Quem me acompanha nas redes sociais já deve ter percebido que ando meio desanimado com o mundo do carnaval, por uma série de fatores. Entretanto, dentro de todos os problemas e todas as questões que ultimamente tem permeado o carnaval e as escolas de samba, algo que precisa ser enaltecido é o renascimento do gênero samba de enredo.

Gênero que viveu uma grande crise a partir da metade da última década do Século XX e, especialmente, na primeira década deste século XXI. Tem escola do Especial que não salva praticamente nada neste período: daria para fazer um cd somente com sambas de qualidade duvidosa.

Contudo, a partir de 2010 o gênero tem experimentado uma grande renovação. Praticamente um renascimento, pouco visto pelo grande público porque o gênero hoje tem muito pouco destaque na chamada “grande mídia”, dominada por gêneros como o sertanejo e suas variáveis, entre outros.

Nesta falta de divulgação ao grande público também entra um pouco do “não marketing” das entidades que comandam os principais grupos do carnaval carioca. Falta a elas um pouco de ação no sentido de divulgar mais os sambas durante o pré desfile.

Este renascimento pode ser explicado por uma série de fatores, mas quero chamar a atenção para a difusão dos concorrentes pela internet. Hoje, se sabe sem sair de casa os melhores sambas de cada disputa e isso de certa forma diminui a margem para grandes injustiças nas escolhas, a meu ver.

Outro ponto é que o fenômeno das encomendas também permitiu que, sem disputas, os compositores ousassem mais em suas composições. E isso também ajudou a subir o nível.

Para mostrar isso, neste artigo e no próximo – que irá estar disponível em breve – elenco alguns exemplares que simbolizam este renascimento. Neste, sambas derrotados entre 2015 e 2017; no próximo, composições oficiais de 2010 para cá.

Nesta primeira seleção coloco sambas que perderam por terem aparecido outros ainda melhores ou no mesmo nível, em alguns casos. Ou porque a escolha da agremiação foi equivocada mesmo. É uma seleção pessoal, então deem sugestões na área de comentários. Mas tem muita coisa boa.

Organizadas por ano, vamos a eles. Lembrando que cito o parceiro que ficou mais conhecido nos fóruns de internet:

2015:

1 – Estácio de Sá: parceria de Wilsinho Paz

Este é um caso onde o vencedor, raro filhote de “pombo” assumido pelo autor, era um sambaço. Mas este, que foi finalista, tem grandes momentos, especialmente em sua melodia.

2 – Beija Flor – parceria de Serginho Sumaré

A escola inteira queria o vencedor, de autoria do compositor Samir Trindade. Mas este e o seguinte também teriam representado muito bem a Beija Flor na avenida. O curioso é que os dois caíram bem cedo na disputa (talvez para limpar o caminho ao vencedor).

3 – Beija Flor – parceria de Serginho Aguiar

Esse não achei no Youtube, então vai o áudio acima. Comentei no anterior.

4 – Império da Tijuca: parceria de Zezinho Professor

Esse foi alvo de post à época e, como previ na ocasião, ele acabou caindo cedo pela falta do que o mundo do samba chama de “esquema empresarial”. Mas tem uma melodia irresistível, bem como o refrão principal.

Vale dizer que o vencedor na disputa teve um desempenho bem opaco na avenida.

5 – Portela 2015: parceria de Luiz Carlos Máximo

Confesso que irei morrer achando que nossa escolha daquele ano não foi a melhor, apesar da comoção que se criou em cima do ganhador. Esse é o primeiro exemplo de concorrente, que foi à final. Esse samba teve o refrão principal alterado durante a disputa, saindo de duas repetições para uma.

6 – Portela 2015: parceria de Edson Batista

Este acabou não indo tão bem na disputa e caiu na semifinal, mas acho este samba delicioso.

2016

7- Alegria da Zona Sul – parceria de Jayme Cezar

Eu sou apaixonado por este concorrente, que fez final mas acabou perdendo para outra composição. O refrão dele, que traduzido em português é um pedido de perdão, é de arrepiar.

8 – Império Serrano: parceria de Henrique Hoffmann

O samba vencedor era do Arlindo Cruz. Ok. Mas, além de ter sido um dos principais problemas do desfile da escola, tomou um vareio a disputa inteira deste acima, culminando em uma final muito tumultuada. Escolha bastante equivocada da Serrinha.

9 – Estácio de Sá: Dominguinhos do Estácio

A Estácio em 2016 conseguiu o que muitos consideram uma proeza: levar para a Sapucaí um samba de qualidade duvidosa sobre São Jorge. Estes, dos mesmos parceiros do ano anterior, era bem melhor. Pessoalmente gosto muito da transição da segunda para o refrão principal.

O mais incrível é que ele “caiu” na disputa quando ainda restavam oito sambas. O vídeo acima está sem a introdução declamada por Dominguinhos do Estácio.

10 – Salgueiro – parceria de Tico do Gato

Saímos das escolhas duvidosas para um caso onde a composição que foi para a avenida mereceu ir. Ainda assim, este concorrente do veterano Tico do Gato tem ótimas sacadas, em especial o refrão “faz da noite o seu lugar/chama a Lua pra sambar”.

Naquela disputa em formato de “mata mata” ocorrida na quadra da Rua Silva Teles, caiu nas quartas de final – se não me falha a memória, para o campeão.

11 – Salgueiro 2016 – Xande de Pilares

Pessoalmente era só meu quarto ou quinto preferido naquele ano, mas muita gente da Academia queria este como o vencedor – e temos que respeitar. Gosto muito do refrão principal.

12 – Viradouro: parceria de Kátia Azevedo

O vencedor é um samba espetacular, sublime, histórico. Ponto. Mas esta final da Viradouro tinha outros dois sambas que seriam fortes candidatos aos prêmios de crítica se chegassem ao desfile. Este é um deles. Atenção para a melodia da cabeça do samba.

13 – Viradouro: Renan Gêmeo

Ver samba anterior. Também foi finalista.

14 – Mangueira 2016: Tantinho

Me incomoda bastante a semelhança da melodia da segunda parte com Portela 1980, mas foi outra composição carregada pela internet até a final. Final onde qualquer vencedor representaria bem a Estação Primeira.

15 – Mangueira 2016: Lequinho

Era meu favorito. A primeira parte dele é sensacional, tem a cara da Mangueira.

2017

16 – Unidos de Padre Miguel, Dudu Nobre

Já escrevi pelo menos duas vezes aqui sobre essa safra da Unidos de Padre Miguel em 2017. Não dá para reclamar do vencedor, que levou todos os prêmios de público e crítica, mas qualquer dos finalistas teria feito o mesmo. A gravação deste de estúdio poderia ser melhor, mas é ótima composição.

17 – Unidos de Padre Miguel, D´Vincci e Leci Brandão

Meu preferido naquela final. Com um verso que é simples, mas sublime: “sem folhas não existem os Orixás”. Lindo!

18 – Sossego, Celso Tropical

O oficial, embora um tanto quanto difícil, passou bem e ajudou a escola a se manter na Série A. Mas esse acima lembra os sambas antigos da Mangueira. Delicioso de ouvir.

19 – Vila Isabel, André Diniz

Confesso que achei justa a vitória do que foi à avenida, embora faça a ressalva que vi apenas vídeos da disputa. Mas a ousadia do gênio Diniz e o acróstico homenageando o parceiro assassinado Leonel são inesquecíveis.

20 – Beija Flor, J. Velloso

Fechando a série, outro samba que acabou perdendo para uma composição superior – apesar de ter sido prejudicada no desfile por um andamento “para trás” demais. Mas corrobora aquele mantra que reza “bons enredos geram bons sambas”.

Como veem, o gênero samba enredo vive. E vive muito!

Imagem: Arquivo Ouro de Tolo

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6 Replies to “O Samba Enredo Vive – Parte I”

  1. Impressionante a quantidade de belas obras que acabam ficando pelo caminho nas eliminatórias, esse é o lado ruim de acompanhar a disputa desde a divulgação, acabamos “fechando” com determinado samba a tal ponto que a vitória de outro samba, mesmo sendo justa, acaba criando um certo ranço contra ele, pelo menos de minha parte.

    Acrescentarei a sua lista os seguintes sambas Pedro:

    2015
    1- Salgueiro, Marcelo Motta (muito superior ao que foi para a avenida)
    2- Portela, Wanderlei Monteiro (era inferior ao do Noca e ao do Máximo, mas eu gostava)
    3- Imperatriz, Eduardo Medrado ((meu preferido na disputa, de longe)
    4- Mocidade, Dudu Nobre (conseguia contar o enredo do Paulo Barros com muito mais poesia do que o escolhido)

    2016
    5- Mangueira, Pedrinho da Flor (poderia perfeitamente representar a escola)
    6- Salgueiro, Antonio Gonzaga (responsável pela maior polêmica das Eliminatórias daquele ano, pode-se gostar ou não, mas é meio difícil ficar indiferente a esta obra)
    7- Salgueiro, David Correa (adoro esse samba, tem toda a levada clássica do Mestre David, um estilo malandro o que coube perfeitamente ao enredo)

    2017
    8- Portela, Eduardo Medrado (para mim, era o melhor da disputa, adoro o estilo do Eduardo Medrado desde o samba derrotado na Imperatriz para o Carnaval do ano 2000)
    9- Mangueira, Tantinho (o samba escolhido era meu preferido, mas este também representaria muito bem minha verde e rosa)
    10- Imperatriz, Zé Katimba (acho superior ao que foi para a avenida)
    11- Unidos da Tijuca, Dudu Nobre (pode não ser uma maravilha, e é muito inferior ao anterior, mas considero bem melhor do que o escolhido, que lembra todos os sambas da escola desde 2011, exceto 2012 e, claro, 2016)
    12- Paraíso do Tuiuti, Cláudio Russo (não entendo até agora a escolha do samba que foi para a avenida em detrimento deste)
    13- Império Serrano, Henrique Hoffmann (podia ter feito uma bela disputa com o vencedor, mas infelizmente foi desclassificado)
    14- Porto da Pedra, Cláudio Russo (samba ao meu ver menos irreverente do que o escolhido, porém com maior qualidade)

    1. Engraçado, eu não consigo me lembrar deste do Medrado na Portela. Ele assinou?

      Mangueira em 2016 tinha uns seis ou sete sambas que poderiam ir tranquilamente à avenida.

      1. Sim, assinou, na parceria do Adilson Bispo, e foi gravado pelo Cremilson Bico Doce. Sambão. Era o meu preferido da disputa, mas, como ocorre com todos os sambas do Medrado, foi cortado cedo.

        A safra da Mangueira em 2016 era tão boa que o escolhido era somente meu quarto preferido em toda a disputa (na ordem, Tantinho, Lequinho e Pedrinho da Flor), e mesmo assim não fiquei nem um pouco triste com a escolha.

        1. Não me lembro mesmo deste samba. E olha que deveria ter me chamado a atenção em uma safra fraca como foi essa da Portela para 2017 – tirando o vencedor e o assinado pelo Noca não sobrava quase mais nada digno de nota

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