O lindo samba escolhido pela Estação Primeira de Mangueira para o Carnaval de 2019 já entrou para a história. Antes de tudo, calma, amigos. Não tenho aqui a pretensão de já apontá-lo como o maior samba de enredo de todos os tempos, embora, repito, seja de uma beleza e melodia emocionantes e inquestionáveis. É uma obra que transcende o universo das escolas de samba, e tem um grande componente sociológico.

É evidente que a menção a Marielle Franco, covardemente executada por facínoras que queriam calar sua voz, nos deixa bastante comovidos porque é um fato contemporâneo que se encaixa à feição à proposta de mais um enredo crítico desenvolvido pelo excelente carnavalesco Leandro Vieira.

Neste assustador momento vivido pela nossa sociedade, com ódio e intolerância disseminados como um tumor maligno, faz-se fundamental uma reflexão sobre o que foi o verdadeiro Brasil e o que faremos, de fato, para este Brasil não sucumbir definitivamente. Será que continuaremos renegando nossas origens e seguiremos matando nosso futuro ainda no presente?

Como se não bastasse sua beleza, a obra assinada por Deivid Domênico e parceiros vai além, mas tão além como “as histórias que a história não conta”, que já fico imaginamos como lembraremos desse samba daqui a 20, 30 anos. Torço sinceramente para que o samba passe uma mensagem que ajude, nem que seja um pouquinho, a iniciar a construção de um país, senão livre para sempre de seus problemas, melhor.

Além disso, como torcedor confesso da Verde e Rosa, fico muito orgulhoso que a minha escola do coração mais uma vez coloque o dedo nas grandes feridas do nosso país e não tenha medo de se expor a uma rejeição por parte do status quo. As escolas de samba têm um papel fundamental como instituições de cultura popular e a Manga (como diria o saudoso Fernando Pamplona) vem assumindo isso com total consciência do seu tamanho e relevância.

Em conversas com amigos após a escolha do samba, até levantamos se a Mangueira poderia alterar a letra do samba para omitir o nome Marielle devido a questões políticas, já que ela era uma vereadora de um partido de esquerda e o presidente Chiquinho da Mangueira pertence a um grupo político oposto. Sinceramente, torço para que isso não aconteça e também não acredito.

Por mais que possa haver alguma pressão, a Mangueira tem assumido esse papel crítico nos últimos anos. No último Carnaval, por exemplo, prometeu e teve peito para cumprir a promessa de colocar o prefeito do Rio como Judas. Além disso, se houvesse alguma restrição à citação de Marielle, creio que o samba já teria sido cortado.

Dito isso, espero, claro, que a Mangueira rasgue a pista da Sapucaí e faça uma exibição que nos emocione, mas que proponha, acima de tudo, uma discussão definitiva para todo o país: até quando vamos varrer para debaixo do pano a nossa verdadeira história?

Como diria o poeta: “Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado.” Vamos continuar errando para sempre?

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One Reply to “#MangueiraPresente”

  1. Muito orgulho da escolha da minha querida verde e rosa! A escola pode sofrer várias retaliações? Pode. A escola pode acabar perdendo o título por fatores alheios ao que acontecer na pista? Pode. Mas quem disse que o título é o mais importante? A Mangueira tem um papel fundamental como instituição histórica e cultural desse país, e a valorização desse papel, a meu ver, é o que ficará desse desfile que nem bem aconteceu e já é histórico.

    Como dito na transmissão da Rádio Arquibancada, não dá pra saber que país teremos em Março, não dá pra saber sequer se teremos o Brasil que conhecemos em Março, mas aconteça o que acontecer, a Mangueira já escolheu seu lado. E isso é o mais importante.

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