolha do samba-enredo agradou muito à crítica.

Completavam o Grupo Especial a União da Ilha, com um enredo afro sobre o candomblé, focado na cultura banto de Angola – o samba era um dos melhores do ano – e o Paraíso do Tuiuti, de volta à elite após 16 anos com um enredo sobre a tropicália.

OS DESFILES

A bem da verdade, uma agradável surpresa atendeu pelo nome de Paraíso do Tuiuti. Com o inteligente enredo “Carnavaleidoscópio Tropifágico”, o carnavalesco Jack Vasconcelos fez um elogiado trabalho, tanto na exposição da ideia, como na divisão cromática, multicolorida como o enredo exigia, e na concepção de alegorias e fantasias.

O desfile passeou pelo movimento tropicalista e homenageou personalidades como Carmen Miranda, o cineasta Glauber Rocha e o escritor Mário de Andrade. Mas um dos grandes exaltados no enredo foi Chacrinha, lembrado em diversos momentos da apresentação. Caetano Veloso e Gilberto Gil, ícones da tropicália nos anos 1960, também foram homenageados. Caetano, por sinal foi o tema do interessante carro “Caetanave”, com um trio elétrico espacial.

Agradaram também as alegorias que faziam referência a fauna e flora brasileira, sobretudo o abre-alas, que teve representações de animais oriundos de misturas de aves e mamíferos. O carro “Brasil Canibal” tinha uma escultura que simbolizava o Abapuru, obra de Tarsila do Amaral.

No entanto, infelizmente uma tragédia manchou irremediavelmente a apresentação da Tuiuti. Com a escola já enrolada na evolução, o belo último carro alegórico (“Tropicarnafagia”) ficou desgovernado na pista molhada após bater no muro esquerdo ainda no começo da pista e imprensou dezenas de pessoas no muro direito, deixando vinte feridos.

O caso mais grave foi o da radialista Elizabeth Jofre, a Liza Carioca. Como repórter de pista da rádio Ativa FM, ela estava na área próxima à concentração quando foi atropelada. Liza Carioca passou por sete cirurgias mas acabou perdendo a luta pela vida no dia 29 de abril, depois de quase dois meses de internação.

Quatro pessoas foram indiciadas pela Polícia Civil por imperícia, imprudência e negligência: o engenheiro Edson Gaspar e os diretores de Carnaval, Leandro Azevedo, e de Alegorias, Jaime Benevides, e o motorista Francisco de Assis, este também indiciado por lesão corporal culposa – ele alegou dificuldades em enxergar a pista. A escola evitou a perda de pontos na cronometragem, mas certamente teria problemas na apuração, fora as questões relativas ao acidente na esfera jurídica.

Segunda agremiação a desfilar, apesar do atraso considerável causado pelo acidente a Acadêmicos do Grande Rio entrou com força na avenida para homenagear Ivete Sangalo. A cantora deu o grito de guerra e desfilou na comissão de frente. Ivete interagiu bastante com o público e esbanjou a mesma energia de seus shows.

Desenvolvido pelo carnavalesco Fábio Ricardo, o enredo “Ivete, do rio ao Rio” passeou pela vida da cantora desde a infância em Juazeiro até a consagração como uma das artistas mais populares do Brasil.

O samba-enredo não era dos mais bem avaliados pelos críticos na fase pré-carnavalesca, mas tinha um refrão principal bastante animado e foi bem cantado pela escola. Boa parte das alas era coreografada, representando os maiores sucessos da cantora, mas não houve problemas mais graves no quesito Evolução.

Entre as alegorias, o destaque foi o elemento futurista que abordava a fase de Ivete na Banda Eva. Por outro lado, a penúltima alegoria do desfile, que carregava uma porção de artistas, teve danos na cabeça de uma das esculturas, o que poderia ser uma preocupação para a apuração. No entanto, os figurinos estavam em nível elogiável e passavam bem o enredo.

Numa operação bastante arriscada, Ivete, tão logo chegou ao fim da pista, foi levada novamente para a concentração para entrar na última alegoria. Incansável, a estrela foi bastante aplaudida pelo público, que esteve um tanto mais frio durante o restante da apresentação da Tricolor.

A Imperatriz Leopoldinense foi a terceira a entrar na avenida e fez uma correta apresentação na defesa do enredo “Xingu, o clamor que vem da floresta!”. O carnavalesco Cahê Rodrigues dividiu bem o enredo com alegorias e fantasias que tinham tons fortes nas plumas.

O samba, embora não fosse empolgante, descrevia o enredo e criticava a exploração da região do Xingu, sobretudo à construção da hidrelétrica de Belo Monte, ao desmatamento e ao uso de agrotóxicos. Havia alas que deixavam o tom crítico bastante evidente, como “Fazendeiros e seus Agrotóxicos”, “Pragas e Doenças” e a “Chegada dos Invasores”. A comissão de frente com índios e uma oca estava muito bem fantasiada.

Setores do agronegócio “acusaram o golpe” e manifestaram desagrado com a letra do samba e o desenvolvimento do enredo. Cahê Rodrigues respondeu às reclamações e disse que o “o enredo não era um conto de fadas, mas uma história real”.

O samba cantado pelo estreante intérprete Arthur Franco foi sustentado por uma excelente bateria comandada pelo Mestre Lolo. As paradinhas empolgaram o público, e a expectativa era a de notas máximas na apuração.

Nas alegorias, o abre-alas chamado “Templo Sagrado” simbolizava o Kuarup e tinha como um dos destaques o Pajé Sapain, de 102 anos, grande liderança do Xingu. A fauna amazônica foi representada no segundo elemento, com destaque para um enorme jacaré e uma ararinha-azul gigante que ia até 14 metros de altura.

Apesar de pequenos descompassos de evolução, a Imperatriz deixou a pista com expectativas de pelo menos voltar ao sábado das campeãs pelo quinto ano consecutivo. Dependeria, claro, do desempenho das demais escolas.

A Unidos de Vila Isabel chegou à avenida com o enredo “O som da cor”, sobre a influência negra na música e na dança, desde o jazz, rock, cumbia, reggae, tango e o samba. Para apresentar o enredo, o carnavalesco Alex de Souza lembrou diversos momentos vividos pelos negros em diferentes partes do mundo.

O abre-alas, por exemplo, representava um grande navio negreiro que levou africanos para a América. Uma das alegorias lembrava do tango e contava com oito casais simbolizando a localidade do Caminito, em Buenos Aires.

Outro elemento era chamado “Kizomba”, sobre o épico desfile de 1988, e tinha o primeiro e único Martinho da Vila como destaque usando figurino semelhante ao do cortejo original. Outro carro representava a música pop, com um componente fantasiado de Michael Jackson.

A divisão cromática respeitou as cores azul e branca da escola principalmente na primeira parte. No entanto, a Vila atravessava dificuldades financeiras, com bloqueio de contas e ameaça de despejo da quadra, e isso se refletiu num visual irregular, ora grandioso e tecnológico, ora com problemas de acabamento.

O samba-enredo era muito bonito, com a obra de Arthur das Ferragens e parceiros tendo derrotado nas eliminatórias o samba do multicampeão André Diniz. No entanto, na avenida o público não teve a interação que se esperava.

Outro problema foi a quebra do abre-alas já na dispersão, o que dificultou a evolução das últimas alas; estas tiveram de desviar do elemento. De qualquer forma, apesar de alguns problemas, foi um desfile bastante digno da Vila num ano difícil.

Sempre muito esperado, o Salgueiro demorou um pouco a entrar na pista devido ao derramamento de óleo por uma alegoria da Vila Isabel. Foi necessário o uso de serragem no asfalto para que houvesse condições de uma boa evolução dos componentes.

A dupla de carnavalescos formada por Renato e Márcia Lage apresentou o enredo “A Divina Comédia do Carnaval”, que relembrou antigos carnavais celebrando a obra de Dante Alighieri, num tempo em que a festa era associada às tentações e diabruras.

Diversas fantasias tinham um tom sombrio ou assustador, com muitos fantasmas, diabos e morcegos. Os carnavalescos fizeram menção aos pecados capitais de forma bem humorada e com um conjunto estético bastante elogiado pela crítica, bem como a explanação do enredo. O contraste entre o Purgatório e o Paraíso ficou evidente na divisão das alas, e a última alegoria deixava uma mensagem positiva.

O samba-enredo dos mesmos autores da “pedrada” de 2016 desta vez não teve a explosão que poderia se imaginar, embora tenha sido bem cantado pelos desfilantes. A Vermelho e Branco também se apresentou bem no quesito Evolução, depois de alguns anos em que teve problemas.

Inegavelmente, em dois quesitos o Salgueiro poderia ir “tranquilo” para a apuração: Bateria, com mais uma grande exibição dos componentes liderados pelo Mestre Marcão, e Mestre-Sala e Porta-Bandeira, com mais uma apresentação de qualidade do casal formado por Marcella Alves e Sidclei.

A Vermelho e Branco deixou a pista como a melhor escola até então e mais uma vez estava na briga pelas primeiras colocações, embora não tenha feito um desfile tão quente como o de 2016.

A Beija-Flor de Nilópolis encerrou a primeira noite de desfiles pouco antes do amanhecer, devido ao atraso após o acidente com o carro do Tuiuti. O enredo “A Virgem dos Lábios de Mel – Iracema” rendeu polêmica: a Deusa da Passarela apresentou uma proposta ousada, a de desenvolver o enredo na pista por grandes setores, e não alas convencionais.

O começo e o fim da história eram retratados pela comissão de frente, que tinha canoas que se transformavam em ondas, num interessante efeito visual. Já os setores contavam o desenlace da obra de José de Alencar, como o encontro entre Iracema e o guerreiro português Martim, e os confrontos entre os índios tabajaras e pitiguaras, com o desfecho no Ceará.

Em termos de alegorias, a concepção e acabamento foram bastante elogiados. No entanto, a opção da divisão por setores foi criticada, já que havia centenas de índios vestidos de forma diferente, formando imensos “blocões” multicoloridos.

O excesso de vestimentas de índios causou o questionamento de uma possível monotonia visual, embora os figurinos estivessem plenamente de acordo com a proposta do enredo. Houve ainda críticas dos mais tradicionalistas pela forma como o desfile foi desenvolvido.

O samba-enredo era considerado o melhor do ano pela crítica, com excelentes letra e melodia. A bateria tocou samba de verdade, com uma cadência extremamente elogiável e paradinhas bem pontuadas ao longo do desfile.

A segunda noite de desfiles foi aberta pela União da Ilha do Governador. A querida escola levou para a avenida um enredo afro, fora das suas características, portanto, chamado “Nzara Ndembu – Glória ao Senhor Tempo”. Foram mostradas as tradições, lendas, mitos e deuses de Nzambi Mpungu, o criador do universo. Segundo a lenda, ele teria convocado o rei de Angola, Kitembo, e o transformou no senhor do tempo cronológico e mítico.

A Tricolor Insulana se apresentou com muitas mudanças em sua equipe, a começar pelo carnavalesco, Severo Luzardo, além da comissão de frente, liderada por Carlinhos de Jesus, e no casal de mestre-sala e porta-bandeira, formado por Phelipe Lemos e Dandara. A comissão ganhou o Estandarte de Ouro, enquanto a dupla levaria 30 pontos na apuração.

O samba-enredo também era um dos mais elogiados da safra e foi puxado mais uma vez pelo excelente Ito Melodia, que levou mais um estandarte para a sua coleção. A bateria também se destacou, com Mestre Ciça recuperando a tradicional batida insulana das caixas de guerra – os ritmistas conduziram a Ilha também ao prêmio de “O Globo”.

O desfile começou com a comissão de frente retratando a criação do universo, e o belíssimo abre-alas, chamado “Templo da Criação”, o complementava. O segundo carro, “Nova Era na Terra”, tinha tons de dourado e mantinha a concepção imponente. O elemento seguinte era dedicada à Kukuana, festa com danças, rezas e comidas para curar as doenças. Na sequência, a quarta alegoria retratava o “esplendor aquático” e tinha outra concepção, com néon.

Infelizmente, o quinto carro alegórico, chamado “O Fogo de Uiangongo”, teve problemas para ser manobrado durante toda a avenida devido a um problema na caixa de marchas. Logo na entrada na Sapucaí, a ala à frente se adiantou demais, e a evolução teve buracos (abaixo), o que comprometeu a até então ótima apresentação da Ilha.

Por diversas vezes, o elemento parou, mas numa das retomadas, parecia que o carro estava desgovernado. A duras penas, a escola encerrou sua apresentação no limite dos 75 minutos. Não perdeu pontos em cronometragem, mas certamente perderia no quesito Evolução. Uma lástima!

A São Clemente da consagrada Rosa Magalhães apresentou uma temática à feição da carnavalesca: “Onisuáquimalipanse” (que significa “Envergonhe-se quem pensar mal disso”). O nome parecia estranho, e era, mas o enredo era extremamente interessante.

Tratava-se da história da construção de um palácio em 1653 por Nicolas Fouquet, ministro das finanças do rei francês Luís XIV. A obra era tão luxuosa e mais imponente que a do seu palácio, que o rei duvidou da honestidade de seu ministro, e o condenou à prisão perpétua, além de lhe confiscar os bens.

A aposta de Rosa, que por sinal desfilou no belíssimo abre-alas que reproduzia o palácio, foi desenvolver um conjunto visual leve, multicolorido e ao mesmo tempo bem acabado, sem abusar da opulência que poderia se esperar de um tema desse tipo. Nesse sentido, a opção foi correta, o que facilitou o entendimento da proposta.

 A irreverência foi reproduzida em diversas alas, como por exemplo a dos presidiários que tinham inscrições com o número 171, o que representa no Código Penal o crime de estelionato.

O samba-enredo, que tinha entre os autores os craques Luís Carlos Máximo e Toninho Nascimento, contava bem o enredo, mas a escola não fez uma apresentação das mais inspiradas nos quesitos Harmonia e Evolução. Diante disso, a escola prometia ficar na “zona da marola”.

Em seguida, a Mocidade Independente de Padre Miguel finalmente fez um desfile à altura das suas tradições e se credenciou a brigar pelas primeiras colocações depois de muitos anos. O enredo “As mil e uma noites de uma ‘Mocidade prá lá de Marrakesh'” homenageava Marrocos e qualquer desconfiança que pudesse se ter em relação ao tema se desfez rapidamente.

A começar pelo excelente samba-enredo, escrito por Altay Veloso, Paulo César Feital, Zé Paulo Sierra, Zé Glória, J.Giovanni e Dadinho. Com melodia e letra inspiradas, a obra invocava ao congraçamento entre pessoas de diferentes crenças, como no verso “Fui ao deserto roncar meu tambor / Pra Alah conhecer meu Xangô”. O cantor Wander Pires estava de volta para sua quinta passagem pela escola.

O público recebeu muito bem a escola desde o começo do desfile, e a bateria de Mestre Dudu também foi bastante elogiada, primeiro pelo andamento tradicionalíssimo, de autêntico samba, e segundo pelas interessantes bossas e paradinhas.

No entanto, nada chamou mais a atenção no desfile da Mocidade do que a comissão de frente. Não apenas pela coreografia em si ou pelos homens beduínos e odaliscas. mas por um Alladin num tapete voador! Claro que era um truque de ilusão de ótica, muito bem bolado pela escola, por intermédio de um aeromodelo ornamentado como um antigo tapete, com a figura do ator Giovanni Cabral num papelão.

Fora isso, Marrocos foi muito bem retratada na Sapucaí num conjunto alegórico imponente, O abre-alas representava uma caravana de mercadores, com camelos dourados à frente. Além de Alladin, o enredo também lembrava Simbad e Ali Babá, e ainda passeava pela astronomia, gastronomia e exaltava a sabedoria dos marroquinos. O desfile se encerrou com uma mensagem positiva por intermédio de um oásis de samba.

Houve apenas um incidente mais delicado no desfile, quando aos 50 minutos um “queijo” quebrou, e uma destaque caiu. No entanto, a queda foi de apenas um metro e meio, e a componente não se machucou. A Mocidade seguiu muito bem seu desfile até o fim, e foram ouvidos os primeiros gritos de “é campeã” no Carnaval de 2017.

Sempre uma força nos anos anteriores, a vice-campeã Unidos da Tijuca se exibiu com o enredo “Música na alma, inspiração de uma nação”, sobre a música americana. Desenvolvido por uma comissão de carnaval, o desfile parecia bastante promissor, mas um incidente gravíssimo pôs tudo a perder.

Com menos de dez minutos de desfile, a segunda alegoria, chamada “Nova Orleans – Cidade do Jazz”, teve o colapso do topo (segundo andar), o que deixou 15 feridos, alguns em estado de choque. Os bombeiros entraram no meio do desfile e ordenaram a parada da alegoria, para que os componentes fossem retirados. Pelo menos, ao contrário do acidente no desfile da Paraíso do Tuiuti, ninguém ficou ferido com mais gravidade. Um alívio.

A escola ficou praticamente 30 minutos parada até que a evolução seguisse, com as alas seguintes passando pelos lados do carro. A escola ainda tentou tirar o elemento pela lateral da pista, sem sucesso. Quando finalmente os feridos foram retirados, a alegoria prosseguiu com os demais componentes sentados com medo de novos incidentes. Além disso, bombeiros atravessaram a pista em cima no carro.

Evidentemente, a escola teve graves problemas nos quesitos Evolução e Harmonia, até porque, apesar de os componentes seguirem desfilando, o abatimento era visível. Ressalte-se o profissionalismo exemplar e a garra do cantor Tinga, que entoou o criticado samba-enredo recheado de termos em inglês a plenos pulmões para que a escola encerrasse sua apresentação com dignidade.

Além evidentemente do desastre em si e da quantidade de feridos, o acidente foi lamentável porque as alegorias e fantasias de fácil leitura, com homenagens a astros como Elvis Presley, Michael Jackson e Beyoncé, sem contar as citações ao cinema e à própria cultura pop americana.

Com todos esses problemas, a comissão de frente só chegou ao fim da pista com 50 minutos de desfile, e a bateria não foi para o segundo box. Claro que a evolução passou a ser apressada, e a Tijuca encerrou seu caótico desfile com 76 minutos, surpreendentemente apenas um acima do limite. Mas a perda desse décimo era irrisória perto do que poderia ser perdido nos demais quesitos. A possibilidade de rebaixamento era dada como muito provável.

Após bater na trave nos anos anteriores, a Portela entrou mordida na avenida. O carnavalesco Paulo Barros desenvolveu um enredo sobre os rios do planeta. Inicialmente, o título do enredo seria “Foi um rio que passou em minha vida e meu coração se deixou levar…”, mas temia-se alguma pendenga em relação aos direitos autorais da famosa canção de Paulinho da Viola. Prevaleceu então o nome “Quem nunca sentiu o corpo arrepiar ao ver esse rio passar…”, verso do samba enredo composto pela parceria capitaneada por Samir Trindade.

No enredo, foi destacada a importância dos rios para a humanidade. A comissão de frente representou o fenômeno da piracema, na qual os peixes encaram a correnteza para se reproduzirem. O abre-alas com a inigualável água era chamada “Fonte da Vida” e simbolizava as nascentes dos rios.

A vida das comunidades ribeirinhas desde as antigas civilizações foi muito bem retratada na divisão de alas e fantasias, além das lendas e costumes oriundos dos rios. Os seres que vivem nos rios não ficaram fora do enredo, no qual Paulo Barros respeitou as tradições da escola mas com uma roupagem mais moderna.

Em termos de alegorias, o grande destaque foi a que lembrava a tragédia do rompimento da barragem da mineradora Samarco no município mineiro de Mariana, em 2015. No elemento, esculturas de pescadores desesperados com os braços erguidos aos céus eram o retrato perfeito do inaceitável desastre, no qual dejetos de minérios da Samarco contaminaram os rios da região.

A crítica contundente pela morte de 19 pessoas e de milhares de peixes ainda teve uma ala com os componentes sujos de lama carregando placas com as palavras “crime, desespero, ganância, justiça e sem água.

Nos quesitos de pista, a Portela foi a melhor escola de 2017, com um excelente desempenho em Harmonia e Evolução. O samba-enredo foi puxado por Gilsinho com a competência de sempre, e a Tabajara do Samba era praticamente uma certeza de pontuação máxima.

Com uma apresentação praticamente irretocável, a Portela chegou à Praça da Apoteose como fortíssima candidata ao título, não só pela forma impecável como o enredo foi transmitido, como também pela excelência nos quesitos e pela receptividade do público.

Assim como em 2016, a Mangueira encerrou os desfiles e o fez de maneira brilhante. O enredo “Só com a ajuda do santo”, do carnavalesco Leandro Vieira, mostrou os diferentes credos do povo brasileiro, desde o catolicismo, passando pelas religiões afro-brasileiras e exaltando os santos e orixás.

A exemplo do que ocorrera no ano anterior, a divisão cromática da Verde e Rosa pendeu para tons mais suaves, o que rendeu lindo efeito. Entre tantos figurinos interessantes, destacaram-se as criativas fantasias da ala das baianas, com diversos saquinhos de doces distribuídos no dia de São Cosme e São Damião.

Duas famosas mangueirenses, Beth Carvalho e Alcione, foram destaques em lindas alegorias. A primeira, no elemento que homenageou Iemanjá. Já a Marrom foi ovacionada no carro sobre São João. Infelizmente a alegoria teve furo nos pneus e foi conduzido com muita dificuldade pela pista, o que fez um clarão ser aberto na evolução no meio da pista, o que poderia custar muito caro na apuração.

Uma das imagens mais simbólicas de todo o carnaval foi o tripé que representava Jesus Cristo de um lado e Oxalá do outro. Além de muito bem realizado esteticamente, foi um símbolo perfeito do sincretismo religioso traduzido pelo enredo. Foi uma demonstração evidente de que é possível conciliar beleza e singeleza sem luxo excessivo e opulência.

O samba-enredo teve novamente boa aceitação por parte do público, com a bateria tendo andamento adequado e se arriscando em algumas paradinhas – os ritmistas vinham vestidos de São Francisco de Assis e tinham o corte de cabelo característico da ordem dos franciscanos.

O povão foi atrás da Verde e Rosa quando amanhecia, num belo espetáculo que encerrou de forma positiva o conturbado carnaval de 2017.

Série A

O desfile da Série A, realizado nos dias 24 e 25 de fevereiro, teve como destaque absoluto o desfile da Unidos de Padre Miguel (acima, o abre alas). Com o enredo “Ossain, o Poder da Cura”, a agremiação fez um desfile histórico neste grupo, com um lindo samba, alegorias e fantasias grandiosas e impactantes e Harmonia e Evolução compactas, fazendo uma apresentação bastante superior à do restante do grupo. Entretanto, a porta-bandeira Jéssica caiu e sofreu uma entorse no joelho exatamente quando se apresentava em frente à cabine dupla. A agremiação conquistou os Estandartes de Ouro tanto de Melhor Escola como de melhor Samba Enredo da Série A neste ano.

Assim, o Império Serrano, que apresentou o enredo “Meu Quintal é Maior que o Mundo”, sobre o Pantanal mato-grossense, conquistou o título perdendo apenas dois décimos na apuração – apesar de diversos pequenos problemas como alas sem a totalidade de chapéus e sapatos diferentes, além de queijos sem integrantes em carros, por exemplo. O Império Serrano foi seguido pela Viradouro e pela Estácio de Sá, que homenageou o grande Gonzaguinha. A União do Parque Curicica foi a única agremiação rebaixada.

Também devem ser citadas as homenagens da Acadêmicos da Rocinha ao carnavalesco Viriato Ferreira e da Acadêmicos da Cubango ao centenário do cantor e compositor João Nogueira.

Em que pese o desfile histórico que fez, a Padre Miguel terminou apenas num distante quarto lugar, a nove décimos da campeã. Mesmo que tivessem sido descontados os décimos perdidos no quesito Mestre-Sala e Porta-Bandeira, a escola perderia o título para o Império Serrano no desempate em Evolução.

No Desfile das Campeãs, os casais de Portela e Império Serrano desfilaram juntos, a convite da diretoria da Águia (abaixo).

REPERCUSSÃO E APURAÇÃO

A Mangueira foi agraciada pelo jornal “O Globo” com o bicampeonato do Estandarte de Ouro como Melhor Escola. Mas a Portela, com sua forte apresentação, também era tida como favorita ao campeonato, assim como o Salgueiro, também correto nos quesitos. A Mocidade era apontada como possível surpresa, enquanto a Beija-Flor era uma incógnita devido à proposta inovadora de seu desfile.

Mas antes da apuração, as atenções de fato estavam voltadas para a repercussão dos lamentáveis acidentes nos desfiles do Paraíso do Tuiuti e da Unidos da Tijuca. Enquanto os feridos se recuperavam, começaram as investigações para apurar os responsáveis.

Nos bastidores, o presidente da Liesa, Jorge Castanheira, garantia que o regulamento seria cumprido à risca e haveria descenso. Mas não foi isso que aconteceu… Horas antes da apuração, representantes das escolas se reuniram e houve um acerto para que não houvesse rebaixamento. Apenas a Mocidade votou contra, enquanto a Imperatriz não participou do encontro.

Quando a decisão foi anunciada pouco antes da apuração na Praça da Apoteose, houve muitas vaias, mas nada mais havia a ser feito a não ser aguardar as notas. E foi uma apuração das mais surpreendentes dos últimos anos.

Apenas Mangueira e Portela obtiveram pontuação máxima nos quatro primeiros quesitos (Alegorias e Adereços, Bateria, Fantasias e Samba-Enredo), com a Mocidade colada a 0,1. Chamou a atenção dos críticos o fato de a Tijuca ter perdido apenas 0,5 em Alegorias e Adereços mesmo após o acidente com o carro.

A escola de Padre Miguel assumiu a liderança no quinto quesito (Comissão de Frente) ao obter pontuação máxima, enquanto a Portela perdeu 0,1 e surpreendentemente a Mangueira foi despontuada em 0,2.

Nos três quesitos seguintes (Evolução, Harmonia e Mestre-Sala e Porta-Bandeira), a Mocidade somou todos os pontos possíveis, assim como Portela e Salgueiro, que ultrapassou a Mangueira – esta, diga-se, perdeu apenas 0,1 em Evolução, mesmo após a cratera durante seu desfile.

Com a leitura das notas de enredo, deu-se a virada portelense. A Mocidade recebeu dois 9,9 e teve descontado 0,1, enquanto a Águia tirou apenas 10. Em meio às lágrimas, gritos e o canto do samba-enredo, enfim estava quebrado o incômodo jejum da Portela.

“Nós merecemos muito. Nós trabalhamos muito. Nós somos a que merecemos mais. Porque todas as escolas precisam da vitória da Portela. Porque elas serão muito maiores com a Portela forte. O Carnaval precisa da Portela. A cultura brasileira precisa da Portela. O brasileiro precisa da Portela.  Mangueira, a Grande Rio, a Beija-Flor, todas elas serão muito mais fortes conosco, porque nós também precisamos delas para levantar a bandeira do samba. A vitória não é só da Portela, é de todas as escolas que precisam levantar a bandeira do samba”, comemorou Luis Carlos Magalhães.

A Mocidade deixou a apuração com o segundo lugar, seguido por Salgueiro, Mangueira, Grande Rio e Beija-Flor, que completaram o sábado das campeãs. Depois de tudo o que aconteceu, a Tijuca ainda terminou em penúltimo lugar, com o Paraíso do Tuiuti fechando a tabela.

Passada a euforia portelense, como de costume as escolas aguardaram as justificativas das notas pelos jurados. Tão logo foram divulgadas as argumentações, no dia 20 de março, a história do Carnaval de 2017 seria reescrita.

O julgador Valmir Aleixo (Enredo) justificou a perda de um décimo da Mocidade porque faltava um destaque no abre-alas. Mas o julgamento teria se baseado em informações da primeira edição do roteiro das escolas enviado à Liesa. Só que a Mocidade alegou ter mandado uma atualização do caderno, no qual não havia mais a presença do destaque e, inexplicavelmente, Aleixo não teria recebido a atualização. Se a Verde e Branco tivesse obtido 10, empataria em pontos com a Portela, mas teria sido campeã isolada pelo desempate em Comissão de Frente, no qual a Águia havia sido despontuada.

A Mocidade entrou com recurso na Liesa pedindo a divisão do campeonato devido à justificativa de Valmir Aleixo. Foi convocada para o dia 5 de abril uma reunião extraordinária na liga para discutir o caso, e, numa tensa plenária, sete escolas votaram a favor da divisão (Vila Isabel, Grande Rio, União da Ilha, Paraíso do Tuiuti, Mangueira, São Clemente e Mocidade), enquanto quatro se abstiveram (Imperatriz, Beija-Flor, Unidos da Tijuca e Salgueiro), e só a Portela votou contra.

Três dias depois, a Mocidade comemorou o fim de seu jejum de 21 anos sem títulos com uma grande festa na quadra da Avenida Brasil e a presença de 8 mil pessoas.

Do outro lado, a Portela chegou a cogitar recorrer da divisão, alegando que a reunião infringira o estatuto da própria Liesa e o regulamento, segundo parecer do consultor jurídico Sylvio Capanema de Souza e do diretor jurídico da liga, Nelson de Almeida. No fim, a escola optou por não ir adiante:

“Por não desejar que os atuais precedentes prevaleçam, ensejando enxurradas de medidas judiciais, e por considerar que a adoção de tais medidas atingirá ainda mais a credibilidade dos resultados, a Portela, ouvidos seus baluartes e segmentos, decide não buscar a solução da questão fora dos limites da entidade a que pertence, e da qual é uma das fundadoras”, dizia a nota divulgada pela Águia.

Nas redes sociais, houve discussões bastante acirradas entre portelenses e independentes, mas aos poucos os ânimos serenaram. No dia 21 de janeiro de 2018, a Portela recebeu a Mocidade em sua quadra e os dirigentes selaram a paz.

RESULTADO FINAL

POS. ESCOLA PONTOS
Portela 269,9
Mocidade Independente de Padre Miguel 269,9
Acadêmicos do Salgueiro 269,7
Estação Primeira de Mangueira 269,6
Acadêmicos do Grande Rio 269,4
Beija-Flor de Nilópolis 269,2
Imperatriz Leopoldinense 268,5
União da Ilha do Governador 267,8
São Clemente 267,4
10º Unidos de Vila Isabel 267,4
11º Unidos da Tijuca 266,8
12º Paraíso do Tuiuti 264,6

CURIOSIDADES

– Nas semanas seguintes ao Carnaval, deu-se uma incrível dança das cadeiras entre os carnavalescos: Renato Lage deixou o Salgueiro depois de 15 carnavais e foi para a Grande Rio; a Vermelho e Branco ficou com Alex de Souza, que deixou a Vila Isabel para a chegada do campeão Paulo Barros; já a Portela ficou com Rosa Magalhães, cuja vaga na São Clemente passou a ser de Jorge Silveira, ex-Viradouro. Cid Carvalho voltou à comissão de Carnaval da Beija-Flor depois de quase uma década.

– Foi o último desfile – por enquanto – do casal formado pela porta-bandeira Giovanna e o mestre-sala Marquinhos. O primeiro cortejo deles no Grupo Especial foi em 1995, pela Mangueira, e lá ficaram até 2009. Depois, eles defenderam Unidos da Tijuca, Vila Isabel, Viradouro e Paraíso do Tuiuti. Foram campeões em 1998 e 2002 pela Mangueira, e em 2010 e 2012 pela Tijuca.

– O jejum de títulos da Portela durou exatos 12.045 dias, de 7 de março de 1984 a 1º de março de 2017. Neste período, nove escolas diferentes conquistaram campeonatos: Beija-Flor (1998, 2003, 2004, 2005, 2007, 2008, 2011 e 2015), Imperatriz (1989, 1994, 1995, 1999, 2000 e 2001), Mangueira (1986, 1987, 1998, 2002 e 2016), Mocidade (1985, 1990, 1991 e 1996), Vila Isabel (1988, 2006 e 2013), Unidos da Tijuca (2010, 2012 e 2014), Salgueiro (1993 e 2009), Estácio de Sá (1992) e Viradouro (1997).

– Na última vez em que a Portela havia sido campeã, o sambódromo tinha apenas uma semana desde a inauguração, a moeda era o Cruzeiro, ainda vivíamos sob uma ditadura militar, Ayrton Senna sequer havia estreado na Fórmula 1, Romário ainda não tinha se tornado jogador profissional, e Michel Temer estava prestes a iniciar uma desastrosa gestão na Secretaria de Segurança de São Paulo…

– Já o jejum da Mocidade demorou 7.714 dias, entre 21 de fevereiro de 1996 e 5 de abril de 2017. Quando a Verde e Branco conquistou seu último título até então, a Linha 1 do metrô do Rio ia apenas até Botafogo, e a Linha 2, até a estação Engenho da Rainha, o Real tinha menos de dois anos de circulação, Emerson Fittipaldi partia para sua última temporada na Fórmula Indy e Neymar tinha apenas quatro anos de idade recém-completados.

– A Mangueira se isolou na liderança entre as agremiações que conquistaram o Estandarte de Ouro de Melhor Escola. Os prêmios foram em 1975, 1984, 1990, 1998, 2002, 2013, 2016 e 2017 – ganharia novamente em 2019. O Salgueiro ganhou o estandarte sete vezes, em 1974, 1993, 1994, 2000, 2003, 2009 e 2014, enquanto a Beija-Flor é até hoje a terceira mais agraciada, em 1978, 1986, 1989, 2001 e 2007. Com quatro estandartes, Império Serrano (1972, 1973, 1982 e 2004), Portela (1976, 1979, 1980 e 1995) e Unidos da Tijuca (2005, 2006, 2008 e 2010) dividem o quarto lugar.

– O prefeito Marcello Crivella, que construiu sua carreira política apoiado pela Igreja Universal do Reino de Deus, não cumpriu em 2017 a tradição de o alcaide entregar as chaves da cidade ao Rei Momo para abrir o Carnaval. Mas cumpriu a promessa de não comparecer ao sambódromo para acompanhar os desfiles. Meses depois, anunciou um substancial corte na subvenção às agremiações para os desfiles de 2018, o que rendeu acalorados protestos da comunidade carnavalesca. Vale lembrar que Crivella recebeu o apoio da Liesa e dos presidentes das escolas do Grupo Especial durante a campanha que o elegeu em 2016, de forma quase unânime – a exceção foi a Portela.

CANTINHO DO EDITOR – por Pedro Migão

A Portela teve um pré carnaval atribulado naquele ano. Após ter sido eleito em chapa única no mês de maio, o Presidente Marcos Falcon seria assassinado em seu comitê de campanha para vereador, em 29 de setembro de 2016. Apesar das investigações da Polícia, até o momento não se chegou a uma conclusão sobre assassinos e/ou mandantes.

O vice presidente Luis Carlos Magalhães assumiu a Presidência, conforme manda o Estatuto, mas houve um período de instabilidade. Talvez como maior resultado a pancadaria após o anúncio do samba vencedor na final, com os envolvidos sendo punidos e afastados das atividades temporariamente. Uma safra fraca e uma vitória tranquila da parceria de Samir Trindade. No final o título coroaria o trabalho feito desde 2014.

No período pré carnavalesco este blog alertou para os problemas de estrutura do Sambódromo, que infelizmente seriam evidenciados no desfile. A pancada do carro do Tuiuti na grade foi tão forte que nós já quase ao final do Setor 3 ouvimos. Para o desfile de segunda feira se colocou uma placa de alerta na grade do Setor 1 (acima). E boa parte da Portela, escola a seguir, desfilou sem saber do acidente ocorrido na Unidos da Tijuca. Outra questão foi o excesso de pessoas nas laterais da pista de desfiles, que dificultaram o socorro aos feridos no acidente com o carro da Tijuca.

Outro ponto foram os problemas nos acessos ao Sambódromo, com revistas excessivas nas bolsas térmicas e inexistentes com outros itens. No Desfile das Campeãs um diretor da São Clemente seria baleado na área de desfiles.

A cobertura do blog para aquele carnaval pode ser vista aqui.

Além da Portela também desfilei na Renascer de Jacarepaguá, na Série A. Assisti aos quatro dias nas frisas do Setor 3, aliás último ano em que assistiria “in loco” todos os dias.

Não sabia, mas aquele seria o último carnaval daquele que foi meu grande incentivador ao mundo das escolas de samba: Seu Pedro, meu pai, faleceria de infarto fulminante em 14 de outubro daquele ano aos 66 anos de idade. Abaixo, minha homenagem.

A série completa “Histórias do Sambódromo” pode ser vista aqui.

VÍDEOS

O desfile que devolveu à Portela o título de campeã do Carnaval

A bela exibição da também campeã Mocidade Independente

A linda apresentação da Mangueira

O conturbado desfile da Unidos da Tijuca

O lindo desfile da Unidos de Padre Miguel

A campeã da Série A Império Serrano

Fotos: Arquivo Ouro de Tolo

18 Replies to “2017: Portela e Mocidade dividem título em ano com polêmicas no julgamento e graves acidentes”

  1. Primeiramente, que bom que a série está recebendo um upgrade. Parabéns Fred Sabino e Pedro Migão.
    Sobre os desfiles achei um título muito merecido pra Portela e nem tanto pra Mocidade. Achei por exemplo, a apresentação do Salgueiro mais equilibrada nos quesitos que a Verde-Branco. Mas inegavelmente foi um belo resgate da Mocidade e com uma comissão de frente arrebatadora. Achei as perdas de ponto até corretas em Enredo mas a justificativa do Valmir Aleixo realmente estava calcada em um livro abre-alas desatualizado. Correta assim a divisão do campeonato.
    Ainda sobre a Portela, foi uma libertação para seus torcedores e para os amantes do carnaval o fim desse jejum (por mais que continue o jejum da escola como campeã sozinha). Hoje a escola tem mais paz para desfilar.
    Pena os erros gravíssimos de evolução e harmonia da Mangueira, era a campeã até aquele momento e considero o segundo melhor trabalho do Leandro Vieira(perde só pra 2019).
    Pena tbm os problemas na Ilha, a tragédia no Tuiuti que resultou num óbito e claro na Tijuca.
    Lamentável a virada de mesa e o julgamento que “manteve” a Tijuca no Especial.
    Grande Abraço,
    Jean Araujo

  2. 2017… que carnaval complicadíssimo pra destrinchar, tanto pela polêmica da divisão do título quanto pelos trágicos acidentes. Ao menos uma coisa boa aconteceu pessoalmente: foi meu primeiro ano cobrindo os desfiles pela Rádio Show do Esporte – ainda que por “off tube” de casa.

    A Portela merecia porque merecia esse título. Não foi tão arrebatador como o desfile de 2016, mas fez uma apresentação para se credenciar ao título. A escola merecia demais.

    A bem da verdade, o inicial vice-campeonato da Mocidade foi uma surpresa (mais até do que o da Viradouro dois anos depois). Apesar do belo desfile, achei um carnaval para, no máximo, um quarto lugar – achei Mangueira e Salgueiro superiores.

    Por falar no Salgueiro, como esquecer da então presidente Regina Celi ordenando o carro de som da escola a esquentar com o samba do Gonzaga, derrotado nas eliminatórias, no desfile das campeãs, em protesto contra as notas recebidas no quesito, determinantes para a escola sair da briga pelo título? Que momento, pro bem ou pro mal…

    Tão logo avistei o buraco na evolução da Mangueira eu falei: “É, esse ano é da Portela. Ninguém tira mais.”

    A propósito, 2017 o tempo de desfile foi reduzido de 82 para 75 minutos – por exigência da televisão para que mostrassem todas as escolas. A redução se refletiu na evolução, sendo um dos piores anos do quesito. Quase todas as escolas abriram pelo menos um buraco.

    Se houvesse seriedade, o desfile da Tijuca seria interrompido imediatamente após o acidente. Mas a própria escola, ao que consta, não quis parar. Paciência… Vale destacar a garra que o Tinga conduziu o complicadíssimo samba.

    Grande Rio: depois que a Ivete passou o desfile ficou cansativo demais. Aquele carro do The Voice, minha nossa senhora…

    Imperatriz: as críticas da turma do agronegócio só começaram porque empresários do ramo tentaram subornar índios para que eles boicotassem a escola e eles recusaram. Mas ainda com toda onda contrária foi um bom desfile.

    Eu não achei o desfile do Tuiuti grande coisa, do segundo setor em diante deu uma caída legal em termos plásticos e de chão. E sobre a Vila Isabel: que bom que o samba-acróstico do Diniz não foi escolhido, pois não merecia esse desfile péssimo.

    A princípio, eu era contra a divisão do título. Mas como a novela ia se arrastando eu pensei e “ah, se é pra demorar pra definir, divide essa porcaria logo”

    E sobre o não-rebaixamento, deixo as palavras do Castanheira após o acidente da Tijuca: “Não existe a menor possibilidade de não haver rebaixamento. O regulamento será cumprido”

    Sobre a Série A: A Unidos de Padre Miguel fazia o desfile do ano até o acidente da Jéssica, depois daquilo murchou completamente o clima. O Império Serrano mereceu o título pois fez um desfile que, salvo os detalhes, brigaria décimo a décimo com a UPM. Porto da Pedra, tida como a grande favorita no pré-carnaval, fez um desfile bom, ainda que abaixo das expectativas.

    Ainda na Série A, vale destacar o vice-campeonato da Viradouro num carnaval de pura superação. Ainda em 2016 a escola estava quebrada, com barracão parado e corria risco de nem desfilar. O então presidente Gustavo Clarão se afastou do cargo e deixou a preparação do desfile nas mãos de um conselho liderado pelo grupo político que atualmente dirige a escola. O desfile foi construído em 70 dias. Depois de se afastar, Clarão sumiu e só reapareceu após o desfile para renunciar ao cargo.

  3. Cabe mais uns dois adendos aí? Cabe!

    Em 2017 a União da Ilha teve seu último samba bom, pra não usar um termo mais pesado. Porque dali em diante…

    Por falar em samba, vale destacar o que abriu os trabalhos na Sapucaí: a obra em formato de diálogo da Sossego para homenagear Zezé Motta. Um primor!

    Ademais, feliz pelo retorno da série e que venha o capítulo inédito sobre 2018.

    1. O Samba da Ilha 2017 é o melhor samba do ano. Apesar dessa safra ser muito boa. Todos os sambas são bons. Mas destaco as obras da Beija Flor, Mangueira e Tuiuti.
      Mas o samba da Ilha é maravilhoso.
      E realmente o último bom samba da Ilha.

  4. Muito feliz com o retorno desses textos, atualizando o Histórias do Sambódromo com os últimos três Carnavais, sinal de que o Carnaval 2020 é logo ali!

    O Carnaval 2017, infelizmente, ficará marcado pelos infelizes acidentes que culminaram na tragédia que foi a morte da Liza Carioca. Uma tragédia que deveria servir de alerta para que se investisse mais em prevenção e segurança nas alegorias, na Sapucaí e no entorno, mas, como ocorreu com os também trágicos incêndios na Cidade do Samba em 2011, pouca coisa mudou.

    Sobre os desfiles em si, acho que o título para o competente e correto desfile portelense foi justo, mas também estaria em boas mãos caso fosse para o empolgante e luxuoso desfile da Mocidade ou para o emocionante desfile da Mangueira, com o Salgueiro, que teve um Renato Lage pouco inspirado em sua despedida da escola, um pouco abaixo. Mas considero que não tivemos nenhum desfile com aquela “aura” de campeão, tanto por erros das escolas quanto pelo clima “estranho” que pairava sobre o Sambódromo. Completariam minhas campeãs Beija-Flor e Imperatriz, com a Unidos da Tijuca em último pelo verdadeiro desastre que foi o desfile após o acidente com o segundo carro. No acesso, Império Serrano campeão com toda a justiça. A Unidos de Padre Miguel fazia talvez o maior desfile da história do grupo, mas o problema com a Porta-Bandeira, infelizmente, afetou fortemente tantos quesitos que não dava para a escola conseguir seu tão sonhado título, uma pena, estava empolgante e belíssima, com um samba excelente…

    Já em relação à virada de mesa, além de absurda, apesar de já esperar algo assim logo após o encerramento dos desfiles, ela iniciou um efeito cascata no Carnaval impressionante…

  5. Um ano bem difícil com muitas tragédias e bons desfiles. Não teve aquele desfile arrebatador, mas tivemos boas atuações da Portela, Mocidade, Mangueira e Salgueiro. Uma pena os erros da Mangueira em evolução. Poderia ter vencido. Portela fez um desfile seguro, sem erros e mereceu o título. Não achei o desfile da Mocidade um desfile campeão, mas foi bom o resgate da escola. Beija Flor se arriscou e pagou por isso. Acabou cometendo erros bobos. Poderia ter sido um desfile histórico com um samba incrível sobre Iracema.

  6. É campeã!! É campeã!!

    Sim, vibrei com o título da Portela. Vibrei com o inicial vice-campeonato da minha Mocidade (inclusive tem texto pessoal meu aqui no Ouro de Tolo) – e depois com a confirmação do título. Afinal, não foi um erro opinativo, foi um erro de regra, baseado em algo que não existia.

    Todo mundo resumiu bem: vergonha do não rebaixamento, tristeza pela morte da Liza, impunidade com as quebras dos carros da Tuiuti e da Tijuca, fatalidade da Jessica no desfile da UPM… mas minha lembrança é para um amigo meu, portelense, logo após a divisão do título (na divulgação da justificativa ele já havia me cantado a bola: vão dividir).

    Ele disse: “Ainda bem que a Carmen Mouro meteu o atestado, senão a Mocidade seria campeã sozinha”! Hahahahahahahaha…

  7. Bom dia!

    Prezado Fred Sabino:

    Estou chegando aqui bem atrasado para lembrar o carnaval 2017 comentando alguns adendos sobre o seu denso e muito agradável texto.

    – Além de haver a homenagem obrigatória a Caetano no Caetanave pela Tuiuti, vale lembrar que o próprio já fora enredo campeão da Escola em 2011, desfilando pela atual série B, que se apresentava na terça-feira de carnaval na Sapuicaí (Saudade da série B no sambódromo…).

    – Na segunda-feira de carnaval a abertura dos portões foi atrasada em 1 hora por causa da perícia que estava sendo feita no local. Juntando com o acidente da Tijuca, ficou provada a falta de estrutura da Marquês de Sacupaí para imprevistos. Seguimos tendo apenas esperança que tudo transcorra bem, pois qualquer acidente no meio da pista cobrará um conta bem alta a todos.

    – A maratona de Ivete Sangalo desfilando em 2 momentos da Escola (Comissão de Frente e último carro) já havia sido feita exatamente assim por Fafá de Belém em 2013 na Imperatriz, ano em que a Verde e Branca de Ramos homenageou o Pará.

    – Falando em Imperatriz, como torcedor Gresilense, considero este o melhor desfile da “era Cahê Rodrigues”, durante a qual a Escola desperdiçou algumas oportunidades de título por inconsistências de enredo que refletiam na plástica dos desfiles. A exceção fica para o último carro, lindo em fotos e até mesmo pela televisão, mas ao vivo deixava a desejar em mais um clássico problema com estruturas tubulares aparentes: tem que saber fazer… No mais, acredito que o bom resultado visual tenha sido a presença massiva de profissionais de Parintins no barracão da Escola. Alguns itens do Festival desfilaram, como a então Rainha do Folclore do Boi Caprichoso, Brenna Dianá, destaque da alegoria 2 “O encanto da floresta”, com um gigantesco jacaré de mais de 30 m de comprimento. O jacaré, como muitas esculturas marcantes no carnaval, segue carreira nas divisões menores…

    – Eu considero o abre-alas da Beija-Flor, todo em azul e branco, o símbolo do fim de uma era. A partir do ano seguinte a escola se perderia na sua identidade visual (Alegando a crise financeira), que marcaria desfiles bem ruins visualmente em 2018 e 2019. Voltando ao carro, lindíssimo, com pintura de arte incrivelmente executada, parecia brilhar sob a luz do sol que já se levantava no horizonte. Aquelas alas eram um horror! Nós brincávamos na arquibancada dizendo que a lycra de Nilópolis tinha acabado, pois a Beija havia comprado tudo para organizar o “blocão”.

    – A Ilha poderia facilmente ter sido campeã num desfile arrebatador. O samba estava crescendo. A cada nova bossa da bateria, o público respondia mais e mais…até o problema do carro do fogo… O desfile murchou rapidamente, e seguiu tenso até o final…uma pena! Severo Luzardo estreava no Grupo Especial com os dois pés na porta, mostrando não apenas seu bom gosto na escala cromática, mas arquiteturas verdadeiramente diferentes no desenho das alegorias.

    – Rosa Magalhães foi despontuada em Alegorias e Adereços em parte pelo “tamanho” de seus carros. Na avaliação do Júri tamanho importa sim, esquecendo-se completamente de outras questões. A carnavalesca pensou em abandonar o carnaval. Foi salva por uma manobra nos bastidores envolvendo Fábio Fabato e o Presidente da Portela. Nós também fomos salvos!

    – Esteticamente eu achei o desfile da Mocidade bem fraco. Boa parte dos carros era forrado com tecido. O diferencial desses tecidos não podia ser visto de muito longe, onde só se enxergava algo brilhoso. De perto era possível ver os desenhos dourados e prateados que compunham as estampas dos mesmos (Como mostrado nas fotos que ilustram este artigo). Parece bobagem, mas faz toda a diferença! Em vez de decoração em acetato e pedrarias, investiu-se nessas estampas e elas não eram visíveis a todos. Então, para quem estava bem afastado, ficava a impressão de algo incompleto.

    – O desfile da Tijuca foi uma agonia só. Para mim o Estandarte de Ouro de melhor intérprete deveria ter ido para o Tinga, com atuação irretocável ao segurar o ânimo de toda a Avenida com um samba fraco e em um momento tão difícil.

    – Portela foi bem? Sim, mas parecia que em 2016 havia mais “sangue nos olhos”. No mais, foi ótimo ver um título da águia!

    – O elemento cenográfico “O santo e o orixá”, foi baseado na obra do artista Leandro Barra. Lamentavelmente este item não pôde desfilar no desfile das campeãs por questões até hoje não muito claras. Dois momentos sobre o mesmo caso: uma foto em preto e branco do barracão da Mangueira vazio para o desfile das campeãs tendo apenas o elemento sozinho em seu interior; o uso do termo “ajuste” em um painel da Carnavália Sambacon para explicar o ocorrido e o Temer Vampirão (No ano seguinte pela Tuiuti).

    Sobre a Série A…

    UPM foi um rolo compressor. Mais uma prova do quanto a transmissão diminui o desfile. Assisti ao vídeo deste desfile muito tempo depois, e fiquei impressionado como as câmeras e microfones não captaram nem metade de sua magnitude.

    Atenciosamente
    Fellipe Barroso

    1. Adendo do adendo!
      Ainda sobre a Série A…

      – A Sossego chegou à Série A vitoriosa na Intendente Magalhães com os carnavalescos Gabriel Haddad e Leonardo Bora, que em 2020 assinam pela Grande Rio. Na Intendente a vitória veio com um enredo que tinha como base Manoel de Barros, mesmo caminho seguido pelo Império Serrano para chegar ao Grupo Especial. Eu confesso quase aposta e que alguma Escola do Grupo Especial faria o mesmo em 2018!

      – A Sossego abriu o sambódromo com um sambão! Levantou o público presente.

      – O desfile da Cubango merece ser esquecido. A Escola passava por uma crise interna, problemas financeiros e tinha um samba não muito bom. Depois desse carnaval, começou o movimento “Resgata, Cubango”, o qual incluía a contratação da dupla “Boradad”, e gerou o desfile sobre o Bispo do Rosário em 2018.

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